Os riscos das entrevistas em directo na rádio e televisão

Na Fox News, Chris Wallace questionou Stephen Miller, o conselheiro da Casa Branca, em relação à decisão de Trump utilizar advogados particulares, ao invés de agências do governo, para obter informações do governo ucraniano. Miller mudou de assunto e evitou responder à pergunta, ignorando a insistência de Wallace.
Por sua vez, na CNN a situação repetiu-se. Jake Tepper entrevistou o congressista Jim Jordan no seu programa State of the Union. À medida que a entrevista se aproximava do fim, o congressista começou a ignorar as perguntas de Tapper e a escolher os tópicos de conversa. O jornalista mostrou-se bastante frustrado e salientou o facto de o seu convidado ter evitado várias perguntas.
As entrevistas não passaram despercebidas. O comportamento do entrevistador e entrevistados foram criticados pelas audiências, através de clipes nas redes sociais, mas pouco se falou sobre os problemas do formato do programa em si.
As entrevistas ao vivo na televisão, e os seus parâmetros restritos, acabam por falhar no seu dever de informar. Segundo Michael J. Socolow “talvez esteja na hora de reconsiderar o valor jornalístico das entrevistas ao vivo”.
A verdade é que as entrevistas nem sempre foram ao vivo. Quando surgiu a radiodifusão, na década de 1920, as entrevistas sem guião eram raras e as redes e as estações de rádio monotorizavam cuidadosamente as emissões, de forma a evitar que algo desagradável ou controverso causasse algum problema. Nesta altura, até os “vox pop” eram muitas vezes premeditados.
Durante a Segunda Guerra, as entrevistas eram monotorizadas pelo Departamento da Censura e pelo Departamento de Informação de Guerra, de forma a evitar que segredos militares fossem divulgados.
Depois da Guerra, os jornalistas de rádio tentaram começar a colocar questões mais críticas aos entrevistados, mas o anticomunismo que assolava a política norte-americana fez com que as emissoras desconfiassem das respostas, por não estarem previstas no guião. Desta forma, os convidados mais controversos foram evitados e os programas de entrevista tornaram-se mais amigáveis e promocionais.
Mesmo os programas mais célebres do Jornalista Edward R. Murrow, como o See it Now e Person to Person, evitavam controvérsias e quando as emissões tinham situações mais complexas, eram mostrados em clipes selectivamente editados.
Foi em 1956, com Night Beat, um programa local de Nova Iorque, que Mike Wallace – pai de Chris Wallace, jornalista da Fox News – , transformou a entrevista num formato de emissão. Wallace tinha uma abordagem sarcástica, questionadora e crítica. O seu estilo não se adequava ao optimismo vivido na época e o programa acabou.
Contudo, com a falta de credibilidade – causada, em parte, pela desinformação em relação à guerra do Vietname e o crescente cepticismo das audiências numa altura de tumultos –, exigia-se que os noticiários de televisão tivessem entrevistas mais críticas.
Foi assim que, em 1968, surgiu o “60 minutos”, que mudou para sempre a televisão norte-americana. O programa teve poucas audiências, inicialmente, mas Wallace tornou-se o inquiridor da televisão americana, expunha as fraquezas de todos, desde os vigaristas ao Presidente.
O programa inspirou vários do género e tornou-se um dos mais lucrativos programas de televisão, tudo graças às entrevistas. Com o desenvolvimento da tecnologia satélite, o formato das entrevistas em directo acabou por tornar-se comum.
No caso do programa “60 minutos”, raramente eram emitidas entrevistas em directo, pois os produtores tinham noção de que facilitaria a manipulação, pois se um convidado tentasse manipular a informação prestada à audiência, o entrevistador pouco poderia fazer. Contra-argumentar ou discutir poderia gerar simpatia pelo entrevistado e cortar a palavra ou o microfone seria considerado censura, pelo que os programas podem apenas considerar não convidar entrevistados que tentam enganar o público.
Os cidadãos precisam de informações confiáveis e verificadas para poderem exercer as suas responsabilidades democráticas. O jornalista não tem obrigação de disseminar opiniões ou ideias que induzam em erro ou que confundam os telespectadores, a obrigação do jornalismo é, precisamente, o contrário.
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