Lei da Liberdade dos “Media” da UE pode sujeitar jornalistas ao risco de espionagem

A Federação Europeia de Jornalistas (European Federation of Journalists, ou EFP) adverte que os governos da União Europeia (UE) querem autorizar a espionagem de jornalistas por "vagas razões de segurança nacional".
Os países da UE chegaram a acordo sobre a necessidade da Lei Europeia para a Liberdade dos Media (EMFA), um conjunto de regras que tem o objectivo de assegurar o pluralismo e independência dos jornalistas nos 27 Estados-membros.
A legislação foi proposta pela Comissão Europeia a 16 de setembro de 2022, com a intenção de introduzir salvaguardas contra a interferência política, concentração dos media e protecção dos jornalistas e das suas fontes.
“Desde então, a EFJ, à qual pertence a Federação das Associações de Jornalistas Espanhóis (FAPE), tem defendido uma regulamentação forte e eficaz para responder às múltiplas ameaças que se levantam à liberdade de imprensa na EU”, refere um artigo publicado pela Associação de Imprensa de Madrid (APM), com a qual o CPI mantém parceria.
No entanto, após o acordo adoptado, a EFJ adverte que os governos da UE querem autorizar a espionagem de jornalistas e suas fontes por “motivos vagos de segurança nacional”, rejeita veementemente a posição do Conselho da UE sobre a EMFA e denuncia um golpe à liberdade de imprensa, assinalando que tal legislação coloca os jornalistas e suas fontes em maior risco.
A EFJ considera que os Estados-Membros da UE mostram um desrespeito perigoso pelos princípios da liberdade de imprensa, situação espoletada, recentemente, por França, que introduziu uma excepção à proibição geral de implantação de spyware contra jornalistas, afirmando que as disposições sobre protecção efectiva de fontes jornalísticas “são entendidas, sem prejuízo da responsabilidade dos Estados Membros de salvaguardar a segurança nacional”, o que na prática faz com que seja permitido espiar os jornalistas em nome da segurança da nação.
A proposta original garantia que os governos não poderiam "deter, sancionar, interceptar, submeter a vigilância ou efectuar buscas e apreensões" de jornalistas para descobrir as suas fontes, a não ser que tal se justificasse por uma "exigência imperiosa de interesse público", enquanto a utilização de software de espionagem ficava limitada apenas a "crimes graves".
Segundo a EFJ “a introdução pela França” desse “novo parágrafo”, no artigo 4º, ao qual, apenas se opôs a Alemanha, “transforma, de facto, as protecções originalmente oferecidas” pela UE, em “conchas vazias”, ou seja, “quase inútil”. Esta “excepção de «segurança nacional» sem salvaguarda dos direitos fundamentais, negligencia a importante jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE).
O Tribunal deixou claro que o mero objectivo de salvaguardar a segurança nacional não pode tornar o direito da UE inaplicável e não isenta os Estados-Membros das suas obrigações de respeitar o Estado de direito”, referiu em nota anterior ao acordo agora firmado.
A EFJ opõe-se veementemente a essa excepção, que vai contra o próprio objecto da legislação e que, em seu entender “abre as portas a todo o tipo de abusos”.
“Estamos preocupados com as perigosas lacunas na posição do Conselho, que mostra desrespeito aos princípios da liberdade de imprensa”.
A excepção de segurança nacional, no artigo 4, sobre a protecção de fontes e a protecção da tecnologia de vigilância, é um golpe para a liberdade de imprensa que coloca os jornalistas ainda mais em risco e também cria um efeito inibidor sobre os denunciantes e outras fontes. Sabemos muito bem como se abusa da defesa da segurança nacional para justificar violações da liberdade de imprensa. Esta EMFA deveria criar confiança, mas os Estados Membros estão a criar desconfiança”, afirmou a directora da EFJ, Renate Schroeder.
A EFJ confia que o Parlamento Europeu estará em condições de se pronunciar durante as negociações e salvar o que está em jogo: a confiança dos jornalistas nas instituições da UE e numa Lei Europeia de Liberdade de Imprensa digna desse nome.
Após a apresentação inicial do projecto de lei, muitas associações de jornalistas saudaram o regulamento proposto como um passo à frente para a transparência da imprensa na Europa, enquanto as organizações de editores europeus criticaram duramente sua natureza intrusiva.
Agora, as tensões aumentaram. Em carta aos embaixadores encarregados das negociações, cerca de 60 jornalistas europeus e organizações da sociedade civil escreveram uma carta aberta, onde apontam que a versão mais recente da lei "apresenta sérios riscos aos princípios democráticos fundamentais e aos direitos fundamentais da União Europeia, principalmente a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão e o protecção dos jornalistas”.
"Embora apoiemos muitas das medidas adoptadas pela EMFA, ainda há uma desvantagem: o seu Artigo 4º", explicou Renate Schroeder, uma das signatárias da carta. "Ele é dedicado à protecção de jornalistas e suas fontes. O rascunho da comissão não era perfeito, mas após as últimas negociações, ficou ainda mais deteriorado. Isso é extremamente preocupante", afirmou.