Depois da recente nomeação de novos administradores na Global Media e da saída do polémico World Opportunity Fund, o Meios & Publicidade (M&P) publica um artigo longo em que recupera a história do Grupo desde as suas origens até aos dias de hoje.

Antes do recuo histórico, importa lembrar a situação actual do Global Media Group (GMG).

Na última assembleia geral, em Fevereiro, foi nomeado um novo conselho de administração, agora composto por Marco Galinha, Kevin Ho, António Mendes Ferreira, José Pedro Soeiro, Victor Menezes, Vítor Coutinho, Rui Rodrigues e Diogo Queiroz de Andrade.

Entretanto, foi designado CEO Vítor Coutinho, que entre entre 2014 e 2021 desempenhou funções de vice-reitor do Santuário de Fátima.

Ao mesmo tempo, o Grupo chegou a acordo para a venda de alguns títulos, entre os quais o Jornal de NotíciasO Jogo e a TSF. A Global Media parece querer manter “uma quota de 30% na nova sociedade constituída pelo grupo de novos acionistas do JN”, avança o M&P. Os Diário de Notícias e o Açoriano Oriental deverão manter-se na alçada da Global Media.

Mas “o grupo que Joaquim Oliveira comprou por 300 milhões de euros à Portugal Telecom (PT) pouco ou nada tem a ver com o que é agora”, lança o M&P. “Como foi possível que uma empresa detentora de títulos tão fortes e prestigiados no panorama português tenha chegado a esta situação?”, pergunta, procurando a resposta na história do GMG.

Algumas datas importantes na cronologia da Global Media

Assinalado o ano da criação do Diário de Notícias, 1864, é dado o salto para os anos 1990.

  • 1991: Os jornais Diário de Notícias e Jornal de Notícias são comprados por Luís Silva, tenente-coronel e patrão da Lusomundo. Esta seria a génese do atual grupo de média.
  • Por esta altura, apesar da concorrência d’O Independente e do recém-fundado Público, O DN é“o jornal de referência de Lisboa”, lembra o M&P. Ao mesmo tempo, no Porto, o JN chega “várias vezes a atingir o primeiro lugar do ranking dos mais vendidos em Portugal”.
  • 2000: Luís Silva vende o negócio, incluindo as publicações, à PT Multimédia. A ideia da PT era“reunir os conteúdos da Lusomundo Média à infraestrutura que a PT Multimédia tinha montado para, desta forma, criar uma oferta de valor aos subscritores do cabo”, explica o M&P.
  • Mas “cedo a PT percebeu que gerir jornais era uma dor de cabeça”. Entre outros factores, era necessário um conhecimento específico de um sector que tem características muito próprias.
  • 2005: Chegada da Controlinveste. A PT vende o negócio de média, por 300 milhões de euros, a Joaquim Oliveira, dono da Olivedesportos, empresa concessionária da publicidade nos jogos de futebol da Primeira Liga. À data, o admnistrador da PT era Miguel Horta e Costa.
  • O negócio é muito comentado. “Sabia-se que o empresário do futebol tinha contraído uma dívida importante para adquirir títulos muito fortes”, sendo que o diário da capital começava a viver períodos de instabilidade.
  • O DN tem seis directores em três anos.
  • Durante estes anos, a Controlinveste vai aumentando as suas dívidas, a par das dificuldades por que passam os negócios da Olivedesportos.
  • 2012, 2013: entram novos sócios, e novo capital, na Controlinveste. António Mosquito, angolano ligado à petrolífera Sonangol, passa a deter 27,5% do Grupo, a mesma quota que Joaquim Oliveira. Luís Montez, conhecido empresário dos espectáculos, entra para o grupo de accionistas, ficando com 15%. Também os bancos BES e BCP ficam com 15% cada um.
  • Os novos accionistas escolhem, para liderar a gestão da empresa, Victor Ribeiro, que vinha do grupo Amorim, e José Carlos Lourenço, saído da Impresa, onde era responsável pela área comercial. Para a presidência do conselho, é nomeado Daniel Proença de Carvalho.
  • A perspectiva é optimista e é nesta altura que surge o nome por que é hoje conhecido o Grupo, Global Media Group, “uma alusão às suas ambições internacionais”, diz o M&P, uma vez que a estratégia passava por uma “internacionalização da marca no espaço lusófono”.
  • O período é de grandes reestruturações. Os principais jornais ganham um novo layout e é reforçada a equipa do digital. A grelha da TSF foi também renovada.
  • Foi também por esta altura que se concretizou um despedimento colectivo de mais de 200 pessoas e “um emagrecimento geral da estrutura operacional”.
  • O Grupo alcançou um EBITDA [lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações] positivo de 186 mil euros, recuperando de um EBITDA negativo de oito milhões em 2014.
  • Em 2016, é vendida a icónica sede do DN, na Avenida da Liberdade, e o jornal é transferido para as Torres de Lisboa. “O valor oficial da venda não é divulgado, mas os meios de comunicação social avançam o valor de 20 milhões”, lembra o M&P. Nesse ano também, é lançada uma área de branded content e feita uma grande aposta no digital.
  • 2016 termina com um EBITDA de 2,4 milhões de euros, mas “a empresa continua com prejuízos superiores a quatro milhões e uma dívida aos bancos de 35 milhões de euros”.
  • 2017: chegam novos accionistas, vindos de Macau. Com uma entrada de capital de 15 milhões de euros, e ficando com uma quota de 30%, o novo accionista é o grupo macaense KNJ Global Holdings, da área da construção civil e ligado ao empresário Kevin Ho.
  • José Pedro Soeiro, empresário e gestor angolano, entra agora no negócio, ficando com as participações de António Mosquito e de Luís Montez.
  • A nova estrutura accionista é, então, a seguinte: KNJ com 30% do Grupo, José Pedro Soeiro também com 30%, Joaquim de Oliveira com 20%, e o BCP e o BES com 10% cada um.
  • 2018 e 2019 são anos de muita agitação no Grupo: é feito o investimento numa plataforma de jogos e apostas online e lançado o projecto de vídeo V; o DN passa a jornal semanal; no Natal de 2018, o pagamento do subsídio aos colaboradores chega atrasado, suscintando preocupação; fala-se em nova reestruturação, num ano em que os prejuízos duplicaram para nove milhões de euros.
  • No fim de 2019, KNJ e José Pedro Soeiro compram a quota dos bancos. “Não se sabe oficialmente o valor do negócio, mas, segundo o jornal Eco, estes conseguem um desconto superior a 80%”, lembra o M&P. A estrutura accionista passa a estar dividida por três entidades: KNJ e José Pedro Soeiro, cada um com cerca de 40%, e Joaquim Oliveira, com cerca de 20%.
  • 2020: Marco Galinha, empresário com interesses em várias áreas de negócio e dono do grupo Bel, compra 40% do GMG, pelo valor de quatro milhões de euros, e faz uma injecção de capital de seis milhões de euros.
  • Nova reestruturação no Grupo, incluindo “o já antecipado” despedimento colectivo de 81 colaboradores, dos quais 17 jornalistas.
  • São nomeados novos directores. O DN é relançado como publicação diária em papel. A revista Evasões passa a caderno destacável do DN e do JN,  e a Notícias Magazine passa a ser suplemento do JN.
  • Em 2021, é apresentada a nova administração, encabeçada por Marco Galinha.
  • O período não é, no entanto, de estabilidade. Estamos em período de pandemia e o Grupo anuncia a adesão ao regime de apoio à retoma progressiva, “o que implica a redução do horário de trabalho e cortes efetivos nos ordenados acima de dois mil euros brutos, bem como outras limitações e benefícios fiscais”.
  • No Verão desse ano, os conselhos de redacção insurgem-se contra decisões tomadas pela administração, nomeadamente o fim do pagamento a políticos pelos seus artigos de opinião, o fim de pagamento a políticos por textos que escrevam em qualquer das marcas do grupo, e o acesso da administração às passwords das redes sociais dos títulos sem que a direcção tivesse tido conhecimento.
  • Apesar dos tempos conturbados, de acordo com um comunicado do grupo citado pelo M&P, o EBITDA de 2021 volta a ser positivo, as vendas do Grupo cresceram 9% e registaram-se 35 milhões de euros em lucros operacionais.
  • Em 2022, as estatísticas parecem continuar a favor do Grupo, mas o contexto internacional complica-se, designadamente com a guerra da Rússia na Ucrânia, e “a contestação continua quando é anunciado um programa de rescisões por mútuo acordo”, ao mesmo tempo que são criticadas decisões editoriais, como a contratação da jornalista Alexandra Borges para o cargo de directora de grande reportagem, com equipa própria.
  • 2023: entra um novo sócio para o grupo, António Mendes Ferreira, dono da United Resins, uma indústria exportadora da Figueira da Foz, que fica com 10% do capital. Marco Galinha reforça a sua participação e passa a accionista maioritário, com 50,2%.
  • Em Setembro, é noticiado que o World Opportuny Fund adquire, por um valor que não foi divulgado, uma participação maioritária na empresa Páginas Civilizadas, ficando com participação social e direitos de voto no GMG.
  • É anunciada a nova comissão executiva, liderada pelo jornalista João Paulo Fafe.
  • Em Dezembro, em comunicado interno, a comissão executiva anuncia que irá negociar com carácter de urgência rescisões com 150 a 200 trabalhadores e avançar com umareestruturação, que João Paulo Fafe disse ser necessária para evitar “a mais do que previsível falência do grupo”, noticia a Lusa.

Desde aí, “a história ainda do GMG está fresca na memória de todos”, cujo capítulo mais recente passou pela designação de Vítor Coutinho para CEO do grupo. O futuro continua a ser uma incógnita.

(Créditos da fotografia: Manuelvbotelho, via Wikimedia Commons, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=23751371)