O ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, apresentou, no passado dia 8 de Outubro, o Plano de Acção para a Comunicação Social, numa sessão integrada na conferência “O Futuro dos Media”, organizada pela Plataforma de Media Privados (PMP).

Entre as medidas mais emblemáticas encontram-se o fim da publicidade na RTP até 2027, bem como um plano de saídas voluntárias também da RTP, e a criação de incentivos à contratação de jornalistas.

Primeiro-ministro lança críticas à comunicação social

Antes mesmo da apresentação do Plano, na abertura da conferência, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, além de partilhar a sua visão para o sector dos media em Portugal, teceu alguns comentários controversos sobre o desempenho dos jornalistas.

Luís Montenegro considera que a comunicação social portuguesa deve ser “mais tranquila na forma como informa” e “não tão ofegante”. “É preciso saber que em cada momento nós estamos a discutir um determinado assunto“, afirmou, referindo-se às perguntas que lhe são feitas “à porta de um evento, ou à saída de um evento”.

O primeiro-ministro comentou, ainda, que se “impressiona” quando percebe que “a maior parte dos jornalistas tem um auricular no qual lhe estão a soprar a pergunta que devem fazer”. “E outros à minha frente pegam no telefone e fazem a pergunta que já estava previamente feita”, afirmou, acrescentando que, na sua opinião, “isso não valoriza o jornalista, nem valoriza o jornalismo”.

Após a intervenção de Luís Montenegro, o ministro dos Assuntos Parlamentares apresentou, então, o Plano de Acção para a Comunicação Social.

O plano do Governo para os media contempla 30 medidas e está organizado em quatro eixos: 1) regulação do sector; 2) serviço público concessionado (RTP e Lusa); 3) incentivos ao sector; e 4) combate à desinformação e literacia mediática.

As principais medidas

Eixo 1. Regulação do sector

  • Revisão e actualização do quadro legislativo

Alguns dos objectivos desta medida são: “acompanhar a nova era digital”, “rever as leis obsoletas”, “reflectir sobre as propostas da Entidade Reguladora da Comunicação (ERC) e das associações representativas para o Sector” e “integrar as normas europeias”, lê-se no documento de apresentação do Plano.

Está prevista a revisão da Lei de Imprensa, Lei da Rádio, Lei da Televisão e Serviços Audiovisuais a Pedido e Lei da Transparência dos Media e Decreto dos Registos.

  • Elaboração do Código da Comunicação Social

Este Código pretende facilitar uma “interpretação integrada” do quadro legislativo.

“Pelo seu carácter específico, ficarão fora do âmbito do [Código], os Estatutos do Jornalista; os Estatutos da ERC; os Estatutos da RTP e os Estatutos da Lusa, mantendo a sua autonomia”, esclarece o Plano.

Eixo 2. Serviço Público Concessionado (RTP e Lusa)

  • Renovação do Contrato de Concessão de Serviço Público (RTP)

Para o Governo, o novo contrato permitirá maior flexibilidade de gestão, “facilitando, desse modo, a necessária inovação na RTP e permitindo-a ser ainda mais eficaz no cumprimento do Serviço Público que presta”.

No processo, feito em articulação com o conselho de administração da RTP e com os seus trabalhadores, serão tidas em conta as considerações do Livro Branco do Serviço Público.

A previsão é de que a proposta seja assinada até ao final deste ano.

  • Eliminação gradual da publicidade comercial

“À semelhança do que já se verifica na rádio pública, os canais de televisão da RTP deverão gradualmente, durante os próximos três anos, eliminar a publicidade comercial das suas grelhas”, indica o Governo no Plano.

A ideia é reduzir dois minutos por hora, em cada ano, até que, em 2027, seja concretizada a eliminação total da publicidade comercial.

Embora no documento escrito seja referido que a redução da receita na RTP será de aproximadamente 18 milhões de euros, quando deixar de haver publicidade por completo, na sessão de apresentação do Plano ao público, o ministro dos Assuntos Parlamentares não negou que os valores estejam próximos dos 22 milhões de euros.

O governante admitiu que não haverá medidas de actualização da contribuição audiovisual, cujo valor absoluto tem sido actualizado “pelo aumento do número de utilizadores de electricidade”.

  • Plano de reorganização e modernização da RTP

O Governo prevê a criação de um plano de saídas voluntárias de até 250 trabalhadores, “com a contratação de um novo trabalhador com perfil diferente — digital — por cada duas saídas”.

O custo previsto das indemnizações pelas saídas voluntárias será de 19,9 milhões de euros, “com poupança estimada de 7,3 milhões de euros por ano”.

  • Clarificação da estrutura accionista da Lusa

No passado dia 31 de Julho, o Estado passou a deter 95,86% do capital da agência noticiosa. O Governo tem, ainda, “a intenção de adquirir o restante capital da Lusa, de acordo com o preço justo por acção e participação accionista”.

Com esta medida, pretende-se que “a única agência de notícias portuguesa tenha uma propriedade isenta e sólida, garantindo que continua a exercer as suas funções de forma livre, transparente e independente”.

A medida deverá ser concretizada em 2025 com um custo estimado de 200 mil euros.

  • Novo modelo de governação da Lusa

O Governo irá propor “a criação de um Conselho de Supervisão da agência, com uma composição multisectorial na área dos media”.

Este Conselho deve “garantir a autonomia do Conselho de Administração e a independência da direcção de informação”. Além disso, cabe-lhe “supervisionar a actividade da agência” e “pronunciar-se sobre a nomeação do presidente do Conselho de Administração”.

  • Modernização em meios humanos e tecnológicos da Lusa

Esta medida tem um custo estimado de quatro milhões de euros, e deverá ser implementada ao longo dos próximos três anos.

Os objectivos são “requalificar os meios humanos com competências para a nova era digital”, “utilizar a [inteligência artificial] como instrumento de apoio à produtividade da agência”, “reabilitar a agência com infraestruturas (estúdios de gravação e auditórios) e aplicações informáticas”, entre outros.

  • Criação de benefícios para órgãos de comunicação social (OCS)

Estando afastada a hipótese da gratuitidade da Lusa, “o Governo considera que devem ser criados benefícios que aliviem os OCS nacionais nos custos associados aos serviços actualmente indispensáveis da Lusa”.

Assim, serão promovidos descontos “entre 50% a 75% para OCS regionais e locais” e “entre 30% e 50% para OCS nacionais”, com um impacto estimado de dois milhões na redução de receita na Lusa.

Eixo 3. Incentivos ao Sector

  • Estudo sobre o mercado jornalístico e os OCS (a realizar durante o primeiro semestre de 2025)
  • Avaliação do actual regime de incentivos do Estado à comunicação social de âmbito local e regional
  • Integração das plataformas digitais nas soluções para o sector

“Para uma comunicação social robusta e para uma democracia sólida” é necessário garantir “uma remuneração equilibrada entre quem produz e entre quem distribui conteúdos”, afirma o Governo no Plano.

Nesse sentido, “impõe-se estudar e avaliar em detalhe soluções experimentadas noutras geografias”.

  • Incentivo à contratação de jornalistas e retenção de talento

“Este apoio traduzir-se-á na atribuição, mediante candidatura, de um montante entregue pelo Estado às empresas pela contratação de mais jornalistas com vínculo sem termo, com uma retribuição mínima obrigatória igual ou superior ao nível remuneratório de Nível 6 do Quadro Nacional de Qualificações (1120€)”.

A tabela com os valores dos apoios está disponível no Plano de Acção para a Comunicação Social.

  • Incentivo à contratação do primeiro jornalista

Esta medida “impactará em particular os OCS regionais e locais, bem como os novos OCS” e tem um custo estimado de 2,8 milhões de euros, que deverão ser executados através do IEFP.

A comparticipação do Estado será de 100% no primeiro semestre, 75% no segundo semestre, 50% no terceiro semestre, e 25% no quarto semestre.

  • Plano de Acção para a Segurança dos Jornalistas
  • Formações para jornalistas na área Digital/Inteligência Artificial
  • Livro Branco sobre Inteligência Artificial aplicada ao jornalismo
  • Apoio à distribuição de publicações periódicas para zonas de baixa densidade populacional

O Governo promoverá, através de concursos públicos, a escolha das empresas que possam garantir a melhor rede de distribuição de publicações periódicas nos municípios “onde tenha cessado, ou esteja em risco de cessar” essa distribuição.

A medida tem um custo estimado de 3,5 milhões de euros.

  • Garantia da distribuição de publicações periódicas em todos os concelhos do País

Nos quatro concelhos que não estão a receber publicações periódicas actualmente (Alcoutim, Freixo de Espada à Cinta, Marvão e Vimioso), o Governo “decidiu negociar com a VASP (única operadora de distribuição no mercado) a celebração de um protocolo para garantir que todos os concelhos do país têm distribuição”. Esta medida manter-se-á “até que a operação total esteja garantida por via da realização dos concursos públicos” referidos na medida anterior.

A decisão deverá começar a ser executada em Novembro deste ano, estando o valor ainda está em negociação.

  • Duplicação do Porte Pago

O Governo vai aumentar, de 40% para 80%, a comparticipação dos custos de expedição das publicações periódicas respeitantes a assinaturas.

A medida tem um custo estimado de 4,5 milhões de euros e será implementada até ao final deste ano, após a alteração do Decreto-Lei n.º 22/2015.

  • Formação empresarial para OCS regionais e locais
  • Valorização das rádios locais

“O Governo quer garantir que as rádios locais são abrangidas pelo regime de transmissão do ‘Direito de Antena’ em todas as eleições, sendo que actualmente este apenas se cinge às eleições autárquicas”.

Eixo 4. Combate à Desinformação e Literacia Mediática

  • Novo Plano Nacional de Literacia Mediática

As Linhas Orientadoras do Plano Nacional de Literacia Mediática estabelecidas pelo anterior Governo em Novembro de 2023 foram revogadas pela Resolução do Conselho de Ministros de Agosto deste ano que aprovou a criação da Estrutura de Missão para a Comunicação Social.

Está prevista a apresentação de um novo Plano de Literacia Mediática até ao fim deste ano, com um custo estimado de 600 mil euros.

  • Assinaturas digitais bonificadas para OCS

“Por cada nova assinatura digital, ou renovação, o Estado suportará metade do custo” para os cidadãos. “Esta medida contempla uma assinatura por pessoa singular mediante apresentação do NIF”, explica o documento.

  • Oferta de assinaturas digitais a alunos do Ensino Secundário
  • Literacia mediática nas escolas

Depois da apresentação do Plano, o ministro Pedro Duarte, nesse mesmo dia à tarde, deu uma conferência de imprensa em que explicou com mais pormenor algumas das propostas.

A execução e monitorização deste Plano de Acção para a Comunicação Social é da responsabilidade da Estrutura de Missão para a Comunicação Social, designada por #PortugalMediaLab, criada em Agosto deste ano.

(Créditos da imagem: captura de ecrã da conferência na conta de Youtube da República Portuguesa)