“Start-ups” procuram atenuar “desertos de notícias”

Num artigo publicado no Instituto Poynter, o media business analyst Rick Edmonds explica que se propôs a um exercício: verificar se os desertos de notícias, cidades que já não têm cobertura local, têm uma contrapartida - comunidades relativamente ricas em meios de comunicação social que continuam a atrair cada vez mais sites de notícias exclusivamente digitais.
“Falando com uma dúzia de observadores bem posicionados sobre o declínio e o arranque de novas empresas, o consenso foi que estas ‘florestas tropicais’ de notícias são uma ideia intrigante”, refere o autor.
O texto discute o crescimento de novas empresas de media em locais com grande procura de notícias, como as cidades de Chicago, São Francisco ou Nova Iorque, onde a falta de cobertura hiperlocal deixou lacunas, especialmente após o declínio dos jornais tradicionais. As empresas em fase de arranque reconheceram este facto e serviram várias comunidades culturais, étnicas e de estilos de vida.
Contudo, Rick Edmonds salienta que o fluxo de investimentos neste sector ainda não foi amplamente estudado. “Noutros locais, o crescimento da floresta tropical resulta de uma combinação de lacunas sentidas, especialmente um jornal de cidade reduzido ou fundadores dedicados com acesso a financiamento inicial”.
Apresenta como exemplos o Baltimore Banner, do magnata da hotelaria Stewart Bainum Jr., e o Lookout Santa Cruz, do ex-analista e consultor de notícias Ken Doctor.
As publicações regionais e estatais exclusivamente digitais tornaram-se “uma parte importante do mix de start-ups digitais e não devem ser ignoradas”. Kyle Villemain, fundador do The Assembly, na Carolina do Norte, explicou ao autor que o seu foco está em reportagens aprofundadas, ignorando notícias de última hora. Estados menores, como Vermont e Montana, foram salvos de se tornarem desertos de notícias graças ao crescimento de start-ups digitais, como o VTDigger e o Montana Free Press, que cobrem a população dispersa destes estados geograficamente grandes. Além disso, organizações de jornais impressos e digitais estão a expandir-se para novas regiões: “Entre eles, contam-se o grupo The Advocate, no Louisiana, em quatro cidades, e mais cidades no futuro; o The Minnesota Star Tribune; e o The Post and Courier de Charleston, na Carolina do Sul, com equipas de reportagem regionais em Greenville, Columbia e Myrtle Beach, entre outras cidades”.
O Atlanta Journal Constitution lançou um plano de crescimento de 150 milhões de dólares, com foco na expansão digital para o resto da Geórgia e o Sudeste dos EUA. David Grant, consultor da Blue Engine Collaborative, destacou que “reunir a combinação certa de condições para uma start-up bem sucedida é um desafio. Isso, mais do que o nível de necessidade de notícias, determinará o destino dos novos meios de comunicação”.
Do ponto de vista comercial, as empresas que estão a dar os primeiros passos precisam de “excelência operacional, experiência em custos e conhecimento de produtos e serviços - talentos que podem ser desenvolvidos”. Ressalvou que, embora a necessidade de notícias seja importante, áreas com uma forte presença mediática têm mais oportunidades de ter start-ups bem-sucedidas. Grant também observou que cidades menores, como Peoria, apresentam desafios maiores para o sucesso de novas iniciativas de media.
Jim Friedlich, director executivo do Lenfest Institute for Journalism, desenvolveu uma “visão ampla do deserto de notícias” e do cenário de start-ups após oito anos de trabalho na organização. Friedlich utiliza o termo "selvas de notícias", que significa que os consumidores de notícias precisam de “abrir caminho através de uma miríade de opções para acompanhar as notícias, em vez de se limitarem ao jornal e a um ou dois canais de televisão preferidos”.
Em 2023, o Lenfest concedeu entre 100 e 150 mil dólares cada para 17 organizações de notícias da área da Filadélfia, com um 18º a juntar-se recentemente. Os subsídios de dois anos são destinados a iniciativas específicas de sustentabilidade empresarial, bem como ao apoio operacional geral.
O autor falou também com Penny Abernathy, ex-directora do Projecto State of Local News, que popularizou o termo "deserto de notícias", destacando o fenómeno do desaparecimento de jornais, com uma média de 2,5 por semana. Abernathy corroborou a tese do autor de que “há um certo grau de enriquecimento dos mais ricos no padrão de destino dos novos meios de comunicação. Não se trata de desertos de notícias”.
“Em suma, disse-me Abernathy, para ter sucesso em comunidades de media e pequena dimensão, «tudo depende da economia». E não se esqueça, acrescentou, que para muitos dos desertos de notícias em áreas rurais isoladas que ela relatou, «eles não têm a infraestrutura ... eles podem nem mesmo ter banda larga»”.
A edição de 2024 do relatório State of the Local News abordou o impacto negativo dos desertos de notícias no conhecimento e participação cívica, mas destacou também áreas de crescimento. Ao serem analisados dados de 2005 a 2024, foram encontrados condados, como os de Cape Cod e Bloomington, que aumentaram o número de jornais, com alguns condados a registarem um crescimento líquido impulsionado por sites digitais. Entre eles estão o condado de Essex, Nova Jersey (Newark); o condado de Alameda, Califórnia (Oakland); e o condado de Providence, Rhode Island.
“Algumas redes rurais estão a colmatar as lacunas de notícias em comunidades isoladas. E cadeias com fins lucrativos como Patch, Town News e Axios Local também são uma força”, salienta Rick Edmonds.
No artigo, Indianápolis é destacada como um bom exemplo de crescimento nos media, “um caso particularmente bom de floresta tropical”. O Indianapolis Star, um dos maiores jornais da empresa Gannett, tem-se destacado pela sua cobertura, incluindo um Pulitzer em 2021. O American Journalism Project escolheu a cidade para lançar o seu terceiro projecto digital multimilionário, com o apoio filantrópico local.
O Star criou 15 novos postos de trabalho no último ano, e o Mirror Indy, lançado em Dezembro de 2023, adicionou mais 19 jornalistas, totalizando 34 novos jornalistas locais em pouco mais de um ano. São exemplos que destacam o crescimento dos media locais na era dos desertos de notícias.
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