A personalização das notícias por IA como ferramenta útil

Embora muitos meios de comunicação social personalizem recomendações de notícias há anos, a introdução da inteligência artificial generativa está a transformar não apenas o conteúdo sugerido, mas também o formato em que as notícias são apresentadas.
Um artigo do Nieman Lab conta que as redacções “estão cada vez mais a tentar utilizar a IA para ajudar a fornecer notícias que sejam mais relevantes e acessíveis para o público, numa altura em que o interesse pelas notícias diminuiu e a evitação surgiu em muitos países”.
Diversas redacções começaram já a implementar funcionalidades personalizadas nos seus websites. O jornal sueco Aftonbladet, por exemplo, permite que os leitores resumam automaticamente os artigos. Nos Estados Unidos, o Miami Herald oferece a conversão de texto em áudio, enquanto o argentino Clarín disponibiliza análises complementares através da ferramenta UalterAI — incluindo citações, dados relevantes e glossários de termos técnicos. O Washington Post, por sua vez, tem vindo a experimentar ferramentas que permitem responder a perguntas complexas, baseando-se nos seus próprios arquivos.
De acordo com o inquérito do Reuters Institute a líderes de redacções, quatro em cada cinco prevêem utilizar IA para melhorar as recomendações editoriais no próximo ano. As experiências mais planeadas incluem a conversão de texto em áudio (75%), resumos automáticos (70%), traduções (65%) e a integração de chatbots baseados em IA (56%).
Onde fica o interesse dos leitores
Apesar do entusiasmo editorial, “o sucesso dessas ferramentas dependerá, em grande parte, do interesse do público”. O Digital News Report 2025 indica que o interesse global é “relativamente baixo” para qualquer funcionalidade de personalização alimentas por IA — abaixo dos 30%. No entanto, mais de metade dos inquiridos demonstrou curiosidade por pelo menos uma opção.
As ferramentas mais procuradas são as que visam aumentar a eficiência e relevância no consumo de notícias: resumos (27%) e traduções (24%) lideram, seguidas de páginas iniciais personalizadas, recomendações e alertas (21% cada). Em contrapartida, o texto-áudio, uma das funcionalidades mais prioritárias para os directores de redacção, foi das menos populares entre os inquiridos. Ainda 19% dos inquiridos disseram não estar interessados em nenhuma das opções e 15% disseram não saber.
As percepções do público sobre o uso de IA no jornalismo têm impacto directo no interesse por personalização, que é “geralmente menor em locais onde as pessoas tendem a sentir-se mais desconfortáveis com a utilização de notícias criadas por IA”.
No Reino Unido, 64% dos inquiridos sentem-se desconfortáveis com notícias maioritariamente geradas por IA — a percentagem mais elevada entre os países estudados. Simultaneamente, 41% afirmaram não estar interessados em nenhuma das opções de personalização — mais do dobro da média global.
Pelo contrário, “na Índia e na Tailândia, onde menos pessoas se sentem desconfortáveis com a IA, mais pessoas manifestam interesse por pelo menos uma opção”.
As opções preferidas variam também consoante o país, o que reflecte as necessidades locais. Enquanto a sumarização é geralmente a mais popular, a tradução assume maior relevância em países com línguas minoritárias ou menos disseminadas internacionalmente, como a Finlândia e a Hungria. Já nos Estados Unidos, a tradução fica abaixo da média.
A opção de adaptar as notícias aos diferentes níveis de leitura é particularmente valorizada em países com níveis mais baixos de literacia, como as Filipinas, Quénia e Nigéria. Na Índia, esta funcionalidade foi a mais escolhida, por mais de um terço dos inquiridos.
Globalmente, 66% dos inquiridos seleccionaram pelo menos uma opção de personalização. No entanto, entre os menores de 35 anos esse número sobe para 76%. Estas diferenças são ainda mais marcadas em funcionalidades como chatbots ou personalização de formatos, indicando que o conforto com tecnologias de IA tende a ser maior entre os mais jovens. “As organizações de notícias podem querer concentrar este tipo de iniciativas em públicos mais jovens”, sugere o relatório.
Poderá a personalização da IA ajudar a incentivar a utilização das notícias entre os mais desinteressados? Esta é uma das questões levantadas pelo Nieman Lab. “Os dados sugerem que o interesse geral tende a ser menor entre os menos interessados em notícias e os que as evitam com mais frequência”. Apesar do interesse limitado, algumas funcionalidades podem atrair nichos específicos. Entre aqueles que evitam notícias por considerarem o conteúdo difícil de compreender, 32% mostraram interesse em ferramentas que simplifiquem a linguagem — quase o dobro da média geral (17%).
O relatório conclui que a adopção da personalização por IA será desigual. Países como a Índia e Tailândia, mais receptivos à IA, poderão avançar rapidamente, enquanto mercados mais conservadores, como o Reino Unido e a Alemanha, evoluirão de forma mais cautelosa.
“Dado o interesse bastante reduzido por uma única opção, as redacções podem ter mais sucesso se fornecerem uma selecção de opções de personalização de IA à escolha dos utilizadores”. Por fim, sublinha-se que o interesse manifestado não se traduz necessariamente em utilização real, e vice-versa. A falta de familiaridade com determinadas funcionalidades poderá explicar a fraca adesão inicial.
“O fosso notável entre a principal iniciativa de IA planeada pelos directores das redacções e as opções mais populares entre o público sugere que as redacções precisam de estar atentas aos tipos de iniciativas que irão criar valor ou resolver problemas para o seu público na prática”, ressalva o Nieman Lab.
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