Diversificar a receita para a sustentabilidade dos “media”
Os desafios que surgiram nos últimos 20 anos no sector da comunicação social, desde o impacto das novas tecnologias até ao aumento da desconfiança do público, exigem que as organizações de media saibam encontrar novas respostas.
“Diversificar as fontes de receita é […] uma das principais ferramentas que permitem que tenhamos meios mais sustentáveis”, sugere José Navas, num texto de opinião publicado nos Cuadernos de Periodistas, da Asociación de la Prensa de Madrid (APM), com a qual o Clube Português de Imprensa mantém uma relação de parceria.
O objectivo deste artigo é apresentar algumas estratégias no sentido da ampliação das fontes de rendimento dos jornais, como sejam as assinaturas digitais, as experiências ao vivo e o marketing de afiliados, muitas delas reveladoras da importância da relação directa com os leitores.
Os desafios da actualidade
José Navas começa por fazer um diagnóstico do momento que atravessamos.
Para o responsável do departamento de assinaturas no jornal espanhol El Confidencial, o sector dos media enfrenta, hoje, uma série de desafios que se relacionam não só com factores tecnológicos — quebra das vendas em papel, invasão da publicidade digital, redução do tráfego com origem nas redes sociais, eliminação de cookies de terceiros e surgimento da inteligência artificial — mas também com fenómenos sociais — mas também com a polarização política e a diminuição da confiança do público no jornalismo e nos jornalistas.
“Neste contexto, não é estranho que apenas 47% dos directores editoriais em todo o mundo tivessem confiança de que este seria um bom ano para o jornalismo”, afirma o autor, citando o relatório Journalism, media, and technology trends and predictions, do Reuters Institute.
“Diversificar para minimizar o risco”
A ampliação das fontes de receita surge, então, como uma necessidade imperiosa. Modelos de negócios que se apoiavam numa única fonte de rendimentos, como o tráfego gerado pelas redes sociais, já demonstraram a sua fragilidade, quando as plataformas alteraram os algoritmos, passando a dar prioridade aos conteúdos produzidos pelos utilizadores.
Um estudo sobre sustentabilidade nos media do FT Strategies, feito em parceria com a Google News Initiative, “situa em três ou quatro o nível óptimo de fontes de receita relevantes, já que acima desse número se começa a gerar demasiada complexidade e se corre o risco de perda de ‘foco’”, cita o autor.
Estratégias diferenciadas para as assinaturas
As assinaturas digitais, que cresceram exponencialmente durante a pandemia, continuam a ser uma das principais fontes de receita alternativas à publicidade, mas também enfrentam desafios, como o aumento da taxa de cancelamento e a guerra de preços nas ofertas aos utilizadores.
Como resposta, o uso de “paywalls dinâmicas” é cada vez mais comum. Este modelo calcula a probabilidade de conversão de cada utilizador num assinante e o potencial de rendimento publicitário de um artigo. Assim, o sistema “determina quando, para que utilizadores e em que conteúdos se deve activar a paywall”, explica José Navas.
As “paywalls dinâmicas” têm surgido como alternativa às paywalls definidas com base em métricas (em que os utilizadores têm acesso a um número limitado de artigos) e ao modelo freemium (em que uma parte dos conteúdos é de acesso gratuito e outra parte é exclusiva para assinantes).
A flexibilidade no preço das assinaturas também se tornou uma tendência, com muitas empresas de media a oferecer descontos baseados no comportamento dos utilizadores.
Para compensar a descida no valor médio pago por utilizador, surgiram, ainda, pacotes de subscrição mais caros, que incluem produtos adicionais, como receitas ou jogos, estratégia que tem sido liderada pelo New York Times (NYT).
Cativar o público com experiências ao vivo
A organização de eventos é uma estratégia bastante usada por vários editores actualmente, com especial impacto depois do isolamento pela pandemia de COVID-19. No entanto, nem sempre traz rendimentos directos significativos, já que muitos destes encontros são patrocinados por marcas e/ou são de inscrição gratuita.
Ainda assim, ao proporcionarem experiências (“vivenciais”, como lhe chama José Navas), os jornais estão a criar formas adicionais de envolvimento dos leitores, aumentando a probabilidade de captar novos assinantes e de fidelizar os mais antigos.
O marketing de afiliados e os seus riscos
O marketing de afiliados, que consiste em receber comissões pela venda de produtos através de links recomendados nos artigos, tem sido uma aposta promissora para alguns meios.
Um exemplo deste modelo de negócio é o Wirecutter, a secção de análise e recomendações tecnológicas do NYT.
No entanto, esta fonte de receita depende de terceiros e requer uma gestão cuidadosa para não comprometer a credibilidade editorial.
“Os editores devem ter especial cuidado […] quando publicam conteúdos com links de afiliados” para que os leitores confiem que “as recomendações sobre os produtos analisados não são influenciadas pela possibilidade de gerar receita” e continuem a ver a publicação como independente, alerta José Navas.
A relação complicada com as plataformas digitais
Por fim, os acordos com plataformas tecnológicas como a Google e, mais recentemente, a OpenAI, têm gerado receitas adicionais para os grandes grupos de media por diversas vias, tais como o financiamento através de programas de inovação (como o Google News Initiative) e os acordos para a utilização dos conteúdos editoriais no treino dos modelos de inteligência artificial generativa.
Importa referir que, nestas negociações, as pequenas e médias organizações de media frequentemente acabam por ficar de fora.
Em resumo, para garantir a sua sobrevivência e relevância num panorama digital em rápida mudança, os meios de comunicação precisam de adoptar estratégias “flexíveis”, apostando numa relação mais próxima com os seus leitores e numa adaptação constante às novas exigências do mercado.
“A diversificação das fontes de receita é essencial para a sustentabilidade dos meios a longo prazo”, remata José Navas.
(Créditos da imagem: vectorjuice no Freepik)