“A indústria dos jornais impressos está em agonia terminal. Isto já não é um segredo entre os economistas, publicitários e até entre alguns jornalistas, mas o grande público ainda não se deu conta disto porque a imprensa esconde os seus dilemas. O fim da era de ouro dos grandes impérios jornalísticos está a ser ofuscado pelo turbilhão informativo criado pelas plataformas digitais, o que leva as pessoas comuns a não perceberem que o jornalismo se tornou ainda mais importante e indispensável do que antes”, começa por referir Carlos Castilho, no seu mais recente artigo para o Observatório de Imprensa do Brasil, com o qual mantemos uma relação de parceria. 

Diante do “turbilhão informativo” nas grandes plataformas digitais, torna-se evidente que o jornalismo é essencial. Apesar do seu valor, o sector enfrenta dificuldades: “não consegue sustentar-se com base na publicidade, assinaturas e vendas avulsas”, o que nos leva à primeira pergunta. 

Por que razão as pessoas não querem mais pagar por notícias? 

O autor explica que a maioria das pessoas não está disposta a pagar por notícias, alegando que é possível obter informação de forma gratuita na internet. “Se esta atitude for tomada como definitiva, teremos um sinal de que o jornalismo, mesmo num formato digital, também está ameaçado de desaparecer”. A produção de notícias gera custos que precisam ser cobertos por algum tipo de receita — independentemente de quem as produza, seja um repórter independente ou uma cooperativa, associação ou empresa. 

“Se não podemos viver sem notícias, e se elas exigem dinheiro para serem produzidas, por que então as pessoas se recusam a pagar por elas?”, interroga Carlos Castilho. Não existe uma resposta única, mas um dos principais factores é o facto de “as pessoas não atribuírem às notícias um valor económico suficiente para justificar a inclusão do item no seu orçamento pessoal”. Isto porque existe falta de interesse nos temas abordados, falta de representatividade no conteúdo, desconfiança nos meios de comunicação ou pela crença de que conseguirão informar-se de graça de qualquer forma. 

A imprensa parece estar a dedicar pouco tempo às necessidades, problemas e desejos do público que consome notícias. Castilho considera que “está imersa numa bolha informativa onde a agenda noticiosa é determinada pelas elites políticas, sociais, económicas e militares”. 

Assuntos como economia popular, educação, saúde e emprego são tratados de forma superficial, salvo “quando estão associados a algum interesse político, à exploração sensacionalista ou geram medo e preocupação”. Mesmo temas relevantes, como segurança pública, são abordados sob a ótica policial ou governamental, com pouca atenção às vítimas. Isso faz com que o público seja “atraído mais pelo sensacionalismo e pela insegurança do que pela expectativa de contribuir para a solução do problema”. 

O autor afirma que os empreendedores jornalísticos raramente consideraram a relação entre custo e preço do jornalismo, como acontece com um negócio comum. “Não havia no passado preocupação com este factor porque quase 80% dos gastos com a produção de notícias eram cobertos pela publicidade paga. Mas quando os anúncios migraram para a internet, ficou claro que se os custos fossem integralmente cobertos pela receita de vendas em bancas ou assinaturas, os preços ao consumidor teriam que ser absurdamente altos, afugentando em massa a clientela”, acrescenta. 

Carlos Castilho avança para a segunda pergunta: 

Por quais notícias as pessoas estão dispostas a pagar? 

“Se quisermos encontrar uma solução para a recusa das pessoas em pagar por notícias inevitavelmente teremos de nos debruçar sobre a identificação das necessidades informativas das pessoas”, diz o autor.  

Investigações nos Estados Unidos da América mostram que não basta conhecer a opinião das pessoas, pois as suas respostas muitas vezes refletem o discurso dos media que consomem. Para obter dados confiáveis, é necessário um “envolvimento mínimo entre pesquisador/jornalista e o público-alvo”. 

Para entender, de facto, o público e superar barreiras como desconfiança e preconceitos, é preciso ter uma ideia das necessidades, desejos e problemas do público-alvo para que seja possível construir uma agenda de notícias mais alinhada com os interesses reais e à capacidade financeira das pessoas. 

“As necessidades são essencialmente locais ou segmentadas, características que determinam o conteúdo e o formato das pesquisas. Quanto mais locais e específicas, maiores as probabilidades de os responsáveis por projectos jornalísticos mostrarem ao seu público-alvo como o pagamento das notícias é importante no atendimento das necessidades básicas da sobrevivência individual e familiar”. 

Carlos Castilho vê a informação como algo essencial para a sobrevivência, especialmente na era digital, durante a qual enfrentamos um “caos criado” por versões conflituantes, notícias falsas, desinformação e discursos de ódio. Tomar decisões conscientes exige acesso a notícias confiáveis no meio da avalanche de conteúdos que circulam nas plataformas digitais. 

“Não há dúvidas de que estamos diante de um problema complexo porque as duas perguntas mencionadas neste texto estão muito ligadas entre si. Sem valorizar as notícias, as pessoas não pagarão por elas e sem receitas o jornalismo e a imprensa não conseguirão cumprir a sua missão informativa”, conclui. 

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