A noticia abalou o mercado.  E não se antevê melhor sorte para as revistas que Balsemão tem à venda, ao conhecer-se o nome do interessado “exclusivo”, cujas  fontes de financiamento são um mistério.

Seja como for, compreende-se que Marcelo enfatize  o  "adensar das cores escuras" que pintam a paisagem mediática portuguesa.

A democracia portuguesa, que precisa de uma Imprensa forte como do pão para a boca, assiste ao seu definhar. A farta propaganda política   “travestida” de informação, com  o governo omnipresente, inunda os media.

O jornalista  “cabo de microfone” segue a roteiro do poder. Raramente há perguntas e quando há, são previsíveis e  raramente incómodas.

 

Generoso, Marcelo  praticou, há dias, um exercício de estilo, ao referir-se ao “heroísmo” do jornalismo, que cai sempre bem diante de uma plateia constituída por profissionais. 

Mas basta olhar as primeiras páginas dos jornais nos quiosques, ou ver os telejornais, para duvidar, vezes demais,  desse  “heroísmo” , ao identificar-se um  conformismo baço e sem rasgo nem nervo. Como jornalista, escrevo-o com mágoa, e sem subterfúgios.

É certo que o paradigma mudou. Os hábitos de leitura são outros . Os dispositivos electrónicos  ocuparam  gradualmente o lugar do jornal impresso. O papel cedeu ao imediatismo digital. As famílias afeiçoam, desde cedo, as crianças aos tablets e aos  smartphones , mas não as sensibilizam para o papel.

O tempo dos suplementos infantis na Imprensa  -  nos quais  muitos de nós aprendemos a ler  -   passou de moda por cá (embora tenha reaparecido, com sucesso,  no  The New York Times, que lançou  uma secção intitulada  ‘Kids’, regular a partir de Janeiro, por insistência  dos leitores).

 

Ao contrário do NYT, que não desdenha o papel,  Juan Luis Cebrián,  antigo director do El Pais e  presidente cessante da Prisa, mostra-se descrente e sombrio ao prever que “a Imprensa escrita está numa fase terminal e não encontra um modelo de negócio capaz de sobreviver”.

Cebrian  precisa de ser ouvido com distanciamento. Perdeu estatuto e influência e  terá a tentação  de atribuir fracassos próprios  à conjuntura, que tem sempre as costas largas.   

Deixou a Prisa em  maus lençóis , a desfazer-se de activos ( como Balsemão na Impresa) , entre os quais a Media Capital e a TVI  em Portugal, cujo negócio com a Altice está “na corda bamba”.

A Imprensa espanhola também amoleceu, ao contrário da francesa, que está a viver um bom momento, progredindo nas vendas,   segundo os dados disponíveis. 

Desde o Le Monde , ao Liberation  ou  Le Figaro , da esquerda à direita, todos confirmam ganhos na difusão, quer em papel, quer no digital. Que  explicação para este fenómeno?

O segredo parece estar na destreza revelada pelos principais jornais, que souberam  agilizar estratégias editoriais e superar preconceitos corporativos, articulando  a oferta em  papel com o digital.

Em Portugal, a situação há muito que se degrada. Segundo a Pordata, entre 2010 e 2016, a tiragem somada de jornais e revistas  baixou de 800 mil exemplares para metade. A tendência de queda continua imparável. E o desespero é mau conselheiro.

Quando o Presidente reconhece que nos faltam  mecenas e fundações que apoiem o jornalismo, está a confirmar o óbvio. E quando admite a  possibilidade do Estado apoiar a comunicação social, a viver “uma situação crítica”,  não deixa de advertir  que “ quando o poder político é chamado a intervir não resiste a intervir com uma mão pesada. E a pretexto de salvar a liberdade, pode não o fazer". É verdade.

A seguir ao 25 de Abril houve a nacionalização de vários jornais. O Século morreu pela mão de Manuel Alegre no Governo. E o Diário de Noticias escapou por um triz, tomado de assalto pelo PCP, que encontrou em Saramago o seu “ponta de lança” doutrinário na direcção do jornal.

É um lugar comum dizer-se que sem desafogo financeiro não há Imprensa independente. Infelizmente, a maioria dos media portugueses vive cercada de medos e  ao arrepio do seu papel.  É  esse o dramático estado das coisas…

Nota: Texto publicado originalmente no semanário “Sol”