Transmissão em directo de violência terrorista provoca efeitos colaterais
O autor começa por referir-se aos três atentados do 11 de Setembro nos EUA, do 15 de Março em Madrid e do 7 de Julho em Londres, mas escolhe como objecto do seu estudo os que se deram, no início de Janeiro de 2015, em Paris, “com a intenção de determinar se uma informação difundida em tempo real, num contexto que reflecte uma situação trágica de indubitável interesse público, é ou não conveniente pelas consequências que possa ter para a integridade de determinadas pessoas”.
Depois de descrever os vários episódios de violência que se desenrolaram durante o ataque ao Charlie Hebdo e os outros tiroteios que se lhe seguiram, por membros do mesmo grupo terrorista, Teodoro Ballesteros foca-se no cerco a uma tipografia onde os atacantes tinham feito reféns:
“ (…) Quando ainda não tinham entrado na tipografia as forças de segurança, um deputado regional declarou ao canal RMC que um trabalhador se encontrava escondido e, presumivelmente, facultando à polícia informação sobre o que ocorria lá dentro. Minutos depois, esta notícia era confirmada pela irmã de Lepère [o funcionário escondido] a uma jornalista de France 2, que também emitia em directo. E no mesmo sentido também deu informação a TF1.”
Situação semelhante aconteceu no ataque a um supermercado, quando um jornalista do canal BMF TV afirmou, durante o sequestro de reféns, que “há uma mulher, que estaria escondida desde o início (…) e que se refugiou na câmara de frio e continuaria lá, na parte traseira do estabelecimento”.
“Segundo se soube mais tarde, pela investigação policial, os três atacantes dispunham de meios de escuta para saberem o que estava a acontecer fora dos sítios onde se encontravam”. (…)
É fácil reconhecer, nestes casos, que algumas das transmissões efectuadas podem ter criado situações de risco. O autor cita o parecer mais tarde elaborado pelo Conselho Superior do Audiovisual, segundo o qual “os meios audiovisuais franceses que transmitiram em tempo real os atentados jihadistas feriram o respeito pela dignidade humana e puseram em risco a segurança de cidadãos concretos”.
São mencionadas, concretamente, a difusão das imagens do assassínio do agente policial no solo, pelos agressores que saíam do semanário, a informação do tiroteio na imprensa onde se tinham refugiado os irmãos Kouachi, enquanto o seu cúmplice Coulibaly ainda estava no supermercado, com reféns, a divulgação de que havia pessoas escondidas em ambos os lugares, quando os terroristas ainda não tinham sido abatidos, e a identificação dos irmãos Kouachi antes de ser confirmada pela polícia.
Os familiares do agente morto, o funcionário da tipografia e vários dos reféns no supermercado intentaram processos contra os meios de comunicação que divulgaram estas informações em tempo real.
Teodoro Ballesteros desenvolve, depois, os vários argumentos jurídicos e éticos possíveis em situações com este grau de complexidade, citando, a propósito, os Códigos Deontológicos de Jornalismo do Conselho da Europa e da Federação de Associações de Jornalistas de Espanha.
Sublinha a importância, em situações de possível colisão de direitos fundamentais, da doutrina da necessária ponderação dos interesses e direitos em conflito.
A concluir, e tendo admitido que os emissores poderiam ter reflectido sobre a conveniência de transmitir determinadas imagens ou informações, afirma:
“Os meios de comunicação poderiam ter actuado de outro modo, mas foi assim que fizeram e não devem, por isso, ser tratados como irresponsáveis nem negligentes, ou como mórbidos ou delatores, como fez alguma Imprensa. São os riscos colaterais da informação em directo.”
O artigo original, na íntegra, em Cuadernos de Periodistas