A Europa depois do Brexit
Carlos Gaspar considera esta saída paradoxal tendo em conta que, no rescaldo da II Guerra Mundial, a Inglaterra foi um dos grandes impulsionadores da ideia de criar uma Europa Unida. Lembra, a propósito, o pensamento de Churchill e associa-o à ideia da formação de um exército europeu e à criação da NATO pelo o tratado de Washington. Refere ainda que, mais recentemente, o Reino Unido dentro da Europa estava no centro do programa de governo de Tony Blair. Considera que a Nato e a Inglaterra são dois pilares onde assenta a construção europeia, razão pela qual não consegue imaginar a Europa sem o Reino Unido. Ela ficará desequilibrada pelo peso da Alemanha, país que, na sua opinião, não reúne nem as qualidades políticas nem diplomáticas para substituir a Inglaterra. E remata a sua intervenção concluindo: o brexit tem tudo para correr mal.
Nuno Rogeiro, um conhecido jornalista interessado pelos temas da politica internacional, falou a seguir. Num tom menos fatalista, começou por comparar o e brexit e a eleição de Trump. Encontra analogias nos dois acontecimentos, chamando-lhes processos dinâmicos, visto não estarmos perante situações definitivas. São, no seu ponto de vista, processos regulares, não irreversíveis. Um dia, tudo pode vir a mudar: o Reino Unido poderá voltar à casa comum dos europeus e virá tempo em que Donald Trump deixará a Casa Branca e os democratas poderão voltar a ocupá-la. Tanto o resultado do referendo no Reino Unido como a eleição de Trump têm a ver com a percepção dos eleitores de que alguma coisa não está a ir bem. No caso do brexit refere-se à complexidade do processo considerando que existem, no Reino Unido, três tipos de partidários da saída da União Europeia: os envergonhados, os assumidos, e os independentistas radicais do UKIP. Acrescenta que os ingleses invocaram três razões para o brexit : 1) que o Reino Unido dá mais do que aquilo que recebe da Europa; 2) que existe um excesso da burocracia e do peso legislativo na UE e que 3) o problema dos refugiados veio criar uma grande insegurança das fronteiras. Para explicar a eleição de Trump fala da existência de bolsas de pobreza nos Estados Unidos e na subversão dos conceitos de direita e de esquerda.
Generaliza-se a ideia de que existe um caminho de retrocesso na Europa. Alguns acreditam que depois de um passo atrás poderá haver dois para a frente. Que a Inglaterra pode voltar ao seio da União, e que Trump pode deixar a Casa Branca. Mas, acho eu, nada voltará a ser como dantes. Não se podem já apagar as marcas dos ventos da história que levaram os homens à Lua, que emanciparam os povos das antigas colónias europeias, que ergueram e derrubaram muros, que trouxeram o conforto às nossas casas, a mobilidade e o estado social. E que trouxeram uma nova forma planetária de comunicar.
O regresso dos nacionalismos é contrária à corrente implacável das leis da evolução. O encerramento de fronteiras e o regresso do protecionismo económico - este, curiosamente, defendido tanto pela esquerda como pela direita radical - vai ao arrepio da exigência do crescimento económico. Só pode levar à recessão e às consequências que ela acarreta nos planos financeiro, social e assistencial. Mas a globalização consumista, predadora de recursos e poluidora também não é solução. Estamos perante um dilema. E convém não esquecer que são os dilemas que estão na origem das guerras.
A virtude só pode estar no meio: nem protecionismo nem globalização selvagem. Ora, a virtude emana dos homens bons e sensatos. No ruído da confusão que está a percorrer o mundo e a extremar posições já ninguém parece querer ouvir a sua voz.