Jornais unem-se para exigir pagamento das notícias às plataformas
O CEO do Le Monde, Louis Dreyfus, considera a chegada da Inteligência Artificial (IA) generativa uma “emergência” para a indústria dos media, em termos de regulação. O assunto foi debatido na Deloitte and Enders Media and Telecoms Conference 2023, onde estiveram presentes vários directores executivos de empresas de media, que expressaram os seus receios sobre a utilização das notícias, nas experiências dos grandes modelos de linguagem de Inteligência Artificial (IA), como é o caso do ChatGPT, sem que seja necessário qualquer tipo de licença ou sistema de pagamento.
O tema principal do painel centrava-se na sustentabilidade das notícias, mas acabou por ser dominado pela discussão sobre a inteligência artificial.
Os membros executivos do The Guardian, Financial Times (FT) e Le Monde concordam que os media devem ser reconhecidos e pagos pelos seus conteúdos noticiosos, na internet.
Caso contrário, será “o fim do nosso modelo de negócios”, alertou Dreyfus.
“Temos de definir uma posição comum” e determinar “o que é que as empresas de IA estão prontas” a fazer acerca da “utilização de todo o conteúdo” noticioso, acrescentou.
“Se o nosso conteúdo – que custa uma quantia considerável de dinheiro e investimento para produzir – está a ser usado para treinar modelos que são incrivelmente poderosos e a base para uma criação de valor incrível, então precisa haver algum tipo de reconhecimento sobre isso”, considerou a CEO do Guardian Media Group, Anna Bateson,
Jon Slade, director comercial do Financial Times, por seu lado, referiu que “há muito boas evidências” de que o arquivo do seu jornal foi usado para treinar grandes modelos de linguagem. “E foi usado sem o nosso consentimento, foi usado sem licença”, refere. “Como director comercial, acho que deveria haver um pagamento por isso”, acrescentou.
“Por outro lado, fico feliz que o nosso jornalismo de qualidade faça parte desses modelos. E isso pode ser uma forma de diminuir o risco de desinformação, mas não prejudica a emissão da licença quando ela é necessária”, afirmou.
No entanto, a possibilidade de “digitar uma pergunta, ou escrever histórias utilizando o nosso conteúdo”, ou de o misturar com “conteúdo de baixa qualidade”, torna-se “um risco para o debate político, para a sociedade política”, referiu o CEO do Le Monde a propósito da confiança na veracidade do conteúdo generativo de IA, sobre a qual o director executivo do Telegraph Media Group, Nick Hugh, também fez questão de alertar.
Questionado sobre que oportunidades Dreyfus vê para o jornalismo na era da IA generativa, que pode criar textos longos a partir de tópicos curtos, prevendo qual é palavra mais provável que se vai seguir numa sequência, o CEO do jornal francês disse: “Acredito firmemente que há mais risco do que oportunidades para nós. O nosso modelo de negócios é baseado na confiança. Com a IA, corremos o risco de obter menos confiança e menos exclusividade”.
“Não há clareza suficiente e, portanto, a IA está a criar uma oportunidade para os maus actores. Esse, para mim, é o grande risco. Mas, obviamente, há oportunidades. Embora eu seja muito pouco pró-geração automatizada de conteúdo”, disse Nick Hugh, do The Telegraph.
A propósito, vários foram aqueles que referiram, ainda, que as suas equipas estão a usar a IA não generativa, em algumas partes do seu trabalho, ou seja, não é utilizada para escrever conteúdo editorial.
Dreyfus revelou, por exemplo, que na recém-lançada edição em inglês do Le Monde, a IA realiza a tradução inicial de textos, antes de um tradutor humano fazer uma segunda passagem e, de seguida, um editor que fala inglês faz a verificação final. Sobre isso, é preciso, também, haver “um processo, de transparência e regras que sejam conhecidas pelo leitor na utilização da IA”, acrescentou.
Slade, por sua vez, tem a mesma opinião e descartou o uso de IA generativa na criação de conteúdo do FT. “Temos a certeza de que não teremos artigos escritos por IA”, disse. “Os artigos do FT serão escritos por jornalistas”, acrescentou.