“Numa longa linha de tecnologias digitais (smartphones, redes sociais), a inteligência artificial (IA) generativa é mais uma força sociotécnica que os jornalistas não criaram nem pediram, mas que têm de navegar e (tentar) remodelar”, menciona um estudo do Nieman Lab, que analisa como os sindicatos dos media estão a utilizar, gerir e estabilizar a IA generativa. 

O trabalho baseia-se numa pesquisa entre 2022 e 2024, com 50 fontes sindicais, divididas em três categorias: declarações públicas e testemunhos de organizações e sindicatos que representam jornalistas (The NewsGuild-CWA, The Atlantic, InsiderLos Angeles Times, entre outros); acordos de negociação colectiva com empresas de media, incluindo Associated Press e Politico; artigos de imprensa especializada publicados em meios como Nieman Lab e Columbia Journalism Review.  

As fontes analisadas mostram como os sindicatos dos media estão a lidar com a IA generativa. O estudo destaca seis áreas principais de atenção e preocupação, além de duas áreas nas quais os sindicatos parecem não estar focados. 

Abaixo, deixamos um resumo das seis principais preocupações dos sindicatos: 

  • Reconhecem que os editores têm o poder de iniciar e controlar o uso da IA generativa, mas contrariam este poder. Defendem um papel activo nas decisões sobre a adopção da IA, procurando, “por vezes com sucesso”, influenciar o ritmo e a implementação dessa tecnologia; 
  • Apontam a falta de transparência dos editores como uma das principais razões para a desconfiança dos trabalhadores em relação aos planos de IA generativa dos editores. “Os sindicatos estão a tentar resolver este défice de confiança exigindo mais transparência em tudo, desde as aquisições aos acordos de licenciamento”; 
  • Destacam que “a humanidade dos trabalhadores é essencial para um trabalho noticioso de qualidade”. Defendem que os editores devem confiar nas decisões dos jornalistas sobre quando e como utilizar a IA generativa e que os colaboradores “devem ter a liberdade de optar por não utilizar a IA generativa sempre que esta entre em conflito com a sua opinião”; 
  • Estão preocupados com a ameaça de automatização do jornalismo, não só por temerem a perda de empregos, mas também por acreditarem que a IA generativa é “inerentemente irresponsável e pouco confiável”, contrariando os valores do jornalismo. Embora reconheçam que pode ser útil em tarefas logísticas, veem a utilização imprudente da IA para gerar histórias como uma ameaça à “exactidão e responsabilidade do jornalismo e aos seus valores profissionais fundamentais”; 
  • Procuram um maior controlo sobre os produtos noticiosos, o que cria tensões com os editores, mas também alinha os jornalistas e a direcção na luta contra o poder das empresas tecnológicas; 
  • Acreditam que as barreiras contratuais são essenciais para estabilizar a IA generativa, mas “estão preocupados com o facto de a acção directa dos trabalhadores não poder, por si só, forçar os editores a mudar o uso que fazem da IA generativa”. Por isso, estão a envolver o público e decisores políticos para definir a IA generativa como um problema, articulando o valor do jornalismo e prevendo soluções para os desafios que a tecnologia representa. 

Os autores afirmam que “em todos estes temas, os jornalistas são trabalhadores que tentam compreender a moda da IA generativa, domar o seu poder e articular mais uma vez com os gestores e o público a razão pela qual um jornalismo forte e feito por humanos é importante”. 

O estudo encontrou também dois aspectos sobre os quais os sindicatos não reflectem: 

  • Os sindicatos não abordam amplamente os impactos sociais e infraestruturais da IA generativa, como os recursos naturais e humanos necessários para construir e manter conjuntos de dados, treinar modelos e alimentar interfaces; 
  • Não discutem os impactos emocionais da IA generativa no trabalho e bem-estar dos jornalistas, “nas suas identidades e esperanças para o futuro da profissão”. 

Os autores do estudo especulam sobre estas ausências: “Podem ser simplesmente áreas que não se enquadram nos conhecimentos ou interesses dos sindicatos, ou podem ser escolhas deliberadas e estratégicas para concentrar as conversas sobre IA generativa em torno de preocupações tratáveis e accionáveis”.  

De qualquer forma, as ausência referidas no estudo sugerem oportunidades para os sindicatos dos meios de comunicação expandirem o seu conceito de "trabalhador dos media", considerando a IA generativa dentro de um ecossistema mais amplo e promovendo uma advocacia que priorize os seres humanos no jornalismo. 

(Créditos da imagem: fotografia retirada do site do Nieman Lab - Matthew Rodier/Sipa USA via AP Images)