Para Dominique Wolton, “não é a tecnologia que faz a informação”
Dominique Wolton, fundador do Instituto de Ciências da Comunicação do CNRS (Centre National de la Recherche Scientifique), em França, é autor de dezenas de obras sobre os media, o espaço público, a globalização e as relações entre ciência, técnica e sociedade. Numa entrevista ao Público, que aqui citamos, reflecte de modo crítico sobre os equívocos criados pelo excesso e velocidade de expressão na Internet, apontando as diferenças que os separam da verdadeira informação e as exigências que esta situação coloca a um jornalismo responsável.
Segue-se uma recolha de citações breves, arrumadas por temas, e que não dispensa a leitura da entrevista nem a escuta das conferências do referido autor.
Sobre o que a Internet trouxe ao jornalismo:
“A Internet é óptima para nos exprimirmos, mas expressão não é informação, é algo muito mais fácil. Separar os dois é função do jornalista. Ele deve olhar para a Internet como um novo meio de expressão e ter consciência de que, enquanto canal de informação, exige um trabalho de verificação.” (…)
Sobre a relação entre a nova tecnologia e a informação:
“Quando nas redacções não se trata este ou aquele assunto porque não interessa às pessoas, está-se a trocar a responsabilidade da oferta, que é a grandeza do jornalismo, pela tirania da procura. Mas o mais grave é não existir um discurso crítico sobre isto. (…) Uma coisa que me deixa tristíssimo é ver os jornalistas a passarem horas na Internet, a darem a volta ao computador em vez de darem a volta ao mundo, quando fariam muito melhor em sair e investigar. (…) A informação está a ser comida por uma ideologia técnica, e é preciso resgatá-la.”
Sobre o futuro do jornalismo:
“Acho que o jornalismo tomará consciência de que a abundância de informação não é por si só um progresso, e que o terreno que essa informação cobre é hoje mais estreito do que nos anos 80. (…) Há uma fascinação pelas tecnologias de informação que é preciso travar: não é a tecnologia que faz a informação, são os homens. Eu acho que o jornalismo acabará por reagir e saberá tirar desta revolução técnica o que ela tem de bom.”
Sobre o que é do domínio público e da esfera privada:
“Lutámos durante séculos até termos, enfim, o direito a uma existência privada, e agora, com as tecnologias de informação e com o fenómeno da "peopleização", passamos a vida a publicitar a vida privada. É um contra-senso. (…) Não é por hoje ser possível contar seja o que for nas redes sociais, e haver quem o leia, que devemos fazê-lo. Diante do computador temos uma sensação de liberdade, mas dever-nos-ia preocupar a contradição entre esse sentimento de liberdade e o facto de a Internet ser dominada pelo poder económico, financeiro e técnico do Google, da Apple, do Facebook, da Amazon.”
Sobre as redes sociais:
“Nas redes sociais toda a gente se exprime em condições de igualdade, o que é aparentemente democrático, mas, na verdade, ao abolir-se toda a hierarquia cultural ou intelectual, o que existe é uma tirania da expressão. (…) É preciso que jornalistas, professores, empresários, políticos, tenham a coragem de dizer que este espaço de expressão é um progresso, mas que não substitui as competências do político, do militar, do cientista, do jornalista.” (…)
“Seria de esperar que todas essas redes de informação tivessem aumentado a tolerância, mas não é verdade: o racismo e o ódio ao outro estão de boa saúde. Basta olhar para a Europa e para o que se passa com os refugiados no Mediterrâneo. Temos uma aldeia global, mas que é apenas técnica, e essa tecnologia, ao tornar mais visíveis as diferenças culturais, não só não está a promover a tolerância, como se arrisca a provocar mais intolerância. É um paradoxo incrível, mas verdadeiro.”
A entrevista de Dominique Wolton ao Público, na íntegra