A maioria dos jornalistas portugueses concorda com políticas públicas de apoio a organizações jornalísticas privadas, segundo um estudo sobre o “Financiamento público dos media: o que pensam os jornalistas portugueses?”.

Os dados indicam, porém, que os profissionais preferem medidas indirectas de apoio, para mitigar riscos de interferência editorial.

O estudo é da autoria de Elsa Costa e Silva, investigadora e professora universitária da Universidade do Minho, e inclui as respostas de 280 profissionais de media.

Num contexto em que a sustentabilidade do jornalismo tem sido discutida e em que “novas políticas públicas estão a ser requeridas”, existe pouca informação sistematizada sobre “as percepções de jornalistas relativamente a modelos de financiamento público dos media privados em Portugal”, lê-se na introdução do estudo, que procurou colmatar essa falha.

Principais resultados a favor do financiamento público

  • Mais de três em cada quatro jornalistas (77%) concordam com políticas de apoio público aos media privados.
  • Para a maioria dos inquiridos, o apoio deve ser indirecto, “no lado da procura”, visando o aumento da receita.
  • Entre as políticas com níveis de apoio mais elevados encontram-se: a literacia mediática (grau de aprovação de 93,9%); a dedução em sede de IRS de subscrição ou assinatura de publicações (93%); a oferta de subscrição ou assinaturas (87,9%); e a majoração em sede de IRC das verbas despendidas pelos anunciantes nas empresas noticiosas (78,6%).
  • As políticas com que menos jornalistas concordam estão relacionadas com o apoio às despesas de produção.
  • Menos de metade dos inquiridos concorda com a criação de subsídios directos às empresas e de apoios a custos fixos das empresas, como energia eléctrica ou arrendamento.
  • Ainda do “lado da oferta”, os níveis de aprovação das medidas ficam abaixo dos 70% no caso do apoio a “projectos jornalísticos específicos e temporalmente definidos” (65,5%), apoio ao pagamento de despesas com fornecedores, “com a cedência gratuita dos serviços da Agência Lusa” (67,9%) e do apoio ao “pagamento dos custos laborais dos jornalistas” (68%).
  • “As únicas medidas que visam apoiar o lado da produção e que recolhem um nível de aprovação acima dos 80% são as que dizem respeito ao apoio a projectos específicos (como modernização tecnológica ou formação de jornalistas) e à compra de espaço publicitário para anúncios institucionais”, refere o relatório.

Regulação dos media

  • Segundo os inquiridos, estas medidas têm de ser acompanhadas de um reforço da salvaguarda da independência dos órgãos de comunicação social.
  • “Para quase 80% dos inquiridos o sistema actual de garantia de regular funcionamento não seria suficiente”, indica o estudo.
  • O Estado deve ter algum papel regulador e não apenas garantir a liberdade de imprensa e de expressão. Mais de 80% dos profissionais “concordam ou concordam totalmente que o Estado deve regular o mercado (através das leis da Concorrência) e deve regular as empresas (através da entidade reguladora)”.
  • Quanto aos mecanismos de salvaguarda da independência, aqueles com que mais jornalistas concordam são: as políticas de minimização da precariedade laboral nas empresas (93,2%), a existência de conselhos de redacção (87,5%) e a “transparência das estratégias comerciais e proveniência das receitas” (87,5%).
  • Os mecanismos que apresentam taxas de aprovação mais baixas são: o “reforço de instrumentos de auto-regulação da classe” e a “exigência de um número mínimo de jornalistas nas organizações noticiosas para que estas possam ser beneficiárias de apoio público”.

Razões para recusar financiamento público

  • Quase um quarto da amostra (23%) não concorda com a existência de políticas de financiamento público dos media.
  • Praticamente 88% dos inquiridos concordam que estes apoios podem “minar a confiança do público no produto oferecido”.
  • Oito em cada dez jornalistas (80%) consideram que, desta forma, ficam abertas as portas à “interferência do Estado na independência editorial dos órgãos”.
  • Mais de três quartos dos profissionais (76,9%) defendem que “o jornalismo é uma actividade comercial que tem de ser viável no mercado”.
  • Para 64,6%, estes financiamentos podem “desincentivar a inovação e a procura de qualidade”.

O documento termina alertando para que as soluções exploradas no estudo, apesar de comportarem “menos riscos para a independência dos meios, não são isentas de ameaças: são estratégias que vão demorar a produzir resultados e estes não são certos nem imediatos”.

Nesse sentido, o objectivo deste relatório é contribuir com “informações e pistas de actuação relevantes para o estudo da implementação de uma política de financiamento público dos media privados”.

Os inquéritos para o estudo foram enviados por email a 4407 jornalistas portugueses em Fevereiro deste ano, e incluíram um questionário com 23 perguntas. Foram recebidas 280 respostas.

Entre os profissionais que responderam, 56% são do género masculino e 44% do feminino. A média de idades é de 48,4 anos e a média de anos de serviço é de 24,7. A maior parte dos meios para os quais trabalham os inquiridos é de natureza privada (72%), com 21% dos participantes a trabalhar para um meio público e 7% para um meio social ou cooperativo.

A publicação é da responsabilidade do PolObs – Observatório de Políticas de Ciência, Comunicação e Cultura e do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS) da Universidade do Minho.

O estudo foi feito com o apoio da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista e do Sindicato dos Jornalistas para a distribuição dos inquéritos.

(Créditos da fotografia: Sam McGhee no Unsplash)