A greve geral dos jornalistas, inédita há mais de 40 anos, constituiu sobretudo um “grito de alma” por parte daqueles que têm sentido na pele a erosão do prestígio e da independência da profissão, afectada tanto pelas condições precárias de exercício do jornalismo, como pelo arrivismo de “novos ricos” que tomaram conta de alguns media para recreio das suas ambições.

Numa época de forte transição, com a tecnologia a progredir de uma forma perturbadora, e o advento, em força, da Inteligência Artificial, com o seu sortilégio de descobertas e de aplicações, o jornalismo tem sido vítima de mudanças na estrutura accionista em vários grupos, que por incompetência e parolismo  comprometem decisões inadiáveis.

A pouco a pouco, as redacções ficaram minguadas a pretexto de reestruturações que, sem grande engenho, castigam invariavelmente os jornalistas, com despedimentos sumários ou rescisões ditas “amigáveis”.

Um dos grupos editoriais que se têm distinguido pela negativa é o da Global Media, que está em vias de liquidar um título centenário como o “Diário de Noticias”, que de diário passou a semanário, para voltar a ser diário com tiragens residuais, removido da sua sede tradicional na avenida da Liberdade, para ocupar um espaço, quase anónimo, num edifício de escritórios à beira da Segunda Circular.

A antiga sede foi mais uma vítima da especulação imobiliária, decerto com proveito de alguns,  e seu precioso arquivo, classificado no verão de 2022 como “tesouro nacional”, estará resguardado mas disperso, entre Lisboa e o Porto, à espera de melhor sorte.  

Outros media, e não apenas os detidos pelo Grupo do DN, lutam pela sobrevivência, enfrentando sérias dificuldades.

Foi neste contexto de incertezas agravadas que o SJ desencadeou a greve dos jornalistas – mandatado, recorde-se, pelo recente Congresso do sector - com adesão variável, mas superior ao inicialmente previsto, segundo os sindicalistas.

De facto, a precariedade do emprego tornou-se moeda corrente nas redacções, talvez com excepção das empresas públicas da Lusa e RTP/RDP, embora os seus jornalistas também tenham não poucas razões de queixa.

Oxalá esta paralisação dos jornalistas tenha servido para sacudir o marasmo e as consciências, alertando os poderes políticos para os riscos de o jornalismo deixar de servir a democracia para ser apenas um exercício de “sufismo”, ao serviço da onda que estiver na mó de cima… 

O mal-estar acumulado não se recomenda.