A propósito da divulgação do relatório Digital News Report 2023, realizado pelo Reuters Institute, Carlos Castilho considera que “uma das mais preocupantes conclusões registadas”, é a procura de notícias da actualidade, por parte do público mais jovem (com menos de 35 anos), através dos “influenciadores digitais e personalidades”, em detrimento do que é veiculado pelos jornalistas.

“A perda de espaços informativos pelo jornalismo convencional foi detectada também no crescimento da rede chinesa Tik Tok, cuja audiência está a crescer às custas de um acentuado declínio do Facebook”, refere Castilho no seu último artigo publicado no Observatório do Brasil, com o qual o CPI mantém parceria.

No relatório do Reuters Institute, “os dados indicam um claro envelhecimento do público consumidor de notícias produzidas segundo o modelo jornalístico clássico” e, por sua vez, “um crescimento das audiências em formatos noticiosos heterodoxos como o promovido pelo TikTok, onde a imagem, superficialidade e em ritmo veloz condicionam os conteúdos informativos”, aponta o jornalista.

“O relatório Reuters 2023 chega a salientar que, de um modo geral, redes como Facebook e Youtube assumem gradualmente a condição de guetos de jornalistas, políticos e pessoas com mais de 50 anos, enquanto Instagram e TikTok se transformam em feudos informativos de gerações nascidas já na era digital” e que acedem às notícias através “de interacções virtuais em redes sociais”, menciona Castilho.

“Isto indica que possivelmente estamos diante do surgimento de uma nova modalidade de transmissão de informações, a ainda pouco conhecida Comunicação Baseada em Notícias (News Based Communication)”, considera.

Segundo o autor, “com o crescimento das redes sociais virtuais as pessoas comuns passaram a trocar entre si dados, factos e eventos usando formatos narrativos muito próximos aos empregados pelos jornalistas”. Esta inovação “passou a ser considerada um processo de comunicação social em que o conceito de noticia já não está associado ao exercício profissional do jornalismo”, acrescenta.

Na opinião do jornalista, este é “um fenómeno preocupante porque a geração com menos de 35 anos dará origem aos tomadores de decisões nos próximos 20 anos, o que significa que o jornalismo e a imprensa estarão nas suas mãos”.

Castilho afirma que “dá para perceber” que estamos a caminhar “para um fosso entre duas gerações de jornalistas, o que é problemático para o exercício da profissão e nada promissor para os interessados e necessitados de notícias confiáveis, exactas, pertinentes, relevantes e actuais”.

Por outro lado, “caso a tendência detectada pelo Relatório Reuters se confirme nos próximos anos, o que é muito provável, o jornalismo como função social, e a imprensa como organização empresarial têm diante de si o enorme desafio de encontrar o ponto de equilíbrio entre impacto e reflexão na produção de notícias. Já está claro que é possível e até necessária a convivência entre a cultura analógica e a digital”, crê o autor.

“Não se trata de identificar se uma é melhor do que a outra. O problema não é de substituição, mas de complementação. Até agora, a nossa cultura jornalística estava centralizada no formato textual (mesmo nas narrativas audiovisuais), porque o reduzido fluxo informativo privilegiava a leitura e a reflexão”. Já o jornalismo digital tornou-se “imagético, interactivo e obcecado pelo impacto, como recurso para atrair atenção num espaço público informativamente congestionado”, refere o jornalista.

“O problema está nas resistências à aceitação do facto de que a realidade mudou, como por exemplo, é o caso de privilégios antigos, como a absurda concentração de propriedade nas empresas jornalísticas, e que estão sendo substituídos por privilégios novos, como os das Big Techs, que controlam o estratégico sector dos bancos de dados digitais”, acrescenta o autor.

Carlos Castilho considera, portanto, que “o grande dilema do jornalismo contemporâneo é buscar a superação do fosso entre a cultura analógica e a digital no exercício da profissão. Trata-se de uma responsabilidade que recai sobre a actual geração de jornalistas. Não é um «problema dos outros», como se costuma dizer, mas sim um desafio nosso”, conclui.