Uma investigação do Poynter Institute e da Universidade do Minnesota lança luz sobre o que as pessoas pensam da inteligência artificial (IA) no jornalismo. 

Diversas grandes redacções dos EUA estão a testar chatbots “para ajudar os leitores a escolher restaurantes, a saber mais sobre os candidatos políticos e a aprofundar os artigos”. No entanto, a pesquisa do Poynter e da Universidade de Minnesota revela que muitos americanos ainda “torcem o nariz” a esta tecnologia: quase metade não quer notícias geradas por IA e 20% acreditam que os editores não deveriam usá-la. O pesquisador Benjamin Toff alertou que a procura por este tipo de conteúdo pode ser baixa, mesmo que a tecnologia esteja disponível. 

A pesquisa baseou-se em grupos de discussão conduzidos por Benjamin Toff, professor associado da Escola de Jornalismo Hubbard e director do Centro de Jornalismo do Minnesota, que apresentou a investigação na segunda Cimeira sobre IA, Ética e Jornalismo, liderada pelo Poynter e pela Associated Press em Nova Iorque. Durante a cimeira, a jornalista de dados Meredith Broussard disse o seguinte: “Alguém gosta mesmo de usar um chatbot? Não. Eu não o suporto. Então, adivinhem? Os vossos utilizadores também se sentem assim. Não estão entusiasmados com a interacção com um chatbot no vosso site.”  

Ainda assim, a investigação considera que é difícil avaliar a opinião do público, já que “a maioria das pessoas não experimentou um produto de IA baseado em notícias - apenas bots de atendimento ao cliente”. 

Apesar da resistência, jornalistas continuam a explorar a IA, cada vez mais presente no quotidiano digital. A Hearst Newspapers, por exemplo, lançou o Chowbot para recomendar restaurantes: “Estamos a basear isto em 30 anos de reportagem de alta qualidade, edição de alta qualidade, que o Google pode deixar de lado ou não valorizar no seu modelo”, disse Ryan Serpico, vice-director de IA e automação de redacção da Hearst Newspapers, sobre o valor de tentar competir com Gemini, ChatGPT, Claude e outras grandes empresas de IA. 

Christina Bruno, da Spotlight PA, defende que é importante testar novos formatos de fornecimento de informações, e vê os chatbots como uma dessas possibilidades. Nikita Roy, fundadora do podcast Newsroom Robots, destaca que as plataformas de IA voltadas para o público são mais bem recebidas e impactantes no exterior. 

A investigação cita alguns casos de sucesso - “um chatbot de eleição da UE desenvolvido pela editora sueca Aftonbladet respondeu a mais de 150 mil perguntas do público, e um assistente virtual de marketing de conteúdo implantado pela Ringier Axel Springer na Polónia para impulsionar o turismo alemão gerou 33 mil planos de viagem exclusivos para os utilizadores”. 

A pesquisa demonstra que os americanos continuam “amplamente cautelosos” com a IA nas notícias: “Menos americanos - especialmente os jovens - estão a usar a IA do que muitos líderes de notícias pensavam. Quase metade dos jovens entre os 18 e os 29 anos não utilizou nem ouviu falar de ferramentas generativas de IA como o ChatGPT”. 

“Uma grande parte do público de notícias pensa que os editores estão a utilizar a IA para escrever artigos ou criar fotografias. Mais de um quarto dos inquiridos pensa que as redacções estão a utilizar a IA para escrever o texto das histórias frequentemente ou a toda a hora”. 

Apesar do uso crescente de IA nas redacções, muitos americanos desconfiam dessa prática: mais da metade não confia em artigos ou imagens gerados por IA. Entre os leitores mais informados, mais de 90% exigem que haja divulgações claras quando o conteúdo é criado ou editado com IA. 

O Poynter Institute explica que existe uma “clara desconexão” entre o que o público pensa que está a acontecer e o que os jornalistas realmente fazem com a IA. Zuri Berry, do Baltimore Banner, afirma que este aspecto “serve como uma confirmação da nossa abordagem actual para a IA, que envolve divulgações, revisão e verificação humana e limitações em algumas ferramentas que minam a nossa confiança e credibilidade com os leitores”. Já Chloe Lee Rowlands, da Bay City News Foundation, defende uma “transparência radical”, indo além de simples avisos.  

Na mesma cimeira, a MediaWise, uma iniciativa de literacia mediática digital, apresentou um kit de ferramentas de literacia em IA, criado em parceria com a Associated Press. O objectivo é “colmatar o fosso digital entre consumidores de notícias e jornalistas”. O kit oferece recursos práticos para redacções que procuram envolver o público com a literacia em IA, juntamente com exemplos de como algumas redacções já estão a comunicar sobre IA. 

Ryan Serpico, da Hearst, compartilhou os seus planos de lançar uma série educativa sobre IA para colegas de redacção: “Estou pessoalmente interessado em criar uma série de vídeos que demonstrem como estamos a usar a IA, não para gerar desleixo em escala, mas para transcrever o áudio de oito reuniões do conselho escolar que acontecem ao mesmo tempo todas as semanas, para que os nossos repórteres de educação possam obter mais efectivamente uma compreensão dos tópicos importantes que os pais nessas comunidades precisam saber”.  

A investigação também ressalta a importância de ouvir o público durante a adopção da IA generativa. Vania André, editora e chefe de redacção do Haitian Times, compartilhou que planeavam criar um chatbot sobre imigração, mas abandonaram a ideia após um inquérito aos leitores ter mostrado que estavam mais interessados em notícias de negócios. Isto destacou o risco de assumir que certas soluções tecnológicas são desejadas por todos. 

Para Benjamin Toff, as ferramentas baseadas em IA — como resumos, explicadores e chatbots — podem tornar as notícias mais acessíveis, ajudando a aproximar os leitores casuais das histórias. “Estas ferramentas podem empacotar essas informações, todo esse contexto, todas essas informações básicas que muitas pessoas simplesmente não têm e tornar essas notícias mais acessíveis às pessoas”, disse Toff. “Penso que existe uma verdadeira oportunidade para chegar a um número cada vez maior de pessoas que, neste momento, se sentem bastante desligadas das notícias e do seu valor.”

(Créditos da imagem: Freepik)