A “Tribuna de Macau” e a pandemia
Agora estamos no designado “período de consolidação” em que os números de infecção não podem baixar mais: há cinco dias que não é detectada nenhuma infecção comunitária por covid. Se tudo correr bem, segue-se mais uma ronda de testes em massa para todos os residentes, antecedendo o “período de estabilização”e se concluírem que não há infecções no seio da comunidade, a cidade voltará ao “normal”, com as habituais máscaras e apresentação de código de saúde.
Este quadro aqui esboçado da situação pandémica reflecte-se, como é natural, na situação da imprensa de Macau em língua portuguesa, e nomeadamente, na Tribuna que, este ano, vai celebrar 40 ininterruptos anos de vida, o que assegura para já o recorde de existência de todos os jornais em português na história de Macau, onde a “Abelha da China” foi o primeiro jornal impresso por tecnologia ocidental em 1822.
Tal como aconteceu com toda a economia, os jornais em português foram “arrasados”. Escasseia pessoal. Quando as restrições começaram a incomodar, alguns dos jornalistas regressaram a Portugal e como os não residentes não podem entrar, as redacções estão deficitárias.
Em termos financeiros, houve cortes nos departamentos de publicidade dos serviços públicos, as associações que tinham acordos também foram afectadas, “a bola de neve” foi por aí adiante.
Na Tribuna houve necessidade de “cortar algumas gorduras”, mas a resiliência dos que se mantêm tem sido igual à resiliência de toda a Macau- do Governo aos residentes e migrantes. Diariamente, continuam a ser publicadas 16 páginas, metade sobre a situação local, o resto de Actual, com ênfase nos países que nos cercam, Portugal e países de língua portuguesa, Desporto, Opinião, Cultura e Entretenimento, que Macau não está isolada do Mundo.
Tendo sido um dos fundadores da Tribuna de Macau (o outro foi a pessoa que me convidou a vir para o projecto - Jorge Neto Valente), cedo me apercebi que um jornal de Macau em português não tinha condições para se manter como “negócio”. Tinha que abraçar o papel cultural de se incorporar num território em que a Língua Portuguesa é, também, uma língua oficial.
Ainda fui gozado por isso quando, antes da internet, a Tribuna enviava jornais aos leitorados de Portugal na Ásia, bem como por patrocinar concursos sobre a língua portuguesa em Universidades locais, receber estágios temporários de estudantes chineses de português, ser “media partner”, de inúmeras acções culturais de associações locais e também por co-patrocinar, com a Fundação Jorge Alvares e o Clube de Imprensa, um prémio de Jornalismo da Lusofonia, que a pandemia limitou a dois anos.
E devo registar, com muito agrado, que muitas acções culturais também são apoiadas pelos outros dois diários locais em língua portuguesas.
A pandemia mostrou que o papel cultural é importante. Sem um projecto ligado à aprendizagem e posterior solidificação dos conhecimentos da Língua portuguesa, o apoio às realizações portuguesas, incluindo ao Consulado Geral de Portugal e à divulgação de empresas, não faz sentido publicar um jornal em português em Macau.
É certo que contamos com o apoio, bem definido, do Governo de Macau, antes e depois da transição. Por lei, os anúncios das acções governativas têm de ser divulgados num jornal em português e em chinês e, anualmente, é atribuído um subsídio.
Tenho notado que esse facto é alvo da atenção de camaradas portugueses, alguns de que não me recordo terem pruridos de reconhecer a isenção do DN quando era nacionalizado, por exemplo, no tempo de Mário Mesquita e Dinis de Abreu.
Não conhecem Macau. Aqui, a 11 mil quilómetros de distância de Portugal, quase tudo o que é português é subsidiado pelo Governo da RAEM, desde a Escola Portuguesa à Casa de Portugal, passando por outras iniciativas como o Festival da Lusofonia.
É compreensível. A presença portuguesa em Macau é um legado da história, que aos portugueses aqui residentes cumpre defender, honrar e ajudar a manter.
(José Rocha Diniz é o actual administrador do jornal Tribuna de Macau)