O responsável pelo departamento de tecnologia e jornalismo dos Repórteres Sem Fronteiras (RSF), Vicente Berthier, considera que as actuais regras europeias sobre Inteligência Artificial (IA) são insuficientes para proteger a integridade da informação e combater a desinformação. 

À agência Lusa, Berthier alerta que a IA, ao ser usada para criar deepfakes, chatbots e outros sistemas automatizados, amplifica a disseminação de conteúdos falsos, ao mesmo tempo que falha em produzir informação fiável em larga escala. Para o responsável, é “um disparate” que a legislação europeia não classifique estes sistemas como de alto risco, sobretudo os que afectam a produção e difusão de informação. 

“Os fornecedores de chatbots, que são usados como fonte, devem ser obrigados a utilizar fontes de informação pluralistas e confiáveis”, defende. Além disso, Berthier propõe que estes agentes tecnológicos compartilhem receitas com os editores, através de negociação colectiva. 

Do ponto de vista jurídico, é necessário repensar o estatuto das plataformas digitais, atribuindo-lhes uma responsabilidade proporcional ao seu papel na circulação da informação. Não se trata de as tornar responsáveis por todos os conteúdos, “o que poderia levar à censura em massa, mas de reconhecer a sua responsabilidade algorítmica e o seu papel no incentivo à produção de certos tipos de conteúdo, como intermediários na distribuição de informação”. 

Para os RSF, a desinformação é hoje uma das principais ameaças às sociedades democráticas. Berthier sublinha que esta prática tem sido instrumentalizada em contextos geopolíticos, aproveitando-se da influência das redes sociais na formação de opiniões. 

“A desinformação não só persiste, como também está a aumentar”, afirma, apontando o modelo económico das plataformas como um dos principais motores dessa realidade. A rapidez com que se produz conteúdo enganoso, combinada com algoritmos hiperpersonalizados e publicidade direccionada, confere-lhe uma vantagem competitiva face ao jornalismo tradicional. 

“Nenhuma das grandes plataformas — Facebook, X, YouTube, TikTok — promove activamente conteúdos jornalísticos confiáveis nos seus algoritmos”, denuncia Berthier. Pelo contrário, nota-se uma crescente hostilidade ao jornalismo. “O Facebook moveu-se abertamente numa direcção antijornalística”, e Elon Musk, proprietário do X, “não esconde a sua hostilidade contra os media tradicionais”. 

Em Abril, a Meta encerrou o seu programa de verificação de factos nos EUA, decisão que, segundo o seu próprio conselho de supervisão, foi tomada de forma “apressada” e fora dos procedimentos habituais. 

Face a este cenário, os Repórteres Sem Fronteiras defendem que as plataformas digitais devem ser obrigadas a dar visibilidade acrescida às fontes de informação fiáveis e a permitir a distribuição equitativa de conteúdos jornalísticos. 

Para Berthier, o combate à desinformação passa por reformar as regras da IA, regular as práticas das plataformas e proteger o jornalismo de qualidade.

(Créditos da imagem: RSF)