Num artigo para o Observatório de Imprensa, com o qual o CPI mantém uma parceria, João Paulo Charleaux, jornalista, questiona o seguinte: “Nós, jornalistas, devemos gravar vídeos para redes sociais em nome próprio ou só devemos fazê-lo quando o vídeo é vinculado ao processo editorial de algum veículo para o qual estejamos a trabalhar? Ou seja, se eu cubro economia, por exemplo, devo gravar pequenos vídeos nos quais falo sobre os temas do meu interesse como jornalista, conversando directamente com o meu ouvinte, leitor, seguidor, ou só devo fazer isso quando a empresa para a qual eu esteja a trabalhar o proponha, dentro de um fluxo editorial maior, mais institucionalizado e, sobretudo, remunerado?” 

O autor explica que o verbo "dever" não se refere à possibilidade de fazer algo, mas sim à conveniência e ao valor de se fazer algo, considerando aspectos como vantagens financeiras, imagem e reputação. Questiona se gravar e postar vídeos pessoais em nome próprio é algo positivo para o jornalismo, uma vez que a prática de influenciadores pode misturar-se com a função tradicional do jornalista, uma actividade que costumava diferenciar-se de forma clara da actuação dos influenciadores. 

“Talvez não haja uma única resposta para esta questão”, considera João Paulo Charleaux, acrescentando que o tema é relativamente novo no jornalismo. O que existe são diversas experiências pessoais, práticas, tentativas e opiniões compartilhadas por muitos colegas. O autor destaca que o importante é encontrar um caminho que seja compatível com a personalidade de cada jornalista e com a forma única de conduzir a carreira. Este caminho deve, no entanto, estar sempre alinhado com os padrões éticos da profissão. 

João Paulo Charleaux conta que, ao levantar a questão numa publicação no LinkedIn, recebeu diversos comentários que apontavam em duas direcções. Uma parte das pessoas acredita que é benéfico para os jornalistas fazer vídeos nas suas contas pessoais, uma vez que os aproxima dos leitores. Defendem que a intimidade da interacção ajuda a aumentar a credibilidade da informação, já que a experiência "olhos nos olhos" é vista como algo muito positivo pelos consumidores de notícias.  

No entanto, observa que esta visão é menos favorecida pelos próprios jornalistas, que fazem parte de um segundo grupo com uma perspectiva diferente. Implica investir tempo, esforço, recursos técnicos e conhecimento numa actividade que não é remunerada. Para este grupo, trabalhar de graça para os donos das redes sociais não é uma boa opção e sentem-se frustrados com a promessa de que, ao criar um público cativo, poderiam ser contratados por empresas de comunicação ou até ganhar dinheiro directamente com os seus próprios projectos, como newsletters ou podcasts, o que nem sempre se concretiza de forma justa ou sustentável. 

João Paulo Charleaux observa que, do ponto de vista dos consumidores de conteúdo, as fronteiras entre o que é jornalismo e o que é opinião pessoal “parecem já completamente diluídas”. Inclusivamente, para eles, a angústia dos jornalistas sobre esta questão pode parecer irrelevante. Como ele destaca, os consumidores provavelmente perguntam-se: "Por que razão os jornalistas não podem, assim como o resto das pessoas, colocar a sua cara na internet e partilhar as suas verdades?" 

O autor descreve que a verdadeira angústia dos jornalistas é debater-se com questões técnicas e éticas relacionadas com a preservação de um padrão de qualidade jornalística que, talvez, já não seja exigido pelos consumidores de informação na internet. Ele aponta que as empresas de comunicação, ao tentarem imitar a linguagem e o conteúdo que mais faz sucesso nas redes sociais, contribuem para a perda do “legado de seriedade e maturidade no jornalismo”. 

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