Os limites para a “verificação de factos” explicados em livro

O livro faz uma apresentação dos temas caros à crítica dos media, entre eles as pretensões à “objectividade” e à “liberdade” da informação, a apropriação dos media por industriais ou milionários, ou ainda as condições de trabalho dos jornalistas.
São também evocadas as questões da actualidade: o papel desempenhado pelos algoritmos, as armadilhas da informação gratuita ou a questão das “notícias falsas”.
Segundo a autora, que aqui citamos do Acrimed, “o fact-checking moderno levanta numerosas questões e encontra este paradoxo”:
“Estes meios que põem na montra o fact-checking estão, com efeito expostos à publicação de informações não verificadas e, portanto, eventualmente falsas. Os erros cometidos pelos media têm várias causas: a corrida pela audiência (os jornais querem ser os primeiros a publicar a informação, mas a urgência nem sempre é compatível com o rigor e a verificação), a concorrência mimética (se o vizinho tratou uma informação, temos de fazer o mesmo), a redução dos meios humanos, a predominância das fontes oficiais (os comunicados oficiais, da Prefeitura ou do Governo, são frequentemente retomados como sendo fiáveis).” (...)
Em 2018, por exemplo, também Le Monde foi enganado por uma comunicação falsa do governo ucraniano, que anunciava a morte do jornalista russo Arkadi Babchenko - o que se verificou depois ter sido uma encenação intencional.
“Le Monde não quis manipular, o seu erro foi sincero. Simplesmente, os jornalistas deviam ter exigido mais provas, e não se basearem unicamente na palavra de um governo para publicarem o texto.” (...)
“São estes os limites do fact-checking contemporâneo. Se os grandes media fazem verificação, é sobretudo às afirmações dos outros, não às suas próprias colunas. E nesta ‘guerra’ conduzida em nome da verdade, contra as mentiras políticas, é certamente Le Monde o que foi mais longe, lançando em Janeiro de 2017 o Décodex.”
Sophie Eustache cita os critérios anunciados pelo jornal na altura do lançamento do Décodex, como o interesse para o público, a “factualidade” e a “veracidade” da informação prestada, e reflecte sobre o que pode haver de discutível nestes termos.
Recorde-se aqui que o livro é redigido com o propósito de prestar um serviço de literacia mediática a um público jovem: como se define o “interesse para o público”, e de que público estamos a falar? O que é um facto, e como se separa da análise, ou da opinião?
“Até que ponto podem os jornalistas assegurar-se da ‘veracidade de um facto’ e da sua ‘verdade’, quando há milhares de anos os filósofos esgravatam a cabeça para definir a ‘verdade’?” (...)
“Se estabelecer os ‘factos’ é relativamente simples quando se trata de ciência (a gravidade é um facto científico, por exemplo), o caso ganha outra dimensão quando se trata de falar de economia, ou de um projecto político.”
Na recolha de partes do livro, aqui citadas de Le Monde, a autora conclui:
“O fact-checking pode ser prático, mas tem os seus limites. E, principalmente, isso não muda nada às pressões estruturais que, de tempos a tempos, conduzem à difusão de falsas informações, ou de erros pelos próprios media.”
“Os fact-checkers podem ser comparados aos marinheiros dentro de um barco que está a meter água e que, em vez de taparem as fugas, se empenham a esvaziá-la com baldes. Resumindo, um esforço vão.” (...)
O artigo aqui citado, na íntegra em Acrimed – Observatoire des Médias