A evolução do digital na mídia
Para este Digital News Report o seu autor, Nic Newman, recolheu no último trimestre do ano passado as opiniões de 303 responsáveis de empresas de mídia em 53 países. Sem grandes surpresas, a maioria dos entrevistados manifesta apreensão sobre o efeito da inflação e da guerra e apenas 44% se mostraram confiantes sobre as perspectivas das suas empresas para 2023.
Uma preocupação que começa a surgir é o declínio do tráfego nas edições on-line, uma quebra nas fontes de receitas e indícios de alguma saturação dos leitores, que se queixam de notícias demasiado negativas, repetitivas e pouco credíveis, procurando conteúdos mais positivos, explicativos e úteis.
Em diversas geografias existem já sinais claros de uma menor procura de notícias e de afastamento em relação ao seu consumo regular, aquilo a que o autor chama news avoidance and disconnection. A isto acresce a quebra de audiência das redes sociais de primeira geração.
Facebook e Twitter procuram a melhor forma de reter as suas audiências enquanto se debatem com o facto de os seus utilizadores mais velhos começarem a ficar aborrecidos com os conteúdos que encontram e os mais novos a afastarem-se para novas plataformas como o Tik Tok.
Segundo Nic Newman existe um movimento, já perceptível, de utilizadores que preferem maior interação e em conteúdos que tenham um efeito positivo na sociedade, em vez dos conteúdos que manifestam protestos e expressam raiva e desacordo.
No meio de tudo isto começam a surgir novas plataformas e novas tecnologias, com destaque para a inteligência artificial (IA).
O prognóstico dos entrevistados que trabalham em organizações de mídia tecnicamente mais evoluídas é que 2023 trará uma maior disseminação de IA nas redacções, com ferramentas que vão deste a transcrição de voz, até à utilização de avatares, passando por outras que proporcionam a elaboração de textos ou de ilustrações com base em parâmetros definidos, desde o Wordcraft da Google até, noutra vertente, ao Chat.openai.com , que ganhou tanta notoriedade que esgotou temporariamente a sua capacidade a meio desta semana.
Também conhecida como chat.gpt, trata-se de uma solução de IA que tem uma componente relacional que a aproxima de um novo modelo de redes sociais. E outra novidade na área, saída das crises do twitter, é o Telegram.
Ou seja, o Facebook nasceu em 2004 e o ciclo que iniciou nessa altura está agora a sofrer grandes transformações. Um executivo da Google ouvido pela imprensa da especialidade admite que 40% dos utilizadores mais novos preferem recorrer ao Instagram ou TikTok em vez de utilizarem as ferramentas de busca e localização tradicionais quando procuram por um restaurante ou algum local que esteja mais na moda.
Para além da cada vez maior utilização destas ferramentas nas redacções, noutras áreas da indústria de mídia a IA vai também ocupar mais protagonismo, desde uma capacidade maior de fornecer conteúdos e formatos personalizados aos leitores, auxiliando a evitar uma fragmentação da atenção dos consumidores por vários canais e uma sobrecarga de consumo de informação pouco útil.
A questão que se coloca, e que Nic Newman destaca, não é saber qual a velocidade com que somos capazes de adoptar novas ferramentas digitais, mas sobretudo como poderemos transformar os conteúdos digitais para corresponder aos desejos dos leitores e utilizadores.
As organizações de mídia que ainda não abraçaram de forma global o digital vão estar em séria desvantagem.
(Texto publicado originalmente no DN – Dinheiro Vivo)