Num artigo publicado em Cuadernos de Periodistas, José Francisco Serrano Oceja, começa por dizer que “é indubitável. Os meios de comunicação vão usar, de forma maciça, a inteligência artificial (IA) na altura de produzir informação”.

A IA “faz parte da dinâmica da revolução tecnológica, um dos factores que estão na própria natureza dos media e, portanto, do jornalismo. A chegada de ferramentas de IA, cada vez mais poderosas, representa, no imaginário colectivo do jornalismo, uma ameaça inquestionável ao “factor humano”, ou seja, aos jornalistas”, afirma.

Oceja, refere no seu texto, um artigo recente na revista In These Times, no qual Hamilton Nolan faz três perguntas sobre a relação entre IA e jornalismo: “é provável que os meios de comunicação comecem a usar IA em grande escala para elaborar as suas notícias? Notaríamos na qualidade dos textos? Pode a desumanização do jornalismo ser, de facto, boa para a sua credibilidade?”

Nolan, diz o autor, “acredita que ninguém pode duvidar de que «os algoritmos estão a refinar-se a cada dia», a ponto de já serem capazes de oferecer uma "simulação" do trabalho do jornalista: podem escrever histórias simples, fazer ilustrações ou reproduzir a sua voz para ler as notícias. No entanto, as ferramentas de IA nunca serão capazes de fazer jornalismo ético, que é o valor distintivo dos bons media e a base de sua credibilidade”.

“Então, devemos perguntar-nos o que é o jornalismo ético e como é que se faz?”, pergunta Oceja.

O autor diz que “para Nolan, é o processo prévio que todo o bom escritor deve fazer antes de começar a escrever”.

Esse processo tem a ver com as perguntas básicas nos processos de produção da informação: “por que é que isto é notícia? Quais são as fontes? Como são obtidas as conclusões? Como posso garantir que os pontos de vista contraditórios sejam apresentados de forma justa? Omiti algo que pode ir contra a minha tese? A história é indevidamente tendenciosa?”, cita.

“É óbvio dizer que existe o bom jornalismo e o mau jornalismo”, diz Oceja. “Portanto, podemos pensar que haverá bom jornalismo que usa IA e mau jornalismo de IA. Qual é a principal diferença entre os dois? Que o bom jornalismo é sempre responsável”, considera.

O autor volta a citar Nolan: “Somos responsáveis. Essa é a diferença. As instituições jornalísticas vivem da credibilidade, e essa credibilidade é concedida como resultado directo da responsabilidade que acompanha cada reportagem.”

Oceja, crê, por isso, que “é absurdo exigir responsabilidade das ferramentas tecnológicas”. Tal como afirma Nola, “o seu trabalho jamais pode ser considerado jornalismo, e publicá-lo como tal não é ético”.

“Para alguns, a automatização aumenta a produtividade e a eficiência na produção de conteúdos, vantagens que podem beneficiar um sector em crise, como é o da imprensa, tão condicionado pelas novas formas indiscriminadas de acesso, produção e divulgação de informação promovidas através da rede”, refere Oceja.

“Mas, se alguns confiam na IA para combater a verificação de factos, como um antídoto para os rumores, fabricação informativa e desinformação; para outros, a edição automatizada é obscura e opaca e, segundo alguns estudos, tende a concentrar mais poder nas mãos dos poderosos. A utilização de filtragem social para a selecção de notícias e da personalização na rede, levanta sérias dúvidas sobre os seus benefícios sociais”, reporta o autor.

Como assinalam Ladevéze e Vázquez, “alinhados com a proposta de Linden de subordinar a técnica às capacidades humanas como convém a todo ofício, há vantagens e desvantagens interpretadas de acordo com o ponto de vista adotado. Confirma-se a neutralidade ambivalente da técnica, cujo uso pode ser adaptado como qualquer instrumento porque é compatível com a diversidade dos mundos da vida".

O autor cita Ladevéze e Vázquez: “a questão fundamental é como preservar os valores democráticos de liberdade e igualdade quando a tecnologia é instrumento de concepções autoritárias do mundo, que entronizam a subserviência das mulheres aos homens, a supremacia das castas e a subordinação da opinião popular à vontade da hierarquia".

Oceja traz ao seu texto, os dados observados num estudo recente, realizado pela Metroscopia, encomendado pelo Periodismo2030 e pela Fundação AXA, em Espanha.

De acordo com o relatório apresentado, “os espanhóis acreditam que a IA representa um risco para a privacidade (79%); que favorecerá a proliferação de boatos ou notícias falsas (79%) e reduzirá a segurança da protecção dos dados bancários (69%). Seja qual for a idade do entrevistado, metade dos espanhóis acredita que a IA não vai melhorar a forma de comunicar (49%). Os sectores que mais beneficiarão da IA serão a medicina, 85% dos pesquisados ​​acreditam que ela será a grande beneficiada; a gestão bancária, 55%; o ensino, 46%, e o jornalismo, 35%”.

“Embora estejamos no início da IA ​​e o seu desenvolvimento deva ser monitorizado”, “aqueles que apresentaram este estudo não se opuseram à IA mudar a forma como o bom jornalismo é feito. Não a viram como uma ameaça para esta profissão”, assinala o autor.