A concorrência de motores de busca da Google pode influenciar os editores

Nos EUA, decorre um julgamento que está a avaliar se o domínio de pesquisa da Google constitui uma violação da lei "antitrust" dos EUA.
A questão principal envolve os acordos multimilionários da Google com os criadores de “browsers” – que fazem do Google o motor de busca pré-definido dos seus utilizadores – e se estes constituem uma barreira desleal à concorrência.
De acordo com o Departamento de Justiça, cerca de metade das pesquisas do Google provêm de um navegador a que a empresa paga para ser o padrão – e cerca de metade de todas as restantes provêm do Chrome, de que a Google é proprietária.
De acordo com um artigo de Joshua Benton, publicado no NiemanLab, o julgamento “revelou ‘insights’ notáveis sobre o pensamento estratégico de algumas gigantes da tecnologia” e a Apple “desempenha um papel central nessa equação, pois pode tornar-se uma concorrente relevante para a Google, dadas as configurações adequadas” – graças à capacidade de alterar as configurações do navegador Safari.
Como a Google é, actualmente, a principal fonte de tráfego externo para os sites de notícias, segundo Benton, o aparecimento de uma competição real pode ter um impacto significativo na indústria, pois poderia dar mais poder aos editores que, actualmente, têm pouca influência nas relações com a Google.
Competição na pesquisa, especialmente envolvendo gigantes como a Apple e a Google, pode levar a novos modelos de monetização para plataformas e beneficiar os editores de notícias.
Até agora, o julgamento tem dado uma visão notável sobre o pensamento estratégico de alguns gigantes tecnológicos. O director executivo da Microsoft, Satya Nadella, reconheceu que o "Bing" da sua empresa não está à altura do Google em termos de qualidade. Segundo Nadella, "as predefinições são a única coisa que importa”, pelo menos, “em termos de mudança de comportamento dos utilizadores".
Nadella testemunhou que ofereceu à gigante eletrónica até 15 mil milhões de dólares por ano para mudar a predefinição do Safari para o Bing – dizendo mesmo que estaria disposto a ocultar toda a marca Bing e deixar a Apple marcar o motor de busca como seu.
Mas a Google já paga à Apple para evitar essa possibilidade – um valor que é desconhecido, mas cujos relatórios sugerem ser superior a 15 mil milhões de dólares, talvez se aproxime até dos 20 mil milhões.
A Apple terá investido também enormes quantias de dinheiro na construção da sua própria tecnologia de motor de busca, que é utilizada nas suas aplicações, mas que poderá evoluir para um motor de busca completo.
Assim, de acordo com Benton, pela primeira vez em muito tempo, existe a possibilidade de que o domínio da pesquisa do Google possa sofrer uma redução significativa. Caso o tribunal decida proibir a Google de deixar de comprar o estatuto de navegador pré-definido ou a vender o navegador Chrome, tudo pode mudar entre os motores de pesquisa.
Segundo Tim Wu, a decisão "estabelecerá efectivamente as regras que regem a concorrência tecnológica para a próxima década, incluindo a batalha sobre a inteligência artificial comercializada, bem como novas tecnologias que ainda não podemos imaginar".
Desta forma, Benton realça a posição única da Apple no mercado, especialmente em relação aos motores de busca, observando que a empresa tem o potencial de se tornar a maior empresa de pesquisa sem ser a Google.
Tal deve-se à predominância dos iPhones nos Estados Unidos e em muitos países europeus, juntamente com uma parcela considerável do tráfego web (35% nos EUA e 20% na Europa e em nível global) que passa pelo navegador Safari. Assim, sugere que, se a Apple colocar o seu motor de busca como pré-definido no Safari, isso poderia imediatamente conquistar uma parte substancial de utilizadores.
Um dos exemplos do autor é a concorrência entre “Google Maps” e o “Maps da Apple”, que inicialmente não foi promissora, mas na qual a Apple acabou melhorar. Assim, a empresa tecnológica poderia vir, também no mundo dos motores de busca, a oferecer uma lista mais completa de serviços, aproveitando o seu ecossistema fechado.
Outro dos pontos sugeridos por Benton é o facto de os utilizadores da Apple serem particularmente atraentes para anunciantes, por terem, em média, mais capital e por estarem mais inclinados a comprar produtos e ler notícias online. Tudo isto, para o autor, sugere que a entrada da Apple no mercado de busca poderia impactar a publicidade online, desafiando a posição dominante da Google.
O autor explora ainda a complexidade da relação entre as editoras e a Google, enfatizando que, até agora, as editoras não tinham poder nessa relação. Pois embora possam retirar os seus sites dos resultados de busca do Google, essa acção provavelmente, na maioria dos casos, prejudicaria mais os editores do que a própria Google, mas o aparecimento de competição entre dois grandes motores de busca texto poderia alterar a situação.
Perante este cenário, Benton refere que a ideia de uma web dividida entre Google e Apple pode não ser ideal, mas, por outro lado, poderia estimular a competição e diferenciação.
Benton levanta ainda a questão da Inteligência Artificial (IA) e da possibilidade de principais empresas de IA pagarem às editoras pelos direitos do uso do seu conteúdo para treinar os geradores de texto, o que poderá levar a uma situação em que a Google seja a única a usar esses dados, prejudicando a concorrência.
Em suma, a conclusão é que a concorrência é essencial para o ecossistema da internet, mesmo que isso envolva empresas gigantes como Apple e Google.