A citação mais longa justifica-se para ficar claro o destino do edifício desenhado pelo arquiteto Pardal Monteiro, “o primeiro (…) construído de raiz para albergar os serviços de um jornal”, conforme assinala o sitio da Camara Municipal de Lisboa.

Projectado em 1936, foi inaugurado em 1940, tendo recebido o Prémio Valmor desse ano.

De nada valeram ao “DN” os pergaminhos da Casa que foi sua, vendida para especulação imobiliária, apesar de “classificado como Imóvel de Interesse Público”, sobressaindo  “no contexto da arquitectura portuguesa contemporânea pela original solução de compromisso entre a linguagem monumentalista da época e as tendências inovadoras e modernistas, traduzindo a procura de equilíbrio entre os vectores estético, funcional e construtivo”, como ainda consta do sitio da CML, para vergonha  de quem legitimou e licenciou esta aberração no topo da avenida da Liberdade.  

De nada lhe valeram, também, os frescos de Almada Negreiros, ('Grande Planisfério' e 'Quatro Alegorias a Portugal e à Imprensa'), localizados no átrio  e vestíbulo principal, que  ficarão a decorar mais alguma loja de luxo, idêntica a outras que sobram na avenida para bolsas recheadas.

Os preços anunciados para os apartamentos honram o novo modelo de comercialização adoptado pelo ex-vereador do Bloco de Esquerda, que adquiriu uma súbita notoriedade nacional graças à  reconversão de um seu prédio  em Alfama, com o beneplácito da CML.

Os novos donos do “DN” comportaram-se como os antigos fidalgos arruinados,  alienando  património e fingindo que nada se passa.

Tal como no caso do prédio do ex-vereador bloquista, Ricardo Robles, também a antiga sede do “DN” será colocada no mercado através de uma mediadora especializada no imobiliário de luxo,  uma tendência que ganha cidadania em Lisboa, entregue cada vez mais aos desígnios turísticos  e aos investidores de alto gabarito.

Choca a passividade de quem deveria não ficar de braços cruzados, desde o Município ao Ministério da Cultura ou à Ordem dos Arquitectos. Mas é assim que estão.

Calados,  com tudo a andar depressa,  conforme se recomenda na política do facto consumado. 

O “Diário de Noticias”, com mais de século e  meio de vida, perdeu a sede concebida para albergar o Jornal, perdeu o papel de Segunda-Feira  a Sábado. Perdeu influência. E pouco lhe falta para perder a alma.

Um título transversal a várias gerações passou a ser uma “marca” entre muitas. E - suprema humilhação -, o edifício que habitou durante décadas, continuará  a exibir na fachada  o “lettering” do seu cabeçalho, como se ainda houvesse por ali Redacção e rotativa, quando só resiste um cenário de piedosa memória.

Daniel Proença de Carvalho e Ricardo Robles podem dar as mãos pelo seu talento como “homens de (bons) negócios”…