Inspirar o público a proteger os “media” emergentes e os jornalistas a acreditar no seu futuro

Joel Simon, fundador da Iniciativa de Protecção do Jornalismo na Craig Newmark Graduate School of Journalism, afirma, num artigo para o Columbia Journalism Review, que existem redacções sem fins lucrativos nos Estados Unidos da América (EUA) que estão a produzir reportagens de grande impacto. Actualmente, “as ameaças estão a aumentar, tanto por parte das autoridades locais como de um governo federal animado pela feroz retórica anti-media do Presidente Trump. A liberdade de imprensa e as organizações legais estão a mobilizar-se para enfrentar o desafio - e obtiveram alguns sucessos notáveis”.
O autor realça que é importante reconhecer o potencial do novo sistema de meios de comunicação social locais que está a emergir nos EUA, mesmo perante um cenário marcado por preocupações como a falta de modelos sustentáveis, os desertos de notícias, a influência dos media em declínio e a ameaça da inteligência artificial. “As preocupações são compreensíveis, mas os jornalistas e o público que servimos também precisam de acreditar que há um futuro pelo qual vale a pena lutar”.
Ao longo da sua carreira como defensor da liberdade de imprensa, Joel Simon conheceu muitos meios de comunicação social apenas após estes estarem sob ameaça. Esteve presente em países como a Rússia após o assassinato da jornalista Anna Politkovskaya, na Turquia quando se tornou o país que mais prendeu jornalistas em 2012, e em Myanmar em 2017, quando Aung San Suu Kyi começou a perseguir a imprensa.
O autor relata que, actualmente, colabora com organizações noticiosas locais americanas que demonstram preocupação com a sua segurança e direitos. Como director da Iniciativa de Protecção do Jornalismo na Craig Newmark Graduate School of Journalism, tem ajudado jornalistas a prepararem-se para possíveis ataques, ligando-os a organizações como o Reporters Committee for Freedom of the Press e o Committee to Protect Journalists, que oferecem apoio jurídico, formação em segurança e defesa da liberdade de imprensa.
A principal preocupação é o futuro dos meios de comunicação locais. “Poderá esta servir as necessidades dos cidadãos americanos que enfrentam ameaças sem precedentes à democracia?”, interroga. John Thornton, empresário e figura-chave na criação do ecossistema de media sem fins lucrativos nos EUA, acredita que sim. Numa palestra recente, defendeu que os media digitais e sem fins lucrativos substituirão gradualmente os tradicionais, embora este processo possa levar uma geração.
“Quando Thornton começou a interessar-se pelos meios de comunicação locais, foi como potencial investidor. Acabou por concluir que os meios de comunicação locais não eram uma boa aposta do ponto de vista financeiro, mas eram totalmente essenciais para a democracia. Descreveu este desfasamento como uma falha do mercado”, conta Joel Simon. Ajudou a fundar o Texas Tribune em 2009 e depois o American Journalism Project (AJP), uma “filantropia de risco” que já angariou 225 milhões de dólares e apoia 50 organizações.
Em conversa com o autor do texto, Thorton explicou que, graças à eficiência do meio digital, uma redacção sem fins lucrativos com 20 jornalistas pode hoje cumprir o papel de uma antiga redacção com 200 profissionais, especialmente quando se fala em jornalismo cívico. Embora precisem de construir audiências, “de alguma forma, a informação essencial que produzem chega a quem precisa dela. As pessoas vêem as manchetes a passar nos seus feeds e também procuram a informação cívica em tempo real e muitas vezes através de pesquisa”.
Para que o sistema seja sustentável, é necessário financiamento diversificado de membros, patrocínios, eventos e filantropia, com apoio contínuo. Para além deste aspecto, Thorton também viu com bons olhos a possibilidade de financiamento público, desde que a independência editorial esteja garantida.
Duas semanas após a conversa com Joel Simon, John Thornton suicidou-se. Sarabeth Berman, directora do American Journalism Project, disse que, “ironicamente, para alguém que lutava contra a depressão, a contribuição final de Thornton pode ser o seu sentido de optimismo sobre o futuro dos meios de comunicação locais. Thornton era optimista em relação a este novo mundo, e isso era contagiante”.
Sarabeth Berman destacou que o discurso constante sobre o declínio do jornalismo mina o talento, o investimento e a ambição. Segundo ela, John Thornton contrariava esta tendência com confiança e ousadia — uma energia que impulsionou a sua visão para os meios de comunicação locais.
Segundo Joel Simon, “um pouco de arrogância é exactamente aquilo de que precisamos neste momento, porque a única forma de inspirar o público a proteger e defender os meios de comunicação que consome é os jornalistas acreditarem no seu próprio futuro”. Após conhecer os meios de comunicação social locais emergentes nos EUA, afirma com convicção que esta é uma luta necessária e possível de vencer.
(Créditos da imagem: Unsplash)