O século XIX - sobretudo a partir das lutas liberais - foi, no nosso país, o tempo dessa adaptação, marcada por uma luta entre a elite progressista dos inovadores e os saudosistas do antigo regime. A famosa Geração de 70 deixou-nos como referência a célebre conferência proferida por Antero de Quental sobre "As causas da decadência dos povos peninsulares" e a ironia fina da prosa de Eça de Queirós que tão bem retrata as duas correntes em confronto.

 

Os anos do pós-guerra, já no século passado, trouxeram à Europa uma nova e enorme transformação. A reconstrução iniciada com o plano Marshall e impulsionada pela energia fóssil – nomeadamente, pelo petróleo e pelo automóvel - conduzem a uma sociedade mais urbana, mais escolarizada, já com um sistema de apoio social. Surge, por essa altura, a ideia de uma Europa Unida, e o Portugal de Salazar, apesar do dilema colocado pela manutenção das colónias africanas, não tem outra solução senão a inovação e uma lenta aproximação à Europa. O instrumento encontrado para esse fim são os conhecidos Planos de Fomento com as suas reformas na administração, na educação, na saúde, nas grandes obras, na agricultura, na indústria e nas vias de comunicação. Em 1960, Portugal adere à EFTA, uma zona de comércio livre impulsionada pela Inglaterra. O então ministro Correia de Oliveira - que participou ativamente nas negociações para a adesão à EFTA - considerava que a Europa e a continuação da nossa presença em África eram desejáveis e compatíveis para Portugal.

 

Entretanto, a emigração para a Europa aumenta fortemente e, ela própria, é um contributo para a integração. Perante este surto de desenvolvimento e progresso – o País registou, nesse período, as taxas de crescimento do PIB mais elevadas da sua história - a oposição está dividida entre apoiar ou rejeitar a política económica da ditadura. O Partido Socialista, adepto de uma linha europeísta, funda-se em 1973 na Alemanha, apoiado por partidos europeus.

 

Após o 25 de Abril, na confusão do período do PREC, Portugal torna-se um país à deriva, sem saber se deve rumar para África, para a Europa ou para o Terceiro Mundo - na altura alinhado com a esfera soviética. Porém, rapidamente se tornou claro que só a opção Europa era compatível com a democracia. Em 1977, Portugal pede a adesão à CEE, e a concretização desse objetivo passa a ser o grande projeto nacional. Seguem-se grandes reformas estruturais que recuperam a ideia dos planos de fomento da ditadura – conduzidas ainda, nalguns casos, pelas mesmas pessoas que os tinham concebido como foi o caso, entre outros, do economista José da Silva Lopes. O período 1986-1992 foi um período de grande euforia que viu nascer um País novo. A comemoração do dia de Portugal, em 10 de junho, reflete, de alguma forma, os novos tempos. Antes evocativo do passado imperial, saudosista, passou a simbolizar o Portugal das comunidades, do sucesso das novas elites, da prosperidade, dos campeões.

 

Todavia, a crise que adveio nos anos mais recentes volta a colocar interrogações. Muitos já perguntam se o projeto Europeu ainda faz sentido? Para Rui Ramos, a resposta é, definitivamente, afirmativa: Portugal tem de ser a casa comum de todos os portugueses. Porém, para isso precisa de estabilidade e, agora, também da Europa, entendida esta não apenas como uma democracia formal, mas como um espaço que defenda e proteja a democracia. Esta Europa trouxe a paz ao continente europeu, e em tempo algum os seus povos viveram uma situação melhor!

Também eu estou convicto que não há portugalxit possível. Mas, fala-se e discute-se ainda como se houvesse. Os políticos digladiam-se ainda entre si, lutando pelo poder e pelas suas benesses como se fôssemos um país soberano. Na realidade teimamos em não querer discutir o Portugal que queremos ser. E isso mergulha-nos na angústia e ansiedade que suscitam a imprevisibilidade do Portugal que vamos ter.

 

Saio desta última conferência com a convicção de que Portugal está condenado a ser um país inconformado, hesitante, sem rumo e sem consensos. Como se tivéssemos de cumprir este fado de ser um país à deriva, recusando a praxis que nos oferecem. Como se fizesse parte dos nossos genes a crença sebastianista e saudosista de que Portugal só se cumprirá nas névoas do Quinto Império...