Começou por falar da Europa, espaço onde uns escassos 7% da população mundial produzem mais de 30% do conhecimento global. No velho continente destacou três particularidades: uma plataforma de convergência e de bem estar, um espaço de conhecimento, e um estado social forte. Algo que todo o mundo gostaria de imitar. Entende que é necessário conservar estas características e explorar aquele pilar - referia-se à inovação e ao conhecimento! -, o único que realmente pode gerar riqueza e promover crescimento. Porque, acrescentou ele, a inovação foi o grande responsável pelo crescimento, sendo-lhe atribuído 62% do crescimento verificado na Europa entre 1995 e 2007.

Não advoga uma inovação, embora sustentada, que apenas sirva para substituir produtos ou aumentar a eficiência na sua utilização. Defende sim, uma inovação criadora de mercado, logo, de emprego. Isto é, novos produtos-verdadeiramente novos! –, e com novas aplicações. Como exemplos desses produtos que, nas últimas décadas, ajudaram a mudar radicalmente a nossa forma de viver indicou: o telemóvel e o computador pessoal. Poderia ainda ter referido a máquina fotográfica digital, o vídeo gravador, o walkman, que muito ajudaram a prosperar o Japão do pós guerra.

Para Carlos Moedas, vivemos plenamente a revolução digital. Comparou a máquina a vapor, símbolo da revolução industrial, com o transístor desenvolvido na Bell em 1940, símbolo da revolução digital. Serviu-se deste dispositivo eletrónico para exemplificar aquilo que ele designou por investigação fundamental, a investigação sistemática realizada dentro de uma empresa com a intervenção de vários especialistas. O palestrante acha que a Europa não tem tido no sector digital o sucesso que tem no sector industrial. E questionou-se sobre as causas desse insucesso, considerando que o que falha na Europa resulta da sua fragmentação, são as barreiras invisíveis entre países.

Depois falou da sua visão para o futuro, da necessidade de uma grande abertura: open inovation, open science e open to the world. Enfatizou o papel dos consumidores como motores da inovacão. É o conceito de user inovation, que pode motivar um engenheiro a descobrir a cura de uma doença. Entretanto, aproveitou para informar que viria falar sobre o tema, na Gulbenkian, em julho, o maior especialista mundial da matéria, o professor da Sloan Management School do MIT, Eric von Hippel. Referindo às interações, cada vez maiores, entre o mundo físico e o mundo digital - a internet das coisas! – apontou quatro sectores que, no futuro, serão muito afetados por esta interação entre o físico e o digital: os sectores da alimentação, da água, da energia e da saúde.

A ciência tem de ser open, o conhecimento tem de ser difundido de forma gratuita - não podemos pagar para ler. Sobre o terceiro pilar, a abertura ao mundo, que ele designou de Ciência e Diplomacia, mencionou uma recente visita à Jordânia para visitar o único centro acelerador de partículas no médio oriente. Aí viu irmanados pelo conhecimento árabes e judeus, partilhando uma linguagem comum: a linguagem da ciência. A propósito deste pilar, e citando a obra Os Inovadores de Walter Isaacson, evocou uma filha do poeta Lord Byron, Ada Lovelace, nascida em 1815, colaboradora do inventor do computador Charles Babbage e que foi o primeiro programador da história. Ada anteviu a economia digital e referiu que a Arte  - a literatura, a música e a pintura, por exemplo -  um dia seria reduzida a números.

Carlos Moedas é um tecnocrata com uma visão simplista das coisas. É um crente da economia liberal, acredita no crescimento ilimitado, e vê na inovação o caminho para o conseguir. A Europa, com a sua baixa natalidade, sem recursos energéticos, começa a enfrentar uma grave crise de crescimento. Ora a inovação, só por si, não vai gerar o crescimento que a Europa necessita para manter o atual nível de conforto e o seu generoso estado social. Além disso, tem o espartilho da fragmentação entre países e uma estrutura de produção de conhecimento essencialmente académica, que é demasiado pesada num sector onde é preciso correr riscos e tomar decisões rápidas... Aquilo que os académicos não sabem ou não gostam de fazer!

O crescimento baseado na inovação pode ser um crescimento limpo e desejável para a velha Europa... mas, duvido muito que vá acontecer... Estou mais próximo de Robert Ayres, que considera a energia o mais importante fator de crescimento. E, sobre a inovação, partilho da linha de pensamento de Joseph Tainter: acredito que é muito elevado o risco de, através dela, aumentar a complexidade social e criar condições para aumentar a ocorrência de Cisnes Negros.

Uma questão, talvez filosófica, será a de saber se o telemóvel é, afinal, uma coisa boa ou uma coisa má... E o mesmo se pode perguntar sobre a televisão, sobre os jogos de computadores etc... De alguma forma, a Europa, se quer ter futuro, tem de ter a coragem de desinovar e reencontrar-se no que é simples e espiritual. Para tornar as pessoas mais fortes, mais humanas e mais felizes.

Julgo que Carlos Moedas ainda não percebeu que o futuro da Europa vai jogar-se em Kiev, na Crimeia e em Lampedusa, e não no Cern ou nos meandros da economia digital.

[Presidente da Fundação Vox Populi]