Combatem as “fake news” mas esquecem-se de indicar fontes…

O programa "Brasil contra fake", lançado em março para combater notícias falsas relacionadas com o governo federal, publicou 168 conteúdos em sete meses, mas uma análise, publicada no site Lupa, revela que 52% dessas notas não seguem os princípios básicos de verificação – como a ausência de fontes "linkadas", ou seja, não são transparentes quanto à origem da informação usada para desmentir um boato
Embora tenha sido apresentado como uma ferramenta de verificação, o programa gerido pela Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República não realiza verificação de factos de maneira profissional, conforme indicam as organizações Lupa, Aos Fatos, Estadão Verifica e UOL Confere.
O levantamento da Lupa em parceria com a Lagom Data revela que, em 64 das 168 notas, apenas links do governo justificavam as conclusões, e em 24 notas não há nenhum link para verificar a fonte utilizada.
Popularizado no Brasil a partir de 2014, o “fact checking” é feito de acordo com parâmetros internacionais de transparência – de metodologia, fonte de informação e fontes de financiamento –, apartidarismo e política de correcção e a não apresentação de fontes ou a apresentação de uma fonte única ao leitor fere esses princípios.
“O facto de o 'Brasil contra fake' ter copiado a estrutura de texto das plataformas que se dedicam à checagem de factos do país e de ter sido anunciado como uma fonte para dados inequívocos leva a audiência a confundir o trabalho feito pelo jornalismo – em nome do interesse público – com o trabalho de promoção institucional próprio dos órgãos de comunicação governamentais”, escreve Cristiana Tardáguila no site “Lupa”.
Além disso, a análise aponta que o programa se tornou mais autocentrado, aumentando o uso de fontes do próprio governo de 53% em março para 76% em outubro.
“Dados produzidos por governos são importantes em muitos casos em que a veracidade de um conteúdo está em jogo, mas eles não podem nem devem ser tomados como fonte absoluta”, acrescenta a autora.
O "Brasil contra fake" tem utilizado expressões de organizações de verificação de factos, como Aos Fatos e Lupa, mas sem citar correctamente as fontes. O programa também alterou a sua abordagem ao longo do tempo, passando do foco da desmistificação de notícias falsas para uma ênfase na explicação das acções do governo federal.
Das 168 notas de esclarecimento divulgadas entre março e outubro, o "Brasil contra fake" incluiu links para as suas fontes de informação em 144 ocasiões. Contudo, nestes textos, 70,2% (355 de 506 URLs) das informações utilizadas para desmentir rumores tinham origem em sites do próprio governo, com domínios do tipo .gov.br.
O uso predominante de fontes do próprio governo nas verificações levanta preocupações sobre a falta de diversidade e independência nas informações apresentadas. Além disso, a estratégia de reproduzir conteúdo jornalístico sem a devida atribuição suscita questões éticas em relação à transparência e credibilidade do programa.