A adaptação do jornalismo às redes sociais não implica perder credibilidade nem rigor informativo. É apenas preciso aplicar os princípios de sempre do jornalismo: perceber com quem se está a comunicar, quais são as histórias que merecem ser contadas e qual é o formato mais adequado a cada plataforma.

Esta é a opinião de Fermín Elizari, à frente do departamento de Novas Comunidades (redes sociais) no Relevo, jornal digital desportivo espanhol do Grupo Vocento.

O responsável conta como foi o processo de construção da estratégia de sucesso que o jornal segue actualmente e como é fazer jornalismo nas redes sociais no dia-a-dia.

A experiência é partilhada num artigo dos Cuadernos de Periodistas, da Asociación de la Prensa de Madrid, com a qual o Clube Português de Imprensa mantém uma relação de parceria.

Ponto de partida: “Conhece a quem te diriges”

Na equipa das Novas Comunidades do Relevo, ficou claro desde o início que a atenção seria dirigida primordialmente à Geração Z [jovens até aos 24 anos, aproximadamente], “que não tem o hábito de visitar sites e que fica a saber do que se está a passar através das redes sociais”.

Também foram identificados dois outros grupos a ter em atenção: os millenials [entre os 25 e os 45 anos], “desencantados com a cobertura das principais empresas do mercado”; e as mulheres, “invisíveis a nível informativo”.

Definido o público, Fermín pergunta (e responde): “Onde está esta audiência? Nas redes sociais”.

No Digital News Report de 2023 do Reuters Institute, é clara esta tendência: a percentagem de consumidores de notícias do Reino Unido entre os 18 e os 24 anos que recorrem a sites ou aplicações para obter informação tem vindo a cair nos últimos anos, estando próximo dos 24%.

Ao mesmo tempo, para 57% das pessoas da Geração Z, o terceiro motivo para o uso das redes sociais é “entender a actualidade”, segundo dados do Interactive Advertising Bureau (IAB), que publicou recentemente, em Espanha, o Estudio de Redes Sociales 2024.

Segundo passo: Definir a estratégia de comunicação

Ao contrário dos meios tradicionais, o objectivo desta equipa é “gerar comunidade, em vez de atrair tráfego para o site, adaptando o tom e o formato aos hábitos de consumo dos utilizadores”.

Assim, a equipa começou por identificar as redes sociais onde iria comunicar, tendo optado por quatro plataformas: TikTok e Twitch, mais populares entre a Geração Z; e Instagram e X, “mais maduras e com um público mais millenial”. (Actualmente, o jornal praticamente já não tem presença no Twitch e está a planear reduzir a quantidade de publicações no X.)

De seguida, a equipa definiu o tipo de comunicação que iria usar em cada rede.

No X, não é preciso dar muito contexto, porque os utilizadores-tipo estão mais ou menos a par da actualidade. No Instagram, a opção é contar histórias relacionadas com o desporto, mais do que informar sobre últimas horas e resultados. O Twitch é (era) mais direccionado para acompanhamento de notícias ao minuto. E no TikTok a abordagem é de entretenimento, com a informação a ser passada de forma dinâmica.

Para isso, é “primordial” ter uma “equipa jovem que saiba que narrativas é preciso utilizar em cada aplicação para transmitir a mensagem e conseguir que a audiência interaja com as publicações”, descreve Fermín Elizari.

São necessários “jornalistas que saibam como reagir a uma notícia de última hora ou que utilizem ferramentas de edição de vídeo no telemóvel”. Ao mesmo tempo, é essencial “incluir perfis que até agora estavam afastados das redacções”, como os criadores de conteúdos, designers para redes sociais e criativos.

“Sempre com a credibilidade e o respeito pela informação como mantra”, acrescenta o autor.

“A partir daqui, o exercício que fazemos todos os dias é o mesmo que se aplica ao jornalismo desde que este nasceu: ver quais são as histórias do dia e decidir que formato é o mais adequado para as contar. Não há muito mais”, resume.

As várias velocidades nas redes sociais

Quando chega um novo tema, a redacção precisa de decidir se se trata de um assunto de “primeira velocidade” ou de “segunda velocidade”.

Ou seja, é necessário avaliar se é uma informação que deve ser contada em tempo real ou se procuram um ângulo particular do acontecimento, que a seguir desenvolvem.

Consoante a decisão, são escolhidas as redes sociais mais adequadas — X para notícias imediatas; Instagram e TikTok para conteúdos que podem esperar um pouco e em que depois é dado contexto.

Existem ainda os formatos da “terceira velocidade”, que não é determinada pela actualidade e de que são exemplo entrevistas ou documentários mais longos.

No fundo, “conteúdos que mostram que as novas gerações não consomem apenas vídeos de dança curtos”, remata Fermín Elizari.

(Créditos da fotografia: dlxmedia.hu no Unsplash)