Com uma ligeireza que espanta, o juiz conselheiro Henrique Araújo resolveu aproveitar uma conferência corporativa para desferir um ataque contundente contra “poderosos grupos económicos que adquirem empresas de comunicação social para, através delas, influenciarem a opinião pública e levarem por diante os seus interesses “, um diagnóstico genérico e pouco esclarecedor ou uma “carapuça” que pode servir a vários sem servir a ninguém.

De facto, não se vislumbram os “poderosos grupos económicos” que andem por aí a comprar empresas de media em saldos de fim de estação.

Mas o actual presidente do Supremo não se fica por aí. Insinua e lavra sentença contra “uma série de profissionais da informação“ que, segundo o seu douto parecer , “gravita “ na comunicação social  e que “manda às malvas os códigos de ética formais e informais e se deixa manipular por interesses económicos, políticos e outros”. Portanto, um caso sério de indignidade perversa e de corrupção, no mínimo, moral.

De uma penada, Henrique Araújo “manda às malvas” a prudência e o bom senso que se esperam de um ilustre magistrado, e coloca no pelourinho empresas e jornalistas, confundindo deliberadamente a excepção com a regra, embora ressalvando, piedosamente, alguns profissionais  “sérios e independentes”, que não se comprazem com a manipulação e a divulgação de notícias falsas “com objectivos esconsos “. É obra.

Claro que o juiz-conselheiro não exemplifica, em concreto, o “estado das coisas” que tanto o preocupa e de que, pelos vistos, os tribunais têm “uma noção exacta”.  E ficamos na mesma.

Há uma fixação obsessiva de não poucos actores do aparelho judiciário em relação aos media e aos jornalistas, frequentemente suspeitos de “fugas de informação”, quando não mesmo de acesso indevido a processos em segredo de Justiça.

Como se - e não raramente -, essas “fugas” não fossem “patrocinadas” pela investigação policial ou pelos próprios tribunais.  

Afinal, os jornalistas têm o dever de informar e não de esconder ou de escamotear a informação que chegou ao seu conhecimento.  Se esta é sigilosa, cumpre à Justiça acautelá-la.  O contrário é “lavar as mãos” de responsabilidades, endossando-as a terceiros, neste caso a jornalistas, supostamente instrumentalizados para destruir “a honorabilidade e o bom nome de uma figura com mais protagonismo político ou social a partir da publicação de simples indícios”.

Faria melhor Henrique Araújo se, em vez de zurzir nos media e nos jornalistas, procurasse olhar por dentro para os mecanismos da Justiça, onde juízes e tribunais não estão isentos de culpas na morosidade dos processos – ou na violação do sigilo – e onde se permitem acumular expedientes processuais com o único objectivo de chegarem à prescrição.

Ou onde um recurso do Ministério Público pode demorar mais de um ano até subir a um tribunal superior para ser avaliado sabe-se lá quando…

Num Estado de Direito a Justiça é um pilar da Democracia que não pode “sacudir a água do capote” …