Eleição de Donald Trump força Media e jornalistas americanos a fazerem autocrítica
Começando pelo fim, o artigo do Le Monde remete os leitores para um outro texto, publicado em 25 de Outubro no site Politico, onde se conta que apenas seis jornais, nos EUA, tinham declarado o seu apoio oficial ao candidato Donald Trump, enquanto mais de 200, entre diários e semanários, o tinham feito em relação a Hillary Clinton. O que é que correu mal?
O artigo que citamos abre com o ambiente nos estúdios da CNN, na noite dos resultados, quando comentadores e peritos em sondagens começam a ficar descoroçoados. Mas a falha não era só dos inquéritos de opinião. Margaret Sullivan, editorialista de media no Washington Post, escreveu uma coisa mais perturbante:
"Para falar com franqueza, os media falharam o assunto. Finalmente, um grande número de eleitores queria qualquer coisa de novo. E por muito que tenham gritado, vociferado, a maior parte dos jornalistas não os escutaram. Não entenderam."
Margaret Sullivan diz que os jornalistas projectaram sobre a opinião pública a sua própria repugnância em ver um candidato como Trump chegar à Casa Branca: "Nós queríamos acreditar que alguém tão vulgar, maldoso e destemperado nunca conseguiria ser eleito, porque a América é melhor do que isso."
Paul Krugman, editorialista no New York Times, afirmou:
"As pessoas como eu, e sem dúvida a maior parte dos leitores do New York Times, não compreenderam realmente o país em que vivemos. Nós achávamos que uma grande maioria dos americanos continuava apegada às normas democráticas e ao Estado de Direito. (…) Mas verifica-se que um grande número de pessoas - de brancos, vivendo sobretudo nas zonas rurais - não partilham de todo a nossa visão da América."
O artigo do Le Monde conclui que os media americanos se esgotaram a fazer a avaliação fact-checking das afirmações do milionário, sem conseguirem desqualificá-lo aos olhos da opinião pública. Acabaram por estabelecer com ele uma relação ambígua e uma "dependência mútua".
Por seu lado, o director da Columbia Journalism Review, Karl Pope, diz nada menos que este momento é, para os media nos EUA, "o nosso anti-Watergate":
"A falha fundamental do jornalismo, nestas eleições, o seu pecado original, é muito mais básica para o que somos e o que é suposto que sejamos. Em termos simples, assenta numa falha em fazer reportagem."
"Enquanto muito do nosso país - aparentemente, uma maioria do país - estava turva de raiva, ressentimento e racismo, muito poucos repórteres tomaram tempo para procurar as pessoas fora das grandes cidades costeiras e escutá-las. Nestas eleições, como em todas, os votantes é que eram, em última instância, a história que tinha importância, muito mais do que os operacionais de campanha, ou os interlocutores dos think-tanks, ou os painéis de repórteres mais comentadores, com multidões de seguidores no Twitter."
E termina chamando a atenção para o facto de que Donald Trump já disse claramente que não é amigo da Imprensa:
“Ele já ameaçou processar as empresas dos media de que não gosta, e opõe-se a algumas das protecções, em termos das leis sobre difamação, que são fundamentais para a capacidade da Imprensa cumprir adequadamente as suas funções.” (...)