O que ambos os autores, Heidi Tworek e John Maxwell Hamilton, dizem desde logo no título do artigo que citamos, é que essa “idade de ouro” foi a excepção e não a regra: 

“Há dois problemas com a narrativa cor-de-rosa. Primeiro, ela descreve implicitamente o período de quatro décadas, de 1940 a 1980, como a apoteose de uma ‘idade de ouro’ para o jornalismo. Em segundo lugar, ela toma esse período como a linha de base do modo como o jornalismo sempre funcionou. Na verdade, este período foi uma anomalia numa história mais longa de quatro séculos de jornalismo.” (...) 

Como explicam a seguir, o jornalismo americano era dispendioso, mas os proprietários de jornais podiam pagá-lo:

“Na segunda metade do séc. XX, os seus cofres transbordavam. Durante esse tempo, como observa Robert Picard, a Imprensa tornou-se um dos negócios mais lucrativos no mundo desenvolvido.” (...) 

“O jornalismo tradicional nos EUA prosperou graças a um complexo sistema de subvenções interligadas. Os anunciantes subsidiavam os jornais americanos para atingirem o mercado de massas dos consumidores. Em meados do séc. XX, os anúncios traziam cerca de 80% das receitas dos jornais. Os leitores pagavam os restantes 20%, o que era sensivalmente o custo da entrega.” 

“Os leitores também se subsidiavam uns aos outros. O jornal dava qualquer coisa a toda a gente. O leitor que não se interessava pelo notíciário principal pagava o jornal para encontrar os resultados desportivos, os programas de televisão e anúncios de emprego. As notícias caras, como as do jornalismo de investigação, eram pagas por pessoas que frequentemente não as liam.” (...) 

Mesmo quando chegou a concorrência, “a rádio e a televisão  - que foram no seu tempo os ‘novos’ media -  davam inicialmente uma quantidade limitada de notícias, e nos grandes eventos coexistiam com os jornais, que acabaram por compreender que atraíam leitores incluindo a programação da rádio e televisão nas suas páginas.” 

“Mas a vaga seguinte dos novos media foi diferente. A concorrência subiu muito com a Internet, porque a barreira de entrada se tornou muito baixa. Além disto, a Internet desagregou as notícias. Os utentes que queriam resultados desportivos podiam tê-los online, de graça, todo o dia. Esses consumidores já não subsidiavam, na mesma medida, outros leitores com interesses diferentes. Todos sabemos o que aconteceu a seguir: quebra das receitas de publicidade, declínio acelerado na circulação dos jornais, despedimentos de jornalistas.” (...) 

“Todos estes desenvolvimentos são menos surpreendentes quando avaliamos a longa história do jornalismo. Os jornais esforçaram-se principalmente por ganhar dinheiro ou serem o distribuidor de notícias dominante. Para conseguirem cativar audiência, o seu conteúdo tornou-se sensacionalista, opinativo, irresponsável e mesquinho.” 

Os autores do artigo que citamos, no NiemanLab, vão à História desde o séc. XVI, quando terão começado, até ao final do séc. XIX, quando se tornam de facto o meio principal para ter notícias. Citam, de passagem, a “árvore de Cracóvia”, em Paris de antes da Revolução, a cuja sombra as pessoas se sentavam bisbilhotando sobre as élites do país. 

“As plataformas das redes sociais, como o Twitter, são as novas ‘árvores de Cracóvia’: são o lugar perfeito para espanhar boatos, anedotas e bisbilhotice. (...) O blog, outra modernizada ‘árvore de Cracóvia’, e o ‘cidadão-jornalista’ amador, coexistem lado a lado com o repórter com formação académica numa grande redacção.” (...) 

“Os anos de 1940 a 1980 foram uma ‘idade de ouro’ para os proprietários de jornais fazerem dinheiro e para os jornalistas fazerem notícias. Mas só foram uma ‘idade de ouro’ para um determinado grupo de pessoas. Muitos cidadãos  - as mulheres e os afro-americanos, só para dar dois exemplos -  não se reconheciam muitas vezes na reportagem e tinham poucas oportunidades de a influenciar.” (...) 

“É imperativo preservar um jornalismo fiável, de alta qualidade, neste tempo em que qualquer facto inconveniente é classificado de fake news. Hoje é o próprio conceito de verdade que está a ser atacado, e as instituições da Imprensa postas em perigo pelas instituições políticas. Vai ser necessário um novo conjunto de contribuições [subsidies, no original] para garantir que uma reportagem responsável continua.” (...)

 

O texto original, na íntegra, no NiemanLab 
Ler também, na nossa coluna de Opinião, ao lado, o artigo de J. Botelho Tomé sobre este mesmo assunto