Há uma lacuna cada vez maior entre aquilo que as novas gerações procuram nas notícias e aquilo que lhes é dado, sugere um novo estudo sobre o futuro do consumo de notícias, publicado pela consultora de média Financial Times Strategies e o Knight Lab da Medill School of Journalism, com o apoio da Google News Initiative.

O relatório “Next Gen News: Entender o público de 2030” reúne as conclusões de entrevistas com 45 jovens, entre os 18 e os 25 anos, com perfis sociais e geográficos diversos, envolvendo participantes da Nigéria, Índia e Estados Unidos. A investigação inclui, ainda, pesquisa teórica e conversas com especialistas da área.

O estudo sugere que as gerações mais novas sabem o valor que as notícias podem ter nas suas vidas, mas se sentem frustradas e desinteressadas pela forma como a informação chega até elas.

“Na indústria, simplificamos excessivamente os formatos que achamos que os jovens querem. Eles não querem apenas vídeos curtos. Essa é uma parte, mas é muito mais complexo do que isso”, afirmou o responsável de “insights” da FT Strategies, George Montagu, no encontro de lançamento do relatório.

“Esperamos que os editores consigam usar os resultados do nosso estudo para começar a construir melhores relações com a próxima geração de consumidores de notícias”, disse Joanna Levesque, directora executiva da FT Strategies, em comunicado. No fundo, estas “são as pessoas que, no futuro, irão pagar” pelos conteúdos noticiosos, lembrou também Montagu.

O relatório revela as principais tendências de comportamento e os modos de consumo de notícias pelas novas gerações, além de deixar pistas práticas para os editores.

Quatro comportamentos emergentes

  • Várias tarefas no digital em simultâneo no telemóvel: os jovens estão, ao mesmo tempo, a trocar de mensagens com amigos, a fazer compras, a jogar e ouvir podcasts.
  • Filtro através de redes confiáveis: os jovens procuram mais informação partilhada pelas pessoas que conhecem ou por figuras de referência em que confiam. Essas ligações muitas vezes servem como ponto de entrada para as notícias e influenciam a confiança que os jovens têm nas informações.
  • Dar sentido à informação pelo discurso digital: os novos consumidores de notícias vão directamente aos comentários nas notícias e recorrem à troca de mensagens em grupos de amigos para enquadrar os temas da actualidade e ter acesso a várias perspectivas sobre os assuntos.
  • Pesquisa sofisticada: as formas de procura de informação nas redes sociais e outras plataformas digitais têm vindo a ser afinadas, como forma de evitar a sobrecarga de informação.

Cinco novos modos de consumo de notícias

Dos novos comportamentos online, decorrem modos de consumo da informação noticiosa.

  • Filtrar (“Como filtro o ruído?”): num mundo em que estamos constantemente a ser inundados com informação, as novas gerações procuram formas de se manter actualizadas nas notícias mais relevantes sem se sentirem assoberbadas. Filtrar, muitas vezes, “envolve o consumo passivo de notícias”.
  • Fundamentar (“Como sei se é verdade?”): são necessários métodos directos e simples, mas controlados pelo próprio, para confirmar notícias que despertam interesse.
  • Estudar (“Como expando o meu conhecimento?”): embora grande parte do tempo a informação seja filtrada de forma rápida, quando os novos consumidores encontram um tema que lhes interessa, são capazes de mergulhar numa procura activa de conteúdo que os faça sentir que se vão especializando.
  • Socializar (“Como me ligo às outras pessoas?): são alimentadas e reforçadas as  redes de partilha de informação, links e outros conteúdos nos grupos, havendo uma sensação de se estar constantamente actualizado e de se ser validado socialmente pelas escolhas de informação feitas.
  • Dar sentido (“Como percebo o que isto tudo quer dizer?): é necessário considerar perspectivas diferentes e formas acessíveis de processar os conteúdos complexos para entender os assuntos de forma mais completa e abrangente.

A experiência ideal com as notícias (“Ideal News Experience”)

O estudo revela que o actual ecossistema informativo não responde às necessidades da próxima geração e sugere oportunidades para desenvolver uma maior relação de afinidade com o público, entre as quais:

  • a criação de espaços de partilha de histórias contadas na primeira pessoa pelos jornalistas;
  • o maior envolvimento dos jornalistas jovens;
  • o uso de inteligência artificial para melhorar a personalização da experiência de consumo de notícias — a BBC, por exemplo, tem estado a trabalhar numa ferramenta que adapta o conteúdo e o formato às preferências do leitor;
  • o recurso a linguagem mais natural e envolvente (por oposição a linguagem distante e seca);
  • reportagens que incluam informação factual, rigorosa, mas com um tom de esperança sobre o mundo e a possibilidade de agir sobre a realidade em que se vive.

No relatório, são apresentados exemplos práticos de como estas e outras estratégias já estão a ser usadas em redacções de referência por todo o mundo.

(Créditos da imagem: Marvin Meyer no Unsplash)