“A crise da deportação em massa de imigrantes ilegais nos Estados Unidos tornou os pouco mais de 560 projectos informativos, que atendem a comunidades hispânicas norte-americanas, exemplos práticos do potencial sociopolítico do jornalismo local”, conta Carlos Castilho, no artigo publicado pelo Observatório de Imprensa do Brasil, com o qual o CPI mantém uma relação de parceria. 

O autor explica que as notícias falsas colocaram os editores de jornais, rádios e sites noticiosos hispânicos “diante da incómoda opção entre omitir-se, correndo o risco de perder o seu público, ou informar, combatendo as fakes news e incorrendo na ira das autoridades de imigração”. 

“A grande maioria dos projectos jornalísticos voltados para a comunidade hispânica norte-americana optou pela segunda hipótese, o que levou repórteres e editores a terem de incorporar todos os requisitos do jornalismo local na cobertura da questão migratória”. 

Carlos Castilho dá o exemplo do jornal El Tímpano, que mudou a rotina dos repórteres e editores para “preservar o anonimato de fontes, porque os entrevistados e colaboradores temem ser presos pelo ICE (Immigration and Customs Enforcement – órgão encarregado da captura e deportação de imigrantes ilegais)”. 

O jornal constatou que os leitores dependem de informações para encontrar “um mínimo de tranquilidade” no meio de um grande volume de notícias falsas que causam pânico e desespero. Contudo, Castilho realça que muitas pessoas resistem a fornecer informações por receio de serem presas ou deportadas. 

A editora do El Tímpano, Heather Tirado Gilligan, revelou que o jornal adoptou normas para proteger a identidade dos entrevistados. Também os jornais The Mission Local e Fresnoland criaram “canais de atendimento do público para esclarecer rumores e boatos, o que levou a população hispânica e também os moradores de origem chinesa a estabelecerem uma relação directa e quase diária com os jornalistas de ambas as publicações”. Desta forma, o autor explica que os repórteres “deixaram de ser produtores de notícias para funcionar como orientadores, verificadores e educadores em matéria de informação”. 

Agora, sempre que na comunidade surge um boato sobre acções do ICE, as pessoas “imediatamente entram em contacto com o jornal do bairro para saber se é verdade ou não”. 

A deportação de imigrantes latinos considerados ilegais levou a uma mudança de paradigma no jornalismo local: “O distanciamento olímpico teve que ser substituído pelo mergulho na realidade vivida por leitores, ouvintes, telespectadores e internautas, para que os profissionais tenham condições de identificar e desconstruir as notícias falsas e processos de desinformação causadores de pânico e desorientação social”. 

Carlos Castilho considera que é em circunstâncias como esta que “o jornalismo ganha relevância, não como um instrumento do poder, mas como uma ferramenta dos cidadãos”.

(Créditos da imagem: Unsplash)