A imprensa livre em debate entre o poder e a transparência

O encontro foi dividido em dois painéis, com três oradores e moderação de Serrano. Do primeiro painel, intitulado”Há democracia sem imprensa livre?”, fizeram parte o jornalista, professor e colunista da Rádio USP Carlos Eduardo Lins da Silva, a jornalista Marina Amaral, uma das fundadoras da Agência Pública, e Pedro Varoni, director editorial do Projor – Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo e editor responsável pelo Observatório da Imprensa.
Lins da Silva, começou por dizer que “hoje, não sabemos o que será da imprensa e da democracia diante do mundo que estamos vendo.” E acrescentou, “a situação americana serve como balizamento, já que entre 2008 e 2017 o número de jornalistas empregados nos Estados Unidos caiu para metade. Isso mostra como os jornalistas estão a perder espaço”, afirmou, mostrando ainda um outro dado americano: “ há 20 anos atrás, o número dos profissionais de relações públicas era o dobro do número de jornalistas. Hoje, a proporção é de seis RPs para cada jornalista”.
Salientou a necessidade de autocritica da Imprensa, uma vez que na sua opinião muitas vezes, “o problema está dentro da profissão, com a tendência dos jornalistas se considerarem vítimas, o que não é bom para o desenvolvimento da actividade”.
Muitas vezes “os jornalistas são arrogantes, estão distanciados do seu público e falam de uma forma que a sociedade não consegue apreender”.
A jornalista Marina Amaral, abordou o assunto por outro prisma, quando afirmou que,” a ideia do furo – a chamada informação exclusiva -, tão cultivada no passado, pode estar com seus dias contados. Porque o que interessa, de facto, é combater com a verdade os ataques que a imprensa vem sofrendo e ampliar o número de vozes que falam com a sociedade”.
Pedro Varoni, do Observatório da Imprensa, falou sobre o projecto ‘Atlas da Notícia’, onde foi apurado que cerca de 70 milhões de brasileiros vivem num ‘deserto de notícias’, ou seja, as notícias não chegam a essas pessoas”. Mas apresentou uma possível solução - o jornalismo local pode proporcionar um vínculo maior com o processo democrático. Por isso é importante “reforçar o jornalismo local para as comunidades pequenas.”
“O jornalismo nunca está do lado do poder. Se isso acontece, alguma coisa está errada”, afirmou João Gabriel de Lima. “As fontes de informação multiplicaram-se e, muitas vezes, são usadas para atacar a imprensa. Faz parte do processo democrático. Porém, muitos governantes usam as redes sociais para minar a credibilidade do jornalismo”.
Segundo editor-executivo do Estadão, isso faria parte de uma estratégia articulada. “A ideia é dizer, ou insinuar, que quando a imprensa ataca membros do governo, ela teria uma agenda oculta político-partidária. Quando se publica algo que desagrada ao governo, isso não seria informação, e sim oposição. E mina-se a credibilidade dessa forma.”
Mas há um antídoto para isso: transparência. “Temos que deixar claro para o leitor qual é a missão do jornalismo, sem partidarismos, sem sectarismo, e como nossas reportagens são feitas. Temos que ser mais honestos com os nossos leitores. Assim, podemos manter a nossa credibilidade”.
Na sequência da ideia de credibilidade e transparência, Vinicius Mota, da Folha, apresentou uma série de reportagens do seu jornal que sofreram ameaças de censura. “Estamos numa sociedade de superpoderosos, como a presidência da república, o congresso, o STF. O jornalismo não tem esse poder, mas precisamos manter nossa independência, mesmo sofrendo com as ‘subtilezas do poder’”, argumentou. Essa “subtileza”, na verdade, seria um eufemismo para o nome que ela tem, de facto: censura. “É como se perguntássemos: quem fiscaliza o fiscal?”.
Eugênio Bucci, Professor da Escola de Comunicações e Artes no Departamento Informação e Cultura, traçou um panorama dos desafios do jornalismo actual - “devemos vencer o preconceito, sobre o financiamento público do jornalismo. Por outro lado, devemos manter a nossa independência, e seguir o caminho da transparência e do esclarecimento”.
“O jornalismo – afirmou – precisa de levar mais em conta a função do esclarecimento, que tem a ver com educação, com a formação tanto de novos leitores como de novos cidadãos. Mas tudo isso ainda está por ser feito”.
(Mais informação no Jornal da Universidade de São Paulo)