Comunicação e Audiências – Ditaduras e Democracias
Antes de iniciar uma viagem convém saber onde estamos.
Como diz o meu GPS, 40 graus Norte e 8 graus Oeste. Um ponto bem agradável para se viver na nossa querida Aldeia Global.
Mal sabia McLuhan quanto estava a acertar em algumas previsões e a errar noutras. Com efeito, se é verdade que o conceito de Aldeia Global é cada vez mais aceite por todos, o mesmo não se pode dizer da afirmação tantas vezes repetida de que o meio é a mensagem.
A evolução da sociedade de informação fez evoluir o conceito clássico de comunicação: um emissor – um receptor – uma mensagem – uma resposta - um meio, para um receptor – uma resposta – um emissor – uma mensagem – multimeios. Ou seja, o meio deixou de ser a mensagem. Agora o feed-back é a mensagem!
Estamos em plena ditadura das audiências para o poder económico, para o poder político e para aquele até agora chamado quarto poder e que, dada a inversão atrás referida, se transforma em primeiro.
Quer dizer, a promiscuidade entre quem emite e quem recebe, entre quem critica e quem manda, entre quem analisa e quem faz, aliada à completa demissão de quem dirige, em termos do que deve ser a sua própria iniciativa, conduziu ao total vazio das instituições e das ideias e à crise absoluta de valores em que actualmente se vive.
Já não se sabe bem quem faz mais política ou jornalismo. Será o político ou o jornalista? Ou vice-versa? E afinal quem tem mais poder? O produtor ou o consumidor? O emissor ou o receptor?
Claramente, digo eu, os últimos. Isto é, o jornalista, o consumidor, o receptor. E tudo se mede por aí. Quantas vezes se sai na imprensa, quantos consumidores existem, quantos receptores se atingem. É tudo em função das suas respostas, independentemente dos meios utilizados. O feed-back é a mensagem. Números, números e números…
No entanto há, emergente e triunfal, uma grande vencedora em tudo isto. Sabem quem?
A Publicidade.
É verdade. A nossa querida publicidade que neste país tem sido considerada desde mal necessário a poluição inadmissível, proibida e odiada por uns, amada e idolatrada por outros, a publicidade tem tido a mais doce das vinganças: todos a copiaram.
De forma de comunicação menor, a Publicidade foi qual trepadeira desenvolvendo as suas ligações e entrelaçando-se em todos os domínios da sociedade de informação. Seja pelo estilo, seja pela técnica, seja pelo poder.
A Publicidade influenciou, em definitivo, todas as formas de comunicação, tornando-as mais apelativas, mais eficazes e mais directas por forma a chegarem melhor ao consumidor, à audiência, aos receptores, aos eleitores.
E desta forma hoje todos os meios de comunicação vivem de e para a Publicidade. Vivem para o consumidor e para as audiências. Vivem do consumidor e das audiências. A ditadura das audiências, lá regressamos nós.
Sempre achei engraçado que se chame a este fenómeno ditadura de audiências e não democracia de audiências. Na verdade, passou-se de um sistema em que poucos mandavam em muitos para um em que muitos mandam em poucos. Em termos simplistas, podemos pois dizer que estamos em plena democracia de audiências e não em ditadura. Por que será então que o termo pegou e a ideia passou?
Porque é verdade. O que se tem vindo é a cavar a própria essência da democracia por dentro e a chegar àquele caro conceito de Pessoa quando diz qualquer coisa como: a democracia é a pior das ditaduras porque não se escolhe entre aquilo que se quer mas, antes, entre aquilo que nos querem dar para escolhermos.
Encontramos assim uma curiosa realidade a que poderíamos chamar ditadura da democracia. Ou será antes ditadura da comunicação?
Mais um novo conceito que nos levaria muito longe. Fica para outros.
Tudo o que ficou escrito acima é parte de uma apresentação (“COMUNICAÇÃO NO SÉC. XXI”) feita no âmbito do VIII Congresso da APAP, em Março de 1998.