O trabalho meticuloso do jornalismo de investigação pode ser muitas vezes visto como pouco atraente para o grande público. Ao mesmo tempo, alguns dados indicam que há cada vez mais pessoas interessadas na profundidade deste tipo de trabalho.

Ainda assim, é preciso captar a atenção do público e ser distintivo na forma como se transmite a informação.

O jornalista Ricardo Ginés escreveu um artigo em que apresenta algumas das abordagens a que o jornalismo de investigação pode recorrer para chegar aos leitores, algumas tradicionais, outras mais “brilhantes” ou “loucas”.

O texto foi publicado pelo Exposing the Invisible, um projecto que procura disseminar conhecimento na área da investigação, como parte da Collaborative and Investigative Journalism Initiative, financiada pela União Europeia.

  • “Os clássicos”: artigos, livros de não-ficção, filmes, documentários

“Quando pensamos em jornalismo de investigação, uma das primeiras coisas que nos vem à cabeça é, claro, o escândalo do Watergate”, começa por dizer o autor do artigo, referindo-se ao caso que levou à demissão do então presidente dos EUA Richard Nixon, em 1974.

Aquilo que começou por ser um conjunto de artigos na imprensa escrita (The Washington Post, entre 1972 e 1974) tornou-se, logo de seguida (1974), num livro de não-ficção (All the president’s men) e, mais tarde (1976), num filme (com o mesmo nome). O caso deu origem a uma série de documentários ao longo das últimas décadas.

O formato “filme” para a apresentação de investigações jornalísticas tem tido tanta adesão, que existem já festivais dedicados a este género — Double Exposure Investigative Film Festival, nos EUA, e Investigative Film Festival Skopje (agora com o nome Media Festival Skopje), na Macedónia do Norte.

Também na Netflix já se encontram muitos filmes sobre grandes investigações jornalísticas.

  • Podcasts

O jornalismo de investigação tem encontrado um nicho especial no ambiente dos podcasts, o chamado “true crime”, série de episódios sobre casos reais que estiveram sob investigação.

O início do fenómeno é habitualmente atribuído ao Serial, que começou por ser produzido pela This American Life e actualmente é propriedade do New York Times.

Hoje em dia, cada vez mais organizações de média publicam as suas investigações em formato podcast numa série de episódios que acompanham não só os pormenores das histórias, mas também os bastidores do trabalho dos repórteres. [No contexto português, encontramos casos destes na SIC, “A Agenda de Ricardo Salgado”; no Público, “O Denunciante”; e, de alguma forma, nos podcasts narrativos no Observador, por exemplo, “O Sargento na Cela 7”.]

  • Artes performativas: teatro, reporter slam, circo

Várias investigações jornalísticas têm dado origem a peças de teatro, havendo exemplos disso na Alemanha, com o grupo de teatro “Investigative Theatre”, no Reino Unido, com o Bureau of Investigative Journalism, o austríaco Dossier, ou a peça norte-americana “The Box”, da jornalista Sarah Shroud, sobre as condições das prisões nos EUA.

À semelhança do poetry slam (competições de declamação de poesia com tom performático), o reporter slam leva jornalistas ao palco a falar sobre as suas investigações, partilhando a informação jornalística de uma forma cativante e criativa. No final, o público vota na sua actuação favorita. O formato já existe em vários países, incluindo a Alemanha, Albânia, Hungria e Finlândia.

Já a artista Roxana Küwen tem trabalhado numa fusão pioneira de formas de arte ao transformar os resultados de uma longa investigação numa actuação de circo, com o apoio de profissionais da representação.

  • Humor

Seja através de cartoons ou de programas satíricos, muitas vezes o conteúdo humorístico “capta mais a atenção do público e ajuda-o a reter a informação”.

O autor do artigo chama a atenção, por exemplo, para o caso do programa de sátira (principalmente) política “Last Week Tonight”, em que o humorista britânico John Oliver partilha com o público informação pormenorizada de casos noticiosos de relevo, sendo a sua equipa composta por jornalistas de investigação. Vários outros países têm programas similares.

  • Gamificação

Embora seja pouco comum e possa parecer contra-intuitivo, algumas publicações foram bem-sucedidas quando decidiram transformar as suas investigações jornalísticas numa espécie de jogos interactivos em que o leitor tem de ir analisando a informação que lhe é dada a cada momento e tomando decisões para avançar na história.

O formato não só capta a atenção do leitor como permite uma espécie de experiência imersiva no contexto que foi alvo de investigação. A Al-Jazeera já recorreu a este formato mais de uma vez — no artigo “Porque decidimos gamificar o jornalismo de investigação da Al-Jazeera”, a jornalista Juliana Ruhfus explica a decisão e o processo.

Também o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação criou jogos inspirados na investigação dos Panama Papers, em que os leitores podem assumir o papel de uma personagem e “experimentar várias opções de evasão fiscal”, ao mesmo tempo que testam os seus conhecimentos — "Stairway to Tax Heaven" e "Continent of Secrets: Uncovering Africa’s offshore empires" (este último foi criado com o apoio do Pulitzer Center).

No artigo, Ricardo Ginés partilha, ainda, as descrições e os resultados de formatos como música, poersia, marionetas, banda desenhada e jogos de vídeo.

“Este é apenas um ponto de partida para considerar outros formatos e formas de partilhar os resultados de investigações. Há mais para explorar e nos quais nos podemos inspirar”, conclui o autor.

(Créditos da fotografia: Facebook do Pop-up Magazine, um projecto que encena espectáculos de jornalismo)