O autor começa por citar um texto famoso de George Orwell, publicado em 1937, sobre a relação de desconfiança entre o chamado snob da classe média e a classe operária, que este considera “absurdamente mimada e desmoralizada pelos auxílios do governo”, mostrando então uma “estranha ansiedade, esse temor que a classe operária se torne muito próspera”.

Alexandre Marini é de opinião que, numa “análise superficial”, esta explicação pareceu plausível: “Nada mais que senso-comum (aquela substância que tantas vezes nos leva ao engano), mas muitos acreditaram nisso e parcela significativa nem sequer foi à votação, talvez certos que o perfil de quem optaria pela saída da união europeia seria a minoria abastada descrita por George Orwell.”

Mas, citando o cruzamento de dados publicado pelo The Guardian, estudo para cujo link remete os leitores, Alexandre Marini conclui que não foi, de facto, "ao que parece, a classe média preconceituosa a responsável pelo Brexit".

“Com base em dados de algumas pesquisas de opinião anteriores ao referendo pela saída do Reino Unido da União Europeia, muitos afirmaram que essa possibilidade (a saída) não era real. Hoje real, o arrependimento de grande parte da população inglesa e os inúmeros artigos publicados nos jornais tentando entender o que aconteceu para que esse resultado ocorresse, merecem mais um apontamento: as tais pesquisas de opinião.”

A segunda parte da sua reflexão vai então por este caminho: entender o que se terá passado “entre os resultados das pesquisas de intenção e o resultado após a apuração final dos votos”.

O autor conclui:

“Em um contexto tão amplo como a administração de um país, com todas as suas complexidades e nuances, avaliar que existe uma opinião pública a respeito, e querer dar isso como certo, é também querer crer no inacreditável.”

“Por isso, caro leitor, é importante considerar que ‘tendencialmente’ as pesquisas de opinião servem para legitimar o que se busca ser legitimado. É sempre bom desconfiar das certezas dadas a partir não só das inúmeras pesquisas de opinião publicadas nos jornais e publicizadas por diversos media por aí, mas também do nosso próprio senso-comum. Tarefa ingrata, mas necessária.”

 

O texto na íntegra, no Observatório da Imprensa