A notícia tem especial significado para os que se interessam pela rápida transformação dos media americanos desde o início do novo milénio. “Serial”  – uma reportagem em 12 episódios acerca do assassínio de uma estudante liceal de Baltimore em 1999 –  é o podcast mais popular de sempre nos EUA, descarregado 100 milhões de vezes; Pandora, que não existia há 15 anos, tem cerca de 80 milhões de utentes (ou “ouvintes”, para usar terminologia do século passado, associada a estações de rádio) e 70 por cento da audiência americana de rádio pela Internet.  

Na edição deste ano do estudo “State of the News Media”, publicado anualmente desde 2004 pelo Pew Research Center, o capítulo dedicado ao medium “Podcasting” ocupa oito páginas. Na primeira edição do estudo, podcasting não era sequer mencionado. Segundo a última edição, mais de metade dos americanos acima dos 12 anos de idade ouve programas de rádio pela Internet  – o dobro de há cinco anos –  e três quartos deles usam smartphones ou tablets para ouvir esses programas.

Fenómeno paralelo é o rápido crescimento dos media digitais, também evidente quando se comparam os estudos de 2004 e 2015: durante esse período, o espaço dedicado aos media digitais aumentou de duas páginas na primeira edição, após o capítulo dedicado aos jornais, para 13 páginas na mais recente  – e é o primeiro capítulo do estudo.

Os 10 principais media digitais americanos têm agora perto de 840 milhões de visitantes por mês (obviamente, muitos deles consultam mais do que um site noticioso). A Yahoo-ABC lidera, com cerca de 128 milhões de visitantes por mês. Em todos os sites, o número de leitores que usam smartphones e tablets para ler notícias supera largamente os que usam PCs. Há 11 anos, os 20 sites noticiosos principais tinham menos de 10 milhões de visitantes, e todos estes usavam PCs, dado que smartphones e tablets ainda não existiam.

É de destacar que, não obstante o elevado número de fontes noticiosas exclusivamente digitais (mais de 400), não-relacionadas com órgãos noticiosos tradicionais, apenas dois deles (Huffington Post e BuzzFeed) figuram entre os 10 sites noticiosos mais visitados.  

Curiosamente, entre as 15 edições digitais de jornais mais lidas por americanos contam-se nada menos de cinco jornais ingleses, começando pelo Daily Mail, com mais de 50 milhões de leitores  americanos por mês  – só superado pelo USA Today e o New York Times. Juntamente com o Guardian (em 5º lugar), Telegraph, Daily Mirror e Independent, as edições digitais de jornais ingleses têem mensalmente mais de 120 milhões de leitores americanos.        

“Podcasting” e noticiário digital são dois sectores exemplares da rápida transformação dos media americanos nos últimos anos. Mas não são os únicos. 

O declínio dos jornais impressos é outro exemplo. As vendas de jornais impressos, que chegaram a atingir mais de 60 milhões de exemplares durante os anos 90, situando-se ainda acima dos 55 milhões nos primeiros anos deste século, não passou de 44 milhões o ano passado. Apesar disso, a versão impressa dos jornais ainda é preferida à versão digital por quase 60 por cento dos leitores.

Ainda mais acentuada do que a redução das vendas é a quebra das receitas de publicidade dos jornais. Embora a receita das edições digitais tenha aumentado cerca de 300 por cento desde há 11 anos, para cerca de 3,5 mil milhões de dólares, a receita das edições impressas baixou de quase 45 mil milhões de dólares em 2003 para menos de 16,5 mil milhões o ano passado  – uma redução vertiginosa de mais de 63 por cento. (A receita de 3,5 mil milhões de dólares acima referida representou menos de sete por cento da receita total em publicidade digital de 2014, em todos os media, que atingiu 51 mil milhões de dólares).    

Como seria de esperar, dado que as receitas de publicidade representam quase 60 por cento, em média, das receitas totais dos jornais americanos, a acentuada redução dessas receitas teve um impacto negativo no número de profissionais da informação ao serviço dos jornais, embora em escala muito inferior à da quebra de receitas. No final do ano passado os jornais empregavam cerca de 37 mil jornalistas  – uma redução de 33 por cento da média de 55 mil profissionais em actividade durante o último decénio do século passado.

A desproporção de redução percentual entre receitas e número de jornalistas é atribuível aos esforços heróicos dos jornais para minimizar a atrofia dos seus quadros, sendo claro que um produto de qualidade inferior é uma sentença de morte para os jornais que caem nessa espiral.

Para quem procure um raio de esperança neste panorama problemático, poderá encontrá-lo no abrandamento do ritmo de redução de jornalistas nos últimos sete anos, tendo passado durante esse período de uma quebra anual de 11 por cento para três por cento. Os pessimistas dirão, porém, que isso só significa que restam cada vez menos jornalistas para cortar.

Em contrapartida, a evolução no sector das revistas noticiosas (“news magazines”) é francamente menos preocupante. Ao contrário de algumas previsões, o desaparecimento do semanário Newsweek  em 2012  - com vendas médias de mais de 1,5 milhões de exemplares por edição, no seu último ano  - não se revelou precursor de uma crise do sector. As vendas combinadas das restantes 10 revistas noticiosas mais lidas têm-se mantido estáveis em cerca de 12 milhões de exemplares desde o início deste decénio. (O número inclui assinaturas, que representam cerca de 96 por cento do total). E a venda das versões digitais dessas revistas, embora ainda insignificante em números absolutos, teve um crescimento explosivo nos últimos dois anos.

A Time continua a liderar entre as revistas noticiosas, com vendas médias de 3,3 milhões de exemplares, e três outras (Rolling Stone, Vanity Fair e The New Yorker) continuam a vender mais de um milhão. Dentre as mais de 300 revistas restantes, que não cabem na categoria de “news magazines”, 10 têm tiragens superiores à da Time. Por exemplo, a Better Homes & Gardens vende 7,7 milhões de exemplares.                   

Embora em menor escala do que no caso dos jornais impressos, o declínio da audiência dos programas noticiosos nas estações “network” de TV (ABC, CBS e NBC), que era de cerca de 29 milhões de espectadores por dia no princípio deste século, também foi significativo, mas com  tendência para estabilizar em cerca de 24 milhões nos últimos anos. Durante o mesmo período, a audiência dos canais noticiosos por cabo (Fox News, CNN e MSNBC), também sofreu redução, de 2,4 milhões por dia para 1,8 milhões.

No entanto, a informação noticiosa digital oferecida pelas estações de TV nos seus sites Internet tem tido procura crescente, presentemente estimada em cerca de 281 milhões de visitantes por mês, no combinado das seis estações, que em geral continuam a ter resultados financeiros positivos.

As receitas publicitárias das cerca de 1200 estações locais de TV (quase 500 das quais foram transaccionadas nos últimos dois anos) têm continuado a recuperar dos baixos níveis “record” de 2009, ao mesmo tempo que a proporção dessas receitas gerada pelos programas noticiosos subiu de menos de 40 por cento no princípio deste século para 50 por cento. Tudo boas notícias para os cerca de 27 mil jornalistas que trabalham nessas estações.

O mais estável dos media americanos parece ser a rádio. O número de estações de rádio dedicadas inteiramente a programas noticiosos ou de comentário (“talk shows”) tem-se mantido firme, em torno das 2 mil, e o mesmo pode dizer-se das suas receitas publicitárias, que orçam os 18 mil milhões de dólares por ano.                     

Ninguém teria podido prever no início do novo século as profundas alterações no panorama dos media americanos que ocorreram desde então. As que se seguirão nos próximos 15 anos até 2030 são igualmente imprevisíveis - e potencialmente ainda mais radicais.  

 

(*) Um podcast é um programa audio, de música ou falado, acessível num website e descarregável para um smartphone, tablet ou PC laptop, podendo ser ouvido mais tarde, mesmo sem ligação à Internet.

[O autor foi jornalista do extinto Diário Popular e Chefe de Redacção do Século Ilustrado, cuja publicação foi também interrompida. Está radicado nos EUA desde os anos 70]