Embora os jornalistas procurem precisão e objectividade na escolha das palavras que usam, estas podem carregar diferentes conotações, e as decisões dos jornalistas podem ter um impacto significativo na forma como o público percebe os eventos.

Num artigo de opinião publicado na "Poyter", Ren LaForme e Angela Fu abordam a importância das escolhas de palavras no contexto do jornalismo, particularmente durante períodos de guerra. E relembram a resposta de um repórter palestiniano a um pivô da “Sky News”, que circulou nas redes sociais, e que serviu como um lembrete importante: as escolhas de palavras que os jornalistas fazem são importantes.

O caso reporta ao momento em que, na introdução ao segmento que contava com a repórter Yara Eid, que vive em Londres, a pivô citou o número de pessoas que foram mortas na guerra. O que levou a repórter a enfatizar a importância de utilizar linguagem precisa ao relatar o número de vítimas no conflito entre Israel e a Palestina.

"Passaram duas semanas desde que o Hamas lançou o seu primeiro ataque contra Israel, que causou a morte de 1.400 pessoas", relatou. "Desde então, as autoridades palestinianas dizem que mais de 4.000 pessoas morreram em Gaza."

Após a introdução, Eid falou sobre os amigos e familiares que perdeu durante a guerra, mas depois aproveitou o facto de a pivô ter usado os termos "morto" e "morreu" para apontar a diferença entre as referências.

"Quando apresentou pela primeira vez o que estava a acontecer, disse que mais de 1.400 pessoas tinham sido mortas em Israel e mais de 4.000 na Palestina tinham morrido", distinguiu Eid.

"Penso que é muito importante utilizar esta linguagem porque, como jornalista, temos a responsabilidade moral de informar sobre o que está a acontecer. Os palestinianos não morrem apenas, são mortos", elucidou.

Paul Farhi, do "Washington Post", escreveu sobre a "guerra de palavras na reportagem sobre Gaza e Israel", nomeadamente os desafios que os jornalistas enfrentam quando escolhem as palavras e as respectivas consequências quando erram.

"Desde que homens armados de Gaza entraram em Israel e mataram cerca de 1.400 pessoas, as organizações noticiosas têm-se debatido sobre como descrever quem eram e quem representavam", escreveu Farhi.

No cenário do conflito entre Israel e Gaza, os autores apontam a forma como diferentes organizações de notícias empregaram termos distintos, como "militantes", "terroristas" e "combatentes", para descrever as mesmas pessoas envolvidas no conflito, os mesmos seres humanos e as mesmas acções, e como essas escolhas linguísticas podem transmitir significados variados e podem levar a críticas por parte dos leitores e espectadores.

“E mesmo que os jornalistas que fazem essas escolhas de palavras estejam geralmente à procura do termo mais preciso e objectivo para usar, a sua decisão pode sinalizar todo o tipo de coisas para o público”, referem LaForme e Fu.

Segundo Farhi, "as palavras são importantes, particularmente para as organizações noticiosas que tentam preservar a exactidão e a imparcialidade em momentos de grande paixão e incerteza". 

Em momentos particularmente intensos, como o início de uma guerra, os jornalistas têm de tomar decisões rápidas sobre as palavras que vão usar, tal como ocorreu quando a “Associated Press” optou por se referir ao conflito entre Israel e o como uma "guerra", com base na natureza ampla e contínua das operações militares em Israel e Gaza.

“À medida que a guerra se desenrola, as palavras que os jornalistas utilizam podem mudar. A BBC anunciou que deixaria de usar a palavra ‘militantes’ para descrever o Hamas. Um comunicado dizia que ‘têm vindo a considerar esta descrição menos exacta para as nossas audiências à medida que a situação evolui’”, referem os autores LaForme e Lu.

A palavra "terrorista" tem sido especialmente problemática. A “CNN” e a “Fox News” utilizaram o termo para descrever os homens armados de Gaza que mataram 1.400 pessoas em Israel, mas muitas organizações noticiosas optaram por não usar o termo. 

“Associated Press” desaconselha-o especificamente: "Os termos terrorismo e terrorista tornaram-se politizados e são frequentemente aplicados de forma inconsistente. Uma vez que podem ser usados para rotular um leque tão vasto de acções e acontecimentos, e porque o debate em torno deles é tão intenso, detalhar o que aconteceu é mais preciso e serve melhor as audiências".

A guerra entre Israel e o Hamas está enraizada num conflito que pode ser considerado dos mais complexos do mundo e, segundo os autores, descrevê-lo exige um conjunto igualmente complexo de decisões sobre a linguagem a utilizar. 

Por isso, perante o papel crucial da linguagem na forma como o público percebe e compreende os eventos, os jornalistas têm a responsabilidade de comunicar com precisão, avaliando e adaptando sua linguagem conforme necessário.