O valor da liberdade de imprensa
Mas mais importante que os números de uma manifestação ou de uma greve, mesmo geral, é o estado a que o país chegou. Não foram, com certeza, os cidadãos que conduziram o país à situação de endividamento e de necessidade do pedido de ajuda externa a que Portugal já esteve sujeito e a que, pelo andar da carruagem, pode voltar a ter de recorrer. Restam então os governos. Fica a questão: Quem deveria, na opinião de Gabriela Canavilhas, ser responsabilizado por obrigar os portugueses a fazer sacrifícios para pagar dívidas que não contraíram? Alguém o será? Quando? E como?
A deputada socialista põe em causa o acompanhamento que o Público tem feito sobre o financiamento público dos colégios privados, alegando que tem “tido erros”. Erros que, segundo escreveu, “têm sido admitidos pelo próprio jornal, como é deontologicamente correcto, o que não impede que sejam lembrados se e quando reincididos”. Apetece dizer que, afinal, o jornal reconhece os erros, ao contrário de Gabriela Canavilhas. Não vivemos nos Estados Unidos, mas sente-se a falta da primeira emenda à Constituição norte-americana, que garante a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão.
A democracia é o regime da igualdade, da liberdade e do Estado de direito, mas alguns políticos perfilham a ideia a de que “quem não está comigo, está contra mim”. Por isso, zangam-se quando alguém dá notícias que não lhes agradam. A reacção pública até nem é má. É feita às claras e todos ficam a saber. O pior é quando os políticos exercem pressões de forma sub-reptícia para afastar pessoas, sejam ou não jornalistas, para as substituírem por quem der garantias de não os “incomodar”. Essas movimentações exercem-se na sombra e, regra geral, não chegam ao domínio público.
Por isso, cumpre elogiar Gabriela Canavilhas por ter expressado publicamente e de forma clara a sua zanga, como também já o tinha feito com um correligionário político. A deputada socialista pediu, há cerca de um ano, a expulsão de Manuel Maria Carrilho do PS. Argumentou então que “se se exige a um político que tenha o pagamento de taxas e taxinhas em dia quase desde o berço, porque não se exige que tenha um comportamento limpo de acusações de violência doméstica?”. E acrescentou que, condenado ou não em tribunal, “Carrilho não deixará de ficar marcado com o estigma da barbárie e da crueldade”.
Gabriela Canavilhas mostra ter sentido de justiça e de responsabilidade política ao falar de Manuel Maria Carrilho, mas porque não aplicá-lo agora aos jornais e aos jornalistas? A comunicação social tem de ser incómoda, pois só assim poderá ser um contrapoder para fiscalizar, obrigar a prestar explicações e corrigir erros ou omissões aos poderes instituídos. Uma comunicação social incómoda é sinónimo de um país democraticamente maduro, como acontece, por exemplo, no Reino Unido. Erros todos cometemos. Devemos é ter a humildade de os reconhecer e de pedir desculpa. É o que que está a faltar à deputada socialista.
Texto publicado originalmente no Diário Económico online