A jornalista brasileira Talita Rosa tem vindo a desenvolver uma estratégia de literacia mediática voltada para idosos, utilizando o WhatsApp como principal ferramenta de ensino. A iniciativa insere-se no âmbito do programa “Desarmando a Desinformação”, promovido pelo Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ) e apoiado pela Fundação Scripps Howard, com o objectivo de “diminuir a disseminação da desinformação por meio de vários programas, como jornalismo de investigação, capacitação e educação em literacia mediática”. 

O programa, desenvolvido em parceria com o MediaWise do Instituto Poynter, formou até agora 27 formadores, que alcançaram mais de 3200 pessoas em diferentes comunidades. Talita Rosa é uma das participantes seleccionadas. 

A jornalista contou ao Instituto Poynter que o seu interesse pelo tema surgiu em 2017, quando ouviu pela primeira vez a expressão “notícias falsas” num curso online, anos antes de ela entrar no vocabulário quotidiano dos brasileiros. Esse contacto inicial levou-a a fundar o “Prova Real”, um projecto pioneiro de verificação de factos no Sul do Brasil. Com o tempo, porém, Rosa percebeu que combater a desinformação exigia mais do que apenas jornalistas: “exigiria uma mudança fundamental na forma como as comunidades entendem e partilham informações”. 

Ao participar na formação do ICFJ e da MediaWise, Rosa aprofundou os seus conhecimentos técnicos e pedagógicos, mas o que mais a marcou foi a constatação de que “o planeamento do treinamento deve basear-se nas necessidades do público, e não apenas nas convicções do treinador como educador”. Como ela própria resume: “A troca de experiências ampliou a minha compreensão das realidades e perspectivas de outros contextos, contribuindo para uma visão mais global do combate à desinformação”. 

Rosa delineou um plano de formação centrado em três perguntas essenciais: Por onde começar? Quem treinar? Como alcançá-los?. A resposta surgiu ao observar a vulnerabilidade dos idosos, grupo que, embora activo digitalmente, “consome as informações que chegam às suas plataformas de mensagens — especialmente vídeos e imagens”, muitas vezes sem capacidade técnica para distinguir o verdadeiro do falso. 

Com o apoio do Conselho Municipal dos Direitos do Idoso, Rosa criou uma série de oito workshops, que envolveram mais de 150 participantes. A sua abordagem baseou-se em encontrar as pessoas onde elas estão, isto é, no WhatsApp, a plataforma onde se concentram os fluxos informativos e onde também circula grande parte da desinformação. 

Antes de cada sessão, Rosa distribuiu um questionário diagnóstico para compreender o nível de literacia mediática do grupo e avaliar as preocupações dos participantes. Durante as oficinas, iniciou as actividades com exemplos práticos do quotidiano, discutindo temas como “reforma, golpes financeiros, desinformação sobre saúde”. Para tornar os conceitos acessíveis, recorreu a analogias simples — por exemplo, “comparou identificar notícias confiáveis a reconhecer notas de banco autênticas”, ensinando a procurar “as pistas a serem procuradas para distinguir entre marcas legítimas e falsificadas”. 

Consciente das limitações tecnológicas dos participantes, Rosa adaptou as metodologias: evitou o jargão digital e substituiu técnicas complexas de verificação por estratégias visuais e auditivas mais intuitivas. A inovação maior veio da integração da ferramenta de verificação de inteligência artificial do WhatsApp, lançada na mesma altura. Rosa mostrou como usá-la para confirmar conteúdos duvidosos, transformando uma ferramenta quotidiana num instrumento de cidadania digital. 

Um dos resultados mais notáveis das oficinas foi a criação do grupo de WhatsApp “Conta Outra”, com cerca de 100 membros, onde os participantes “usam o chat para partilhar mensagens questionáveis, verificá-las em conjunto e alertar-se mutuamente sobre fraudes”. No fundo, trata-se de “um espaço sem julgamentos, onde os idosos se reúnem para apoiar uns aos outros na sua busca por informações confiáveis”. 

Além disso, Rosa levou alguns dos formandos a visitar redacções locais, permitindo-lhes observar como se produz uma notícia. Esta experiência ajudou a “desmistificar o processo e fortalecer a confiança nos media locais”, reforçando a ligação entre comunidade e imprensa. 

Os participantes saíram das oficinas “mais resilientes e preparados para enfrentar um ecossistema de informação complexo”. Um dos depoimentos mais ilustrativos foi o de um idoso que admitiu que, antes da formação, ignorava as correcções do filho por as considerar “preconceito político”, mas que depois “reconhece os sinais de manipulação por conta própria”. 

Um modelo de literacia inclusiva 

As oficinas de Talita Rosa demonstram que a educação mediática pode ser eficaz quando se adapta ao contexto social, tecnológico e cultural do público. Como ela explica, “eles mostraram uma abertura para aprender, o que foi muito contagiante”, e muitos “expressaram preocupação quando compreenderam os riscos a que estão expostos através do WhatsApp”. 

Insatisfeita com os métodos tradicionais, Rosa iniciou um mestrado em design de informação, procurando descobrir “como o design de informação pode tornar as notícias e as verificações de factos mais acessíveis aos brasileiros”. Paralelamente, continua a expandir o seu trabalho, agora também em escolas secundárias, com foco no combate à desinformação climática e na protecção dos oceanos. 

(Créditos da imagem: Talita Rosa/ imagem retirada do site do Instituto Poynter)