O leque dos convidados é composto por “dirigentes partidários, deputados, ex-governantes ou os chamados senadores do regime”, que passam assim a ficar com lugar cativo em “alguns dos espaços mais nobres de cada órgão de comunicação social”. 

Da imprensa à televisão, passando pelas novas plataformas online ou pela rádio, o modelo repete-se. Todos acham “relevante” ceder espaço ou tempo de antena para dar voz aos políticos, aos quais não colocam “quaisquer limites” quanto ao tema a abordar e ainda menos sobre o ângulo de análise. A liberdade é total. (...) 

A autora da reportagem descreve este comportamento “uma verdadeira originalidade lusa” e contrapõe o exemplo de outros países: 

Em França “não há políticos comentadores pagos”, garante Daniel Ribeiro, correspondente do Expresso em Paris. Não existem sequer “programas desse tipo”, onde políticos de carreira têm encontro marcado para debater entre si. “Isso não existe” nos media franceses  - afirma. 

Na Alemanha “não há uma lei específica, mas existe uma prática”, explica Cristina Peres, jornalista do Expresso que cobre a realidade alemã: 

“Há formatos televisivos, dos quais é de destacar o programa de Anne Will no canal Das Erste, que aos domingos à noite faz um debate com convidados para cada tema específico. Mas o único ‘residente’ do programa é a jornalista-entrevistadora.” 

Nos Estados Unidos “há uma porta giratória entre a política e os media, por onde passam políticos democratas e republicanos, sejam eles ex-candidatos presidenciais, congressistas, antigos membros das secretas, e até mesmo elementos dos staffs  — assessores, conselheiros —  se aproveitam disso”, explica Ricardo Lourenço, correspondente nos EUA. 

Seguem-se vários exemplos conhecidos, incluindo precisamente congressistas e ex-candidatos presidenciais recentes. “Mas a presença de políticos nos media dos EUA é “uma porta giratória e não um corredor com acesso a ambos os mundos”: 

“Um político no activo não colabora, muito menos com retribuição garantida, nos programas informativos da televisão ou da rádio, e não tem direito a uma coluna própria nos jornais norte-americanos.” (...) 

Em Espanha, “os dirigentes políticos aprenderam a gostar da influência que podem passar a ter se marcarem presença nos meios de comunicação social”. Um caso paradigmático é o de Pablo Iglesias, líder do Podemos, “que é raro o dia em que não tem uma aparição num dos múltiplos debates que existem no amplo panorama mediático espanhol. Aliás, o próprio Iglesias dirige a sua tertúlia política — ‘La Tuerka’—, que, segundo algumas fontes jornalísticas, é financiada pela televisão estatal iraniana”  - explica o corresponde do Expresso em Madrid, Angel Luis de la Calle. (...) 

Segue-se uma descrição da referida “originalidade” portuguesa, com referência especial ao top dos mais requisitados:

Francisco Louçã, que “faz o pleno dos órgãos de comunicação social”, começando pelas manhãs na TSF, passando pelas sextas-feiras na SIC Notícias e tendo ainda uma página semanal no segundo caderno do Expresso

De modo semelhante Pacheco Pereira, na agora denominada “Circulatura do quadrado”, na TVI24 e na TSF, com mais duas páginas semanais de opinião na revista Sábado

A presença regular num canal de TV generalista “não é para todos”: “é um campeonato difícil que, no caso português, agora está reservado a dois políticos: Paulo Portas e Luís Marques Mendes”. 

Seguem-se, na ordem descrita no Expresso, Paulo Rangel, depois os socialistas Pedro Silva Pereira e Fernando Medina.

Manuela Ferreira Leite, ex-dirigente do PSD e ex-ministra do governo de Durão Barroso, “além do comentário semanal das quartas-feiras na TVI 24, que dura cerca de 20 minutos, garante presença numa coluna quinzenal no caderno de Economia do Expresso e assegura uma colaboração semanal na antena da TSF”. 

Outros comentadores políticos, como Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, José Eduardo Martins, do PSD, ou ainda Adolfo Mesquita Nunes, do CDS, têm semanalmente intervenções garantidas em, pelo menos, dois órgãos de comunicação social nacionais. 

Há depois muitas situações em que dirigentes políticos são convidados a mostrar o seu “lado B”, em programas de entretenimento ou debates sobre futebol, por exemplo. 

Mário Ramires, do Sol e do Jornal i, declara que “tanto os dez políticos com colunas regulares no diário que dirige, como os cinco que colaboram com o semanário, prestam serviço gratuitamente: “Não temos colaborações pagas. Pagamos zero, portanto.” 

Há em tudo isto um “efeito Marcelo”, como lhe chama a investigadora Rita Figueiras, que banalizou a presença dos políticos no espaço mediático: 

“Actualmente, nenhuma carreira política se constrói à margem dos media, em particular da televisão”  - afirma. E ninguém duvida da capacidade dos media em acomodar políticos ou na força de uma carreira construída a partir deles. 

 

O texto aqui citado, na íntegra no Expresso.