Quando os leitores aceitam ser parte do seu jornal

Segundo a autora, também no Brasil “organizações jornalísticas estão encontrando no modelo de assinaturas uma forma segura e profícua de sustentabilidade financeira”, dando o nome de membership à estratégia “que inclui não somente as assinaturas, mas também participação em eventos e em etapas da produção jornalística, newsletters exclusivas, produtos impressos” e outros.
E cita Katharine Viner, directora de The Guardian, que agradeceu por escrito, em editorial, a meta alcançada, dizendo aos leitores:
“Quando pedimos o seu apoio, não sabíamos se funcionaria. Tanto amigos quanto concorrentes ficaram profundamente cépticos por muito tempo, mas vocês, nossos leitores, ouviram e responderam. Foi inspirador como muitos de vocês, de mais de 180 países, quiseram desempenhar um papel no apoio financeiro ao The Guardian”. (...)
O holandês De Correspondent está a preparar um “irmão gémeo” nos EUA, intitulado The Correspondent, com uma campanha de financiamento sob o slogan Unbreaking News. O editor Rob Wijnberg explica que “não somos breaking news (notícias de última hora) e não queremos ser breaking news, porque isso significa tornarmo-nos cínicos, divididos e menos informados sobre o mundo; vamos tentar algo diferente”. (...)
“Aqui no Brasil, a Folha de S.Paulo, o primeiro meio brasileiro a adotar o paywall, já tem mais assinantes digitais do que do jornal impresso (no total, algo em torno de 300.000). Os números não foram divulgados, mas no fim de Outubro houve uma campanha virtual defendendo a assinatura do jornal, após os ataques de Bolsonaro à Folha. Outros meios brasileiros que se destacam no quesito assinaturas são o JOTA e o Nexo.” (...)
“Diante de tudo isso, parece claro que a indústria jornalística está mesmo apostando no apoio dos leitores. Mas para quantos meios eles são capazes de contribuir financeiramente? Um tudo bem, mas dois, três? A pergunta incómoda foi feita por Joshua Benton, em artigo para o Nieman Lab” - onde reconhece a distância que separa os grandes jornais de expansão nacional nos EUA e no estrangeiro dos que ficam no segundo nível:
Desses, “apenas dois jornais não nacionais — o Los Angeles Times e o Boston Globe — têm mais de 100.000 assinantes digitais. A teoria da agregação sustenta que, num mercado sem atrito, a Internet tende a agregar poder nas mãos de poucos e grandes participantes. Isso beneficiou o Google e o Facebook – e, em outra escala, o Times e o Post. E quanto a todos os outros?”
Lívia de Souza Vieira reconhece que é esta a questão pertinente, acrescentando-lhe outra, sobre “o quanto a impossibilidade de assinar dois ou três jornais/revistas interfere na nossa dieta informativa e na necessária pluralidade”...
E conclui:
“Se os leitores parecem dispostos a pagar por informação de qualidade e a se engajar com veículos em que confiam, é necessário que o jornalismo profissional reflita sobre seu papel para além de uma empresa. Como fazer com que notícias confiáveis cheguem a um número cada vez maior de pessoas? Ou então continuaremos falando para um público elitizado, economicamente seleccionado, e negligenciaremos aspectos éticos e sociais que são basilares para o serviço que prestamos aos cidadãos.”
O artigo citado, na íntegra, no Observatório da Imprensa. Mais informação sobre a origem do conceito de "membrasia", no nosso site.