Editoras exigem às “Big Tech” pagamento pelas notícias

Muitos países estão a seguir o exemplo da Austrália e a pressionar a Google e o Facebook a pagar pelas notícias.
As editoras de notícias, estão a analisar números para descobrir quanto é que a Google e a Meta lhes deve pela publicação de notícias online, segundo refere um artigo publicado no Pointer, assinado por Anya Schiffrin.
Mas esses números estão envoltos em sigilo e dificilmente serão divulgados. Esses números deverão ser usados para facturar à Google, que já estará a oferecer dinheiro a algumas editoras, numa tentativa de evitar a legislação que a obrigará a pagar.
As editoras, por seu lado, estão a analisar, não apenas a receita de publicidade já perdida nas plataformas, mas também o preço do licenciamento de conteúdos no futuro, o valor das marcas que publicam as notícias, o valor relativo aos dos dados dos clientes e em quanto é que o monopólio do Google no mercado de publicidade está a beneficiar a Google, que está nos dois lados do mercado.
Além disso, as editoras podem também ter de vir a calcular um preço para o conteúdo usado nos Large Language Models (LLM), o modelo que entende e gera texto semelhante ao da forma humana.
Em março de 2021, a Austrália tornou-se o primeiro país a usar a lei da concorrência para pressionar a Google e o Facebook a pagar pelas notícias. Com o objectivo de rectificar o desequilíbrio de poder entre as grandes plataformas e as editoras de notícias, Rod Sims, então presidente da comissão da concorrência da Austrália, elaborou um “código de negociação dos media” que dava ao governo o direito de “designar” certas plataformas e exigir-lhes que negociassem com as editoras, chegando a um acordo sobre valores devidos.
Saber que o governo tinha o direito de forçar as negociações levou a Google e a Meta a fazerem acordos por conta própria e, como resultado, foram injectados mais de 140 milhões de dólares, por ano, desde essa altura, no jornalismo da Austrália, segundo Rod Sims.
Agora, Canadá, Brasil, Indonésia, África do Sul, Nova Zelândia e Estados Unidos estão a analisar e a pensar em leis semelhantes. Alguns analistas esperam que o Canadá aprove a sua lei C-18 nos próximos meses. A Indonésia tem discutido um projecto de ordem executiva vinda do gabinete do presidente, enquanto a autoridade da concorrência da África do Sul começou, recentemente, a sua investigação.
Enquanto isso, editoras e associações já fizeram cálculos detalhados sobre os montantes que consideram que a Google e o Facebook estarão a dever pelas notícias.
“É um grande trabalho e como qualquer negociação, o processo é delicado”, refere a autora. “Google e Meta não revelam como usam as notícias, como as valorizam ou como são distribuídas e os editores em mercados mais pequenos têm medo de pressionar demais”, acrescenta.
No Canadá, a Google e o Facebook experimentaram “deixar cair” os links de notícias em fevereiro de 2023, levando o primeiro-ministro Justin Trudeau a pedir às empresas que pagassem pelas notícias em vez de as bloquear.
No Brasil, o governo anunciou, recentemente, que iria investigar a Google depois desta empresa adicionar um link à sua página inicial, para utilizadores brasileiros, que alertava que a proposta de lei que o país tem sobre este tema, arruinaria a internet. Aliás, a empresa também terá dito aos grupos de jornalismo que apoiam a lei brasileira, que iria reduzir ou interromper o financiamento existente para o jornalismo, segundo conta Natalia Viana, presidente da associação brasileira de jornalismo digital AJOR, que explicou também, que a proposta brasileira é um projecto de lei que vai ser dividido em duas partes, com a parte do código de negociação a ser separada dos aspectos acerca dos direitos de autor, para facilitar a sua aprovação.
Enquanto isso, “as plataformas tentaram desviar os legisladores da lei do código de negociação, apresentando um projecto de lei de autorregulação e uma comissão de liberdade de expressão”, refere Anya Schiffrin.
Em Taiwan, a Google prometeu 9,8 milhões de dólares, ao longo de três anos, para ajudar a digitalizar a media taiwanesa.
Os editores suíços divulgaram um estudo que afirma que a Google deve ao sector 166 milhões de dólares por ano.
Danielle Coffey, vice-presidente executiva e conselheira geral da News/Media Alliance, uma associação comercial que representa 2.000 revistas e meios de comunicação de notícias em todo o mundo, disse que as editoras dos EUA “devem biliões”, mas que os números se mantêm em sigilo, para serem depois utilizados numa possível “arbitragem”. O Canadá estima que a compensação a pagar poderá ser de 329,2 milhões de dólares canadenses (225,24 milhões de euros) por ano.
Na Indonésia, nos Estados Unidos, no Reino Unido e na África do Sul, os grupos editoriais não estão a divulgar as suas estimativas. Somado ao desejo de sigilo está o medo, já que a partilha de números pode ser vista pelos governos como algo que abre caminho para conluio ou fixação de preços.
Isto pode, porém, significar que, para os grupos editoriais mais pequenos, a arbitragem pode ser mais difícil, pois pode não ter recursos para contratar especialistas para calcular o que é devido. “Nem têm a influência”, diz a autora.
As pequenas editoras querem ter o direito de negociar colectivamente, o que aconteceu na Austrália. Lá, a Minderoo Foundation, uma fundação australiana que está a promover activamente o código, forneceu ajuda jurídica, associou-se à Country Press, uma associação de pequenos editores, e prestou assessoria jurídica para os ajudar a negociar colectivamente.
Na África do Sul, o South African National Editors Forum, uma organização sem fins lucrativos, também está determinado a garantir que as pequenas editoras sejam incluídas nas negociações.
Segundo a autora, Paul Deegan, presidente e CEO do grupo industrial News Media Canada, terá dito num e-mail que “na preparação para a introdução da legislação (C-18), Google e Meta começaram a fazer acordos com várias grandes editoras, o que levou a um desequilíbrio entre todas. A aguardada Lei das Notícias Online irá abordar esta questão e garantir que grandes e pequenas editoras obtenham um acordo justo. Aliás, na Austrália, “algumas pequenas editoras saíram-se melhor do que as maiores”, em termos financeiros.
“Quer os códigos de negociação tomem forma em todo o mundo, ou não, eles já estão a fazer efeito, porque estão a pressionar a Google a fazer pagamentos a agências de notícias, antes mesmo de tais leis serem aprovadas”, afirma a autora.
O Google South Africa recusou-se a comentar, mas Marianne Erasmus, principal parceira de notícias da Google na África do Sul, terá dito num e-mail: “a Google preocupa-se profundamente com as notícias e, nos últimos 20 anos, colaborámos estreitamente com os editores de notícias para apoiar a criação de jornalismo de qualidade na era digital”, conclui Anya Schiffrin no seu artigo.