Depois da greve, apoiar o jornalismo
Com a greve geral dos jornalistas, a primeira desde 1982, talvez se tenha percebido melhor a importância do jornalismo livre para a vida democrática. E compreendido como de um jornalista extenuado e mal pago não podemos esperar essa contribuição.
As condições de trabalho dos jornalistas em Portugal são, salvo honrosas exceções, muito insatisfatórias. Ora um jornalista pressionado pelos seus patrões para tornar o seu trabalho mais capaz de, por quaisquer meios, atrair leitores, ouvintes ou telespectadores – por exemplo, carregando no sensacionalismo – não cumpre a ética da sua profissão, porque não o deixam. Aliás, nem são precisas pressões patronais, bastará o receio de que a empresa de “media” onde trabalha se arriscar à falência para que o instinto do jornalista dê prioridade a tornar a sua peça atrativa pelas piores razões.
É por isso que não basta reconhecer o que o jornalismo contribui para a vida democrática, como importa também avançar com medidas que tornem viável esse jornalismo.
A crise dos “media” é mundial, ou quase. Mas Portugal é dos países europeus onde há menos apoios à comunicação social, como afirmou Luís Simões, presidente do Sindicato dos Jornalistas, acrescentando: “ou se apoia agora o jornalismo livre e independente ou vai ser tarde demais”. Daí que o próximo governo tenha que abordar esta questão a sério.
Não há soluções fáceis, uma vez que os apoios concedidos pelo Estado podem ter implícita uma contrapartida de moderação das críticas dos “media” aos governantes, o que seria inaceitável. Mas esse problema coloca-se em muitos outros países democráticos, alguns dos quais lograram encontrar soluções razoáveis, nas quais os nossos governantes se poderão inspirar – desde que haja vontade política, claro.
Este ponto da vontade política é importante pois existem forças políticas que não prezam a atividade dos jornalistas. No regime derrubado há cinquenta anos vigorava a censura prévia. Ora aqueles que, mais ou menos abertamente, sentem hoje saudades da ditadura não estão interessados num jornalismo livre, pretendem, isso sim, um jornalismo controlado por eles, sobretudo quando chegarem ao poder.
Esta é uma característica comum à extrema direita. Desde o americano Trump ao húngaro Viktor Orbán a atitude dessa extrema direita é detestar os jornalistas. Como já aqui referi, o habilidoso primeiro-ministro V. Orbán até arranjou uma maneira de dispensar a censura: vendeu a empresários seus amigos políticos os principais órgãos húngaros de comunicação social, que assim controlam a informação.
Por vezes, quem se apresenta como liberal ou mesmo ultraliberal, tendo chegado ao poder não hesita em violar os direitos a uma informação livre. Veja-se o caso de Javier Milei, que em novembro passado venceu as eleições presidenciais na Argentina.
O populista J. Milei intitula-se um “libertário” e lançou uma vasta campanha de privatizações. No princípio do corrente mês o presidente Milei mandou encerrar uma agência de notícias do Estado, fundada há 78 anos. Desagradavam-lhe as notícias difundidas por essa agência, a segunda maior de mundo de língua espanhola, logo depois da agência Efe de Espanha.