Várias organizações de direitos humanos e jornalistas locais têm vindo a alertar para o rápido declínio da liberdade de imprensa em toda a Ásia. Descrevem a situação como “gelo a derreter”. Casos como o da ex-advogada e jornalista cidadã chinesa Zhang Zhan, presa por divulgar informações independentes sobre o surto de COVID-19 em Wuhan, revelam a repressão crescente ao jornalismo livre na região. Zhang foi novamente condenada a quatro anos de prisão por “provocar distúrbios e problemas”, uma acusação que, segundo aponta a NPR, é frequentemente usada pelas autoridades chinesas para silenciar jornalistas e activistas. 

Dados dos Repórteres Sem Fronteiras (RSF) revelam que as detenções de jornalistas na região Ásia-Pacífico aumentaram de 69 em 2010 para 334 em 2022, com uma ligeira queda para 300 em 2024. A China, o Afeganistão, o Vietname e Mianmar são os principais responsáveis por este aumento. A China mantém-se como o país que mais prende jornalistas — 112 no total, além de oito em Hong Kong —, seguida de Mianmar, com 51 profissionais detidos desde o golpe militar de 2021. 

O académico Ross Tapsell, da Universidade Nacional Australiana, afirma que o fenómeno reflecte um declínio mais amplo da democracia na região, caracterizado por uma erosão das liberdades, agravada pela dependência dos meios de comunicação em relação à publicidade estatal e pelo controlo governamental sobre as plataformas digitais. 

A intimidação e a violência nas Filipinas 

Nas Filipinas, a violência contra jornalistas intensificou-se nos últimos anos. Durante o governo de Rodrigo Duterte, registaram-se mais de duzentos ataques a profissionais da comunicação social, muitos com envolvimento de agentes do Estado. O Centro Filipino de Jornalismo Investigativo contabilizou um total de 22 profissionais dos media mortos entre 2016 e 2022. 

Embora o discurso governamental do actual presidente, Ferdinand “Bongbong” Marcos Jr., aparente ser mais brando, os ataques aumentaram ainda mais. A meio do mandato de Marcos, os ataques e ameaças documentados contra jornalistas aumentaram 44% em comparação com todo o mandato de Duterte, de acordo com o centro de jornalismo investigativo. 

“O que está no topo da lista é a intimidação”, disse Rhea Padilla, directora de notícias da AlterMidya, uma rede nacional de meios de comunicação locais nas Filipinas. “Os jornalistas são frequentemente rotulados como comunistas ou terroristas”, completa. "Não se trata apenas de ofensas. Isto realmente coloca vidas em risco. Justifica a vigilância, justifica a prisão.” 

O país também ainda carece de uma lei de liberdade de informação, e a difamação continua a ser crime. Mesmo assim, há sinais de resistência: repórteres e sindicatos de jornalistas começaram a recorrer aos tribunais contra campanhas de difamação e perseguição. 

O caso da Indonésia 

Na Indonésia, a violência física e o assédio contra jornalistas cresceram de forma constante, atingindo o ponto mais alto da década em 2023. O actual presidente, Prabowo Subianto, tem atacado abertamente os meios de comunicação, chamando-os de “agentes estrangeiros”. A revista Tempo tem sido alvo de processos judiciais e de intimidação, incluindo o envio de uma cabeça de porco decapitada para a redacção. Bagja Hidayat, editor da revista, explicou à NPR que na Indonésia, de maioria muçulmana, um porco decapitado carrega a conotação de que matar jornalistas da Tempo é permitido. 

“O governo tem muitos influenciadores alinhados com a sua narrativa», disse Hidayat. “Sempre que publicamos uma notícia crítica, essas pessoas entram em acção, bombardeando-nos com vídeos que nos desacreditam”, contou Hidayat. 

O cenário em Hong Kong 

Em Hong Kong, a situação deteriorou-se gravemente desde a imposição da lei de segurança nacional pela China em 2020. De acordo com dados dos RSF, onze jornalistas foram detidos apenas este ano, muitos meios de comunicação encerraram e centenas de profissionais deixaram o território. 

Jornalistas exilados, como Shirley Leung, agora a trabalhar a partir de Taiwan, criaram plataformas à distância para continuar a reportar sobre Hong Kong, apesar das ameaças e da vigilância transnacional. Leung disse que, além das prisões de alto perfil, os jornalistas que permaneceram no território enfrentam pressões menos visíveis, como investigações fiscais, ameaças anónimas e pressão sobre os proprietários para que não aluguem imóveis a repórteres. 

A exportação das tecnologias e métodos de controlo da informação da China — incluindo sistemas de vigilância e censura — para países como o Paquistão e Mianmar mostra a expansão do modelo autoritário chinês. 

Aleksandra Bielakowska, representante dos RSF, afirma que o governo de Xi Jinping consolidou um conjunto de restrições abrangentes para “garantir que os meios de comunicação não pudessem reportar livremente o que se passa”. O seu próprio caso, em que as autoridades divulgaram a sua morada em Taiwan, é visto como mais um exemplo de intimidação direccionada. 

Ela própria foi detida e deportada de Hong Kong em Abril de 2024, enquanto tentava assistir ao julgamento do executivo de comunicação social Jimmy Lai. O único detalhe não censurado nos documentos que recebeu posteriormente das autoridades de Hong Kong era a sua morada em Taiwan. “Mais um sinal de intimidação”, afirmou. 

(Créditos da imagem: imagem retirada do site da NPR - Kin Cheung/AP)