Revelar os factos como forma de evitar a repetição de tragédias
O autor admite que “o Jornalismo, por natureza, não é propositivo”:
“O foco são os meandros do poder: a sujeira, a corrupção, a notícia que choca e indigna. A notícia boa, da alegria à superação, ganha espaço nas últimas páginas dos jornais ou nos últimos blocos dos telejornais. Os media costumam massacrar o espectador. No final, amaciam a carne para tentar vender a ideia de que um broto pode nascer no meio de um incêndio.”
“Mas o Jornalismo real, aquele que perscruta a natureza humana, não deve ser propositivo mesmo. É responsabilidade da reportagem destrinchar as estruturas criminosas de poder, apurar e pressionar as responsabilidades das pessoas que negligenciaram a segurança de sua empresa. É inaceitável que, depois de um precedente perigoso como Mariana em 2015, algo do tipo aconteça de novo.” (...)
E aqui Gabriel Guidotti propõe outro raciocínio: o de que o Jornalismo [que chama deste modo, com J maiúsculo] seja então propositivo, mas tanto pelo lado negativo (“na medida em que repórteres procuram respostas às perguntas que surgem após os factos… normalmente mudanças acontecem”), como pelo lado positivo (“há belos exemplos de pessoas que arriscaram as suas vidas em busca de sobreviventes entre a lama de Brumadinho”).
A partir disto, receia que mesmo a punição da negligência se desgaste com o tempo:
“O Jornalismo baterá nessa tecla durante meses, até que o noticiário esfrie em função da morosidade do Judiciário. Por parte da Imprensa, serão requentadas informações sobre o andamento dos processos, até que aconteça outra grande a tragédia para oxigenar novamente as capas dos [meios de comunicação].” (...)
“O Jornalismo é uma ferramenta, sim, que busca a justiça social. Pode estar enfraquecido, mas jamais desaparecerá enquanto existirem pessoas dispostas à revelação dos factos. Dinheiro indemnizatório se produz aos montes. Revelar os factos, todavia, é a melhor forma de homenagear os mortos de uma evitável tragédia.”
O texto aqui citado, na íntegra no Observatório da Imprensa